SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com quase metade dos russos expressando "horror e ansiedade" ante a mobilização de 300 mil reservistas para lutar na Ucrânia e a primeira queda de sua popularidade desde a invasão do vizinho em fevereiro, o presidente Vladimir Putin resolveu dar uma resposta simbólica às críticas que vem recebendo.
Elas vieram mesmo de aliados ferrenhos de seu governo. O líder anunciou nesta quarta (5) um novo decreto ampliando para uma série de categorias de estudantes a isenção de obrigatoriedade de responder ao criticado alistamento para a Guerra da Ucrânia.
O russo citou o texto durante um encontro com professores, que foi televisionado, nesta quarta (5). Estarão livres de lutar alunos de algumas universidades privadas e estudantes de pós-graduação de disciplinas técnicas específicas. Não se sabe o universo de pessoas afetado, mas é uma resposta às imagens de mães chorando a partida de filhos.
Quando decretou a mobilização parcial e a anexação de quatro regiões ucranianas, em 21 de setembro, Putin trouxe o impacto até então distante do conflito que iniciou em fevereiro para dentro dos lares russos de forma inédita.
O único instituto de pesquisas ainda independente na Rússia, o Centro Levada, publicou a primeira pesquisa sobre o impacto da medida na percepção local da guerra. Nada menos do que 47% disseram ter sentido "horror e ansiedade" com a medida, ante 23% que se disseram chocados e 13%, com raiva. Relataram orgulho patriótico 23%.
Disseram-se muito preocupados com a guerra 56% dos ouvidos, ante 37% em agosto. Houve uma inversão na curva daqueles que acham que a ação deve continuar e os que gostariam de ver uma negociação de paz.
Os primeiros eram 48% em agosto e agora são 44%, enquanto os segundos passaram de 44% para 48%. São números dentro da margem média de erro de dois pontos, mas podem indicar tendência. O apoio em si à guerra seguiu alto, mas com oscilação negativa: de 76% para 72%
Ainda pior para o Kremlin, a aprovação de Putin caiu de 83% para 77%. Antes da guerra, ela estava em 71%, saltou para os 83% e oscilou por lá desde então. Claro, seriam números invejados por qualquer governante ocidental, mas para o russo é questão de sobrevivência política. O arcabouço de poder montado por ele em duas décadas pressupõe que a elite o apoie e que ele se mantenha popular. O Levada ouviu 1.600 pessoas de 22 a 28 de setembro.
A mobilização foi caótica, mas parece estar se estabilizando: o Ministério da Defesa fala em mais de 200 mil alistados já enviados para treinar. Cada região russa aplicou regras próprias, e ao fim as linhas iniciais delineadas pelo Ministério da Defesa foram desrespeitadas.
Assim, diversos cidadãos que haviam sido recrutas no serviço militar acabaram arrolados mesmo tendo mais de 35 anos, a idade limite das regras da Defesa, por exemplo. Isso levou a críticas inauditas de gente como Margarita Simonian, a poderosa editora-chefe da rede de TV estatal RT, considerada uma das propagandistas mais importantes de Putin.
A condução da guerra, especialmente com o sucesso da contraofensiva de Kiev que retomou a região ocupada em Kharkiv (nordeste) e a pressão agora em Donetsk e Kherson, duas das áreas anexadas formalmente nesta quarta, levaram a aliados na linha dura do regime como o tchetcheno Ramzan Kadirov a criticar o comando militar.
Houve um êxodo de pessoas que moravam perto de fronteiras de países que não exigem o visto russo. Só na primeira semana da mobilização, o Cazaquistão contou 100 mil vizinhos entrando em seu território. Esse fluxo amainou lá e em países como a Geórgia, até porque Moscou começou a controlar mais a emissão de passaportes.
E há também histórias abundantes de autoridades locais forçando o alistamento em escolas e até prisões. O Kremlin reconheceu que havia problemas na execução da ordem, e fez um gesto de saída para a classe média ao isentar da convocação uma série de profissões urbanas vitais para a economia, como trabalhadores de TI e de bancos, além de classes com alguma influência, como jornalistas.
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