SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Rússia determinou nesta terça (1º) a evacuação de civis ucranianos de uma grande área no sul do país que invadiu há oito meses, citando o que chamou de risco de uso armas não convencionais na região por Kiev.

Após ter evacuado áreas na região de Kherson a oeste do rio Dnieper, onde fica a capital homônima da província anexada em 30 de setembro com outras três áreas da Ucrânia, os russos agora querem estabelecer uma zona tampão de 15 km na margem leste do corpo d'água.

"Devido à possibilidade do emprego de meios proibidos de guerra pelo regime ucraniano, assim como informações de que Kiev está preparando ataque maciço com míssil na hidroelétrica de Khakhova, há um risco imediato de inundação da região de Kherson", afirmou em vídeo Vladimir Saldo, o governador instalado pelo Kremlin.

É uma troca de acusações dentro da guerra informativa subjacente ao conflito. Kiev havia dito que os russos pretendiam explodir a barragem de Khakhova, a principal da região, e dizem que há alto risco de emprego de uma bomba nuclear tática, de baixa potência, contra suas tropas.

Já Moscou vai no sentido contrário, com a acusação desta terça sobre a represa e, desde a semana passada, de que a Ucrânia pretende usar uma bomba suja para forçar uma ação nuclear russa.

Este tipo de artefato rudimentar une explosivos convencionais e material radioativo, tão simples quanto elementos usados em aparelhos de raio-X, para gerar uma contaminação. Kiev, claro, nega o intento. Na semana passada, reafirmando que trabalha com a hipótese, Putin disse contudo que usar uma bomba atômica contra o vizinho "não faz sentido, politicamente ou militarmente".

A evacuação foi chamada pelo governo em Kiev de "crime de guerra", por equivaler em sua visão a deportação forçada de moradores. Segundo Saldo, as sete cidades mais populosas às margens do Dnieper serão afetadas pela medida.

A região de Kherson é objeto de uma contraofensiva ucraniana feita na esteira da retirada russa de Kharkiv, no nordeste, que caiu após um ataque surpresa de Kiev em setembro. Mas os reforços com a mobilização parcial decretada por Putin em 21 de setembro parecem ter estabilizado as linhas ao sul.

A convocação, altamente impopular, foi considerada terminada na sexta (28), com 300 mil reservistas chamados --80 mil dos quais já estão em combate, segundo o Ministério da Defesa. Mas o presidente não assinou um decreto formal sobre isso, sugerindo que novas medidas podem ser tomadas.

A criação de uma zona tampão insinua também a formação de uma fronteira aceitável para o Kremlin, em caso de alguma negociação de fato ser aberta para encerrar o conflito. O Dnieper, que corta a Ucrânia, é considerado por muitos observadores como um limite territorial para Putin.

Naturalmente, nada disso vale se ao fim houver alguma confrontação trágica, seja com enchentes ou armas radioativas ou atômicas.

Nesta terça, os ataques continuaram. Em Mikolaiv, ao norte de Kherson, quatro mísseis russos foram disparados nesta manhã (madrugada no Brasil), e um deles destruiu um prédio residencial. O objetivo, contudo, parecia ser uma estação de distribuição de energia, alvo constante nesta fase da guerra.

Na segunda (31), houve um grande ataque contra a infraestrutura energética, chamado de Putin de retaliação pelo uso de drones contra a base da Frota do Mar Negro em Sebastopol, na Crimeia anexada em 2014.

Além disso, Moscou suspendeu o programa bancado pela Turquia e pela ONU que permitia a exportação de grãos ucranianos por um corredor marítimo. Segundo disse Putin em uma fala televisionada, os ataques "não são tudo o que poderíamos ter feito".

Pelo menos 60% da estrutura energética ucraniana está avariada. Nesta terça, Kiev voltou a ter luz e água corrente, que depende de bombas elétricas, após passar boa parte da segunda no escuro. A pressão sobre alvos civis também antecipa um inverno de dificuldades para os ucranianos.


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