LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - A crescente comunidade imigrante em Portugal, que aumentou mais de 80% nos últimos seis anos, já tem reflexos no perfil dos nascimentos no país. Em 2021, cerca de 13,65% dos nascido vivos ?10.881 bebês??tinham mães estrangeiras.
A cifra do ano passado representa o maior peso na série histórica iniciada em 1995. Em 2015, ano em que o fluxo migratório interrompeu o período de queda provocada pela crise financeira, os bebês com mães imigrantes eram 8,4% do total.
Maior comunidade estrangeira no país europeu, as brasileiras também lideram entre as mães internacionais. No ano passado, quase 40% das crianças nascidas de mães não portuguesas eram filhas de mulheres do Brasil.
Os 4.310 bebês com mães brasileiras nascidos em Portugal em 2021 são mais do que o dobro dos 2.150 de 2017, de acordo com dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) fornecidos à Folha. Como as brasileiras que têm dupla cidadania de Portugal entram para as estatísticas como mães portuguesas, o número de bebês luso-brasileiros deve ser ainda maior.
Em Portugal há 5 anos após passar uma temporada na Irlanda, a empresária gaúcha Luciana Borba, 38, deu à luz em Lisboa em fevereiro de 2021, em pleno confinamento geral devido à crise Covid-19.
"Além de ser a minha primeira gestação e de todas as coisas relacionadas à imigração, também havia as muitas limitações da pandemia", conta Borba, que afirma que não pode contar com a presença do marido nas consultas por conta das restrições sanitárias.
A empresária relata que se dedicou a aprender sobre o funcionamento do sistema de saúde português. Segundo ela, o domínio sobre informações como regras e direitos permitiu diminuir o número de contratempos ao longo da gravidez e, principalmente, na hora do parto.
"Eu busquei muita informação e fiz um plano de parto para chegar mais confiante para lidar com algumas coisas negativas que eu sabia que poderiam acontecer. Acho que, por estar bem informada, tive alguns direitos mais assegurados", diz.
Embora Portugal assegure às gestantes estrangeiras residentes no país, incluindo aquelas em situação irregular, o direito a acompanhamento médico e ao parto na rede pública, associações de imigrantes e grupos de apoio nas redes sociais colecionam relatos de xenofobia em hospitais e centros de saúde.
Além disso, há também as próprias limitações do Serviço Nacional de Saúde, o SUS português, pressionado por falta de pessoal e aumento da demanda. Neste ano, a falta de pediatras e obstetras provocou fechamentos e redução de atendimentos de emergência obstétrica em diversas instituições.
"Eu tenho um médico de família na rede pública de quem gosto muito e que me deu muito suporte na gravidez, mas optei por ter um acompanhamento no sistema privado", conta a empresária carioca Herica Marmo. "Ouvi alguns relatos sobre indução de trabalho de parto que ultrapassaram limites e não resultaram em experiências positivas. E eu queria ter a segurança de que teria o procedimento que fosse o mais indicado para mim e para o meu bebê."
Na avaliação da empresária, que vive em Portugal desde 2016, a falta de rede de apoio para ajudar na criação do filho é o maior desafio da maternidade no exterior. "A vida de imigrante já é difícil, porque estamos longe das nossas referências e dos nossos afetos, mas quando nasce um bebê a necessidade de apoio se torna maior", afirma Marmo. "No puerpério, a gente sente falta da compreensão que talvez só quem te conhece uma vida toda pode dar. Fora a exaustão de ter de criar sozinha, ou, como no meu caso, apenas com o pai um bebê que exige muitos cuidados e atenção."
Ainda que as brasileiras liderem simultaneamente a lista de maior comunidade imigrante e de mães estrangeiras em Portugal, as demais posições do ranking de nacionalidades no país não correspondem à liderança de estrangeiros residentes.
Reino Unido e França, respectivamente em segundo e em oitavo lugar entre os imigrantes em Portugal, não aparecem nas primeiras posições da lista de nascimentos. Depois do Brasil estão Angola, Cabo Verde, Nepal, Índia, São Tomé, Guiné e Ucrânia.
A explicação está na idade dos estrangeiros. Enquanto há uma grande quantidade de aposentados franceses e britânicos em Portugal, atraídos sobretudo por benefícios fiscais, a maior parte dos migrantes de antigas colônias portuguesas e de países da África estão em idade ativa.
A diversidade cultural e de idiomas impõem desafios adicionais às equipes médicas. Em várias instituições, sobretudo nas regiões com maior presença de imigrantes, já há uma rede de tradutores, além de adaptações aos planos nutricionais das pacientes.
Enquanto todos os bebês nascidos no Brasil têm direito à nacionalidade brasileira, isso não acontece em Portugal. Filhos de estrangeiros têm direito à cidadania lusa, mas é preciso cumprir alguns critérios.
No começo de 2022, o país alterou a lei e ampliou o acesso dos bebês filhos de imigrantes à cidadania. Atualmente, crianças nascidas em Portugal são consideradas portuguesas caso um dos pais resida no país há pelo menos um ano. A medida é válida mesmo para pessoas que estejam com status migratório irregular no país.
Desde 2015, o direito à nacionalidade lusa para os filhos de estrangeiros vem sendo progressivamente ampliado. A última novidade legislativa criou a possibilidade que pais de crianças nascidas em Portugal e consideradas portuguesas possam também requerer a nacionalidade por meio dos filhos. A naturalização, nesses casos, pode ser solicitada depois de cinco anos de residência, regular ou não, em território luso.
Nos processos normais de naturalização por tempo de residência, apenas o período com autorização legal no país é contabilizado pelas autoridades.
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