SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Após meses de expectativa, a confirmação de que a Rússia fará uma mobilização para a Guerra da Ucrânia, ainda que parcial, gerou renovados e esparsos protestos em duas dezenas de cidades de maior porte no país.

Com os atos, veio a inevitável repressão que marca a intolerância do Kremlin com o dissenso nos últimos anos, que ganhou força de lei com a invasão russa do país vizinho, em fevereiro. De lá para cá, uma nova lei coibindo críticas aos militares e mesmo proibindo o uso da palavra guerra, sob pena de até 15 anos de cadeia, calou na prática o que restava de oposição.

Segundo o OVD-Info, uma ONG de monitoramento de abuso policial, até as 20h20 (14h20 em Brasília) havia 630 detidos em 32 cidades do país. A Rússia tem 146 milhões de habitantes.

Isso se explica primariamente pela repressão, que só fez crescer desde que os últimos turistas deixaram o país da Copa do Mundo de 2018. A oposição, de resto fragmentária, deixou de existir na prática: apenas os partidos opositores aprovados pelo Kremlin seguem com representação ativa.

Aqui e ali, se veem protestos de membros da elite econômica e política, mas o temor de prisão fala mais alto. Houve protestos maiores no começo da guerra, que minguaram aos poucos: ao todo, desde fevereiro, o OVD-Info contou 16.437 pessoas detidas em todo o país.

Nesta quarta, houve atos pequenos em locais como Irkutsk e Khabarovsk, na Sibéria, e também em Moscou e São Petersburgo. "Muita gente está com medo de virar óleo de engrenagem", disse Serguei S., um analista financeiro de 49 anos que mora no centro da capital, por mensagem de texto.

Ele serviu como conscrito no Exército, em tese ficando fora dessa primeira chamada de Vladimir Putin. "Não sei o que vai acontecer", afirmou ele, que tem mulher e duas filhas. Os 300 mil reservistas na mira do Kremlin têm de ter experiência militar pregressa, segundo o Ministério da Defesa, mas o decreto presidencial é totalmente vago acerca de regras.

"Não está certo o que pode acontecer", disse ao jornal The Moscow Times o advogado Serguei Krivenko, da ONG de direitos legais Cidadão. Não que o analista financeiro planejasse ir às ruas: ele diz desaprovar a guerra por princípio, mas não a ponto de criticar as ações do governo.

Ele não está sozinho. O Centro Levada, último instituto independente de pesquisa de opinião pública da Rússia, punido como "agente estrangeiro" pelo Kremlin, aferiu no começo do mês que 46% dos russos aprovam fortemente as ações das Forças Armadas, enquanto 30% dão bastante apoio. Apenas 17% as desaprovam.

A popularidade de Putin, apurada pelo insuspeito Levada, também segue acima de 80%, salto semelhante ao registrado quando o presidente anexou a Crimeia, em 2014. Até aqui, o presidente vinha evitando a mobilização justamente de olho na manutenção desses níveis.

É possível especular que os militares tentarão deixar a classe média urbana mais ou menos fora da convocação. O fato de que os novos territórios que Moscou quer anexar no fim de semana na Ucrânia automaticamente entregarão até 35 mil soldados para controle direto do Kremlin também pode ajudar a relativizar o efeito.

De todo modo, o Moscow Times registrou um aumento exponencial na procura por passagens internacionais para os poucos destinos ainda servidos a partir de Moscou: houve, disse o jornal, um aumento de oito vezes no preço do bilhete para Dubai, Istambul, Ierevan e Baku, por exemplo.


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