SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A China declarou nesta sexta-feira (17) o fim oficial do pico da Covid no país. O anúncio, divulgado pelo Comitê Permanente do Politburo após uma reunião a portas fechadas, é feito cerca de três meses após o súbito relaxamento da política de contenção do vírus no país que resultou em cenas de caos no seu sistema de saúde.

A conquista foi alçada à manchete do jornal Global Times, alinhado ao Partido Comunista Chinês: "China alcança enorme e decisiva vitória contra a epidemia de Covid", diz ela. Segundo o texto, a nação não só superou a doença, "um milagre na história da civilização humana" dado o seu contingente populacional, como manteve as menores taxas de mortes em decorrência do coronavírus do planeta.

Para especialistas, porém, o anúncio faz ressurgir muitas das perguntas sobre o real impacto do coronavírus no gigante asiático, até hoje sem resposta.

Uma dessas questões é o total de mortes causadas pela Covid no território desde o início da pandemia. O texto do Global Times não faz alusão ao número, optando em vez disso por registrar a quantidade de mortes entre 8 de dezembro e 9 de fevereiro, de 83 mil segundo o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

O número contrasta com a maioria das projeções, que estimavam entre 1 milhão e 1,5 milhão de óbitos em decorrência da doença após o pico de infecções.

Uma série de fatores pode explicar essa diferença. Um deles é que o número oficial de mortes só contabiliza aquelas ocorridas em hospitais. A título de comparação, entre 2018 e 2020, cerca de 80% de todas as mortes na China se deram em domicílios.

Além disso, logo após o fim da Covid zero, como a política de controle era chamada, o regime impôs uma metodologia que determinava que só mortes decorridas de pneumonia ou insuficiência respiratória seriam contabilizadas como relacionadas ao vírus. Isso excluiu óbitos vinculados à falência hepática, renal ou cardíaca, por exemplo.

Ainda há suspeitas sobre a confiabilidade dos dados sobre a doença que são de fato registrados pelo regime. A OMS (Organização Mundial da Saúde) alertou, no início deste ano, para uma subnotificação generalizada dos casos do vírus no país, fosse em termos de mortes ou de internações hospitalares e em UTIs -Pequim deixou de enviar relatórios à organização no início de dezembro.

Em âmbito doméstico, dois dos principais órgãos de saúde do país, o CDC e a Comissão Nacional de Saúde (NHC), haviam anunciado que deixariam de divulgar informes diários sobre casos e mortes pelo vírus, num apagão de dados que impossibilitava um acompanhamento mais detalhado da evolução a epidemia. À época, eles alegaram que o fim de medidas mais restritivas impossibilitavam o rastreamento da doença na prática.

Por fim, o panorama registrado pela mídia local e estrangeira ao fim das restrições foi de desordem absoluta, com hospitais lotados, funcionários trabalhando mesmo doentes, e uma alta não totalmente explicada na demanda de serviços funerários. O Global Times descreve um cenário bem diferente disso, e afirma que segundo os líderes do partido, a transição para a abertura foi acertada e "suave".

Especialistas em saúde pública citados pelo texto do jornal estatal afirmam que a declaração da cúpula do Partido Comunista marcaria o fim oficial da pandemia no país e a transformação da Covid em uma doença endêmica, isto, recorrente e com taxas gerais estáticas, que não aumentam nem diminuem.

Ainda assim, os membros do Comitê Permanente afirmam que agora é necessário implementar uma nova fase de controle da epidemia, reforçando sistemas de monitoramento e de alertas e preparando a população idosa para uma nova campanha de vacinação.

O anúncio do Politburo é feito semanas antes do encontro anual do Parlamento do partido, em um momento em que os dirigentes tentam reerguer uma economia arrasada por três anos da política de Covid zero. Nesta semana, uma reforma do sistema de saúde público que levaria a cortes nos repasses para gastos médicos de aposentados levou centenas deles às ruas em Wuhan, no centro, e Dalian, no sul.


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