BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) - Proporcionalmente, o mundo terá cada vez menos pessoas brancas nas próximas décadas. Mais da metade do aumento da população global projetado pelas Nações Unidas até 2050 se concentra em oito países cuja maioria dos moradores não é branca. Analistas apontam que esse cenário obrigará países desenvolvidos a reformularem suas políticas e concepções raciais.
Os oito países da projeção são República Democrática do Congo, Egito, Etiópia, Índia, Nigéria, Paquistão, Filipinas e Tanzânia -cinco na África e três na Ásia, dois continentes já majoritariamente não brancos e que abrigam as maiores taxas de fecundidade do mundo.
Em sentido contrário, a Europa, maior reduto de brancos, tende a registrar número de filhos por mulher muito menor até o final do século. Se as projeções estiverem corretas, o vão populacional entre os três continentes crescerá ainda mais.
"A Europa dominou o mundo durante muito tempo em termos populacionais, mas isso já vem mudando e ela está perdendo importância. Serão novos tempos", diz Paula Miranda-Ribeiro, professora de demografia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
De acordo com ela, governos europeus precisarão aumentar o acolhimento de imigrantes vindos da África e da Ásia nos próximos anos, ainda que continuem enfrentando resistência de parte da população local.
Esse movimento, expresso politicamente por partidos de ultradireita, fica evidente quando europeus se mostram reticentes em abrir as portas para refugiados não brancos -ao contrário do que aconteceu com os ucranianos, de maioria branca, após a invasão da Rússia.
A busca de mão de obra africana e asiática para abastecer a economia, porém, é inescapável, dizem os especialistas ouvidos pela reportagem. E será justamente essa necessidade o principal impulso para eventual avanço em direção à equidade racial.
"O crescimento populacional nos EUA, na Europa e no Japão não vai acontecer porque as pessoas vão começar a ter mais bebês. Em algum momento, ele vai acontecer devido às pessoas que estão migrando para lá", diz Tukufu Zuberi, sociólogo e professor de relações raciais na Universidade da Pensilvânia. "Esses países precisam mudar a ideia de o que significa ser humano e ser cidadão."
A mudança na concepção, para Zuberi, chegará também às empresas multinacionais. "Os lugares que foram tremendamente prejudicados pela escravidão e pelo colonialismo serão a principal mão de obra do planeta".
Nesse ponto, o sociólogo defende que a ascensão econômica da China é crucial para o avanço da igualdade racial. Pequim, por exemplo, lançou nos últimos anos a Iniciativa Cinturão e Rota, programa de investimentos em infraestrutura para países em desenvolvimento, inclusive da África e da Ásia.
Seja como for, a inevitável queda na proporção de pessoas brancas no mundo já mune discursos extremistas na Europa e nos EUA -neste último, o número de não brancos deve passar o de brancos em 2045, segundo o censo local. Recentes ataques a comunidades negras nos EUA trouxeram de volta a "teoria da substituição", ideia racista de que brancos perderiam empregos e poder para não brancos e poderiam ser alvo de genocídio quando se tornarem minoria.
A teoria conspiratória -e, mais uma vez, racista- foi propagandeada por atiradores nos atentados de Buffalo, em maio; na Califórnia, em 2019, e na Nova Zelândia, no mesmo ano. Segundo a organização judaica internacional Liga Antidifamação, cerca de 60% dos homicídios extremistas cometidos nos EUA entre 2009 e 2019 foram perpetrados por pessoas que defendiam ideologias supremacistas brancas.
Para Zuberi, a única face verdadeira da teoria é a que aponta a diminuição na proporção de brancos no planeta. "Mas essas pessoas precisam abraçar esse fato e desistir das fantasias do nazismo e de manter a supremacia branca", diz. "O número de negros na China vai aumentar, no Japão também, assim como no Brasil e nos EUA. Esse é o futuro, e o racismo pode até retardá-lo, mas não vai conseguir pará-lo."
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