SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Passado um ano do início da Guerra da Ucrânia, cresce o apoio entre os russos à invasão do país vizinho, aos termos da condução do conflito pelo Kremlin e ao presidente Vladimir Putin.

É o que mostra a nova pesquisa do Centro Levada, principal instituto independente de levantamento de opinião pública da Rússia, tachado pelo governo como um "agente estrangeiro", o que o torna mais do que insuspeito.

Segundo a nova rodada, que ouviu presencialmente 1.600 pessoas em todo o país de 21 a 28 de fevereiro, com margem de erro de dois pontos para mais ou menos, 77% dos russos aprovam as ações das Forças Armadas na Ucrânia -48% "definitivamente", 29% "provavelmente".

Em dezembro, eram 71%, o índice mais baixo de apoio desde que a guerra começou. Agora, 17% reprovam a guerra, 10% "provavelmente" e 7%, "definitivamente". A maior rejeição até aqui do conflito foi logo após seu início, quando 23% se diziam contrários à invasão.

O corte por estratos comprova algumas percepções de observadores da sociedade russa: a guerra tem maior apoio entre quem consome a TV estatal como principal fonte de informação (86%), os mais velhos (86% no grupo com mais de 55%), os que aprovam Putin (86%) e homens (83%). Na via inversa, o apoio cai entre quem desaprova o presidente (32%), os mais jovens (57% entre quem tem de 18 a 24 anos) e as mulheres (73%).

A pesquisa mostra também que o apoio à continuidade da guerra vem ganhando espaço. Em outubro do ano passado, 57% preferiam negociações de paz e 36%, o conflito. Agora, são 50% pró-paz e 43%, em favor do que o Kremlin chama de "operação militar especial".

Aqui, o fosso geracional que dividiu famílias se mostra acentuado também. Entre os mais velhos, 52% preferem a guerra, enquanto 61% dos mais novos querem o fim das hostilidades.

Como isso ocorreria, contudo, unifica o país sob o discurso do Kremlin até aqui. A maioria absoluta dos ouvidos não aceita condições favoráveis à Ucrânia para o fim da guerra, a começar pela retirada russa das quatro regiões que anexou ilegalmente em setembro.

Não aceitam a desocupação das duas autoproclamadas Repúblicas Populares do Donbass (leste ucraniano), Donetsk e Lugansk, 71%. Já 67% descartam a saída de Zaporíjia e Kherson, ao sul. Os russos não controlam integralmente essas áreas e, em Donetsk, focam combates intensos para tentar abocanhar os talvez 50% do território em mãos de Kiev.

Por fim, a entrada da Ucrânia na Otan (aliança militar do Ocidente), um dos motivos alegados por Putin para iniciar a guerra, é rejeitada por 76% como algo a ser trocado pela paz. Concordam que troca de prisioneiros é um item aceitável 85% e 51% citaram cessar-fogo como base para o fim do conflito.

O trabalho de Putin, que chegou ao poder como primeiro-ministro em agosto de 1999 e, com quatro mandatos como presidente e mais um interlúdio como premiê nunca mais saiu dele, tem alta aprovação: 83%, voltando ao nível atingido quando a guerra foi iniciada após escorregar para enormes 77% em setembro.

Na série histórica do Levada, iniciada em 2010, a menor aprovação do presidente foi de 59%, em setembro de 2020, no auge da pandemia de Covid-19, que teve uma resposta errática do Kremlin. Já seu zênite foi no ano seguinte à anexação da Crimeia, com 89% em junho de 2015.

Os números todos diferem um pouco, mas não muito daqueles divulgados por menos confiáveis institutos estatais. Esse fenômeno levou observadores externos a questionar a confiabilidade das pesquisas e a influência do ambiente carregado de repressão política, além da recusa dos entrevistados em falar a verdade.

Diretor de pesquisas do Levada, Denis Volkov rejeita esses argumentos. Segundo ele, a aprovação de Putin e de suas políticas segue uma dinâmica aferível ao longo dos anos, acompanhando a expectativa dos cidadãos com a economia, por exemplo. "Não há nada diferente agora", afirmou, citando que o choque inicial com a guerra e as sanções ocidentais subsequentes já parece ter sido absorvido.

"Em cada pesquisa, apenas de 2 a 7 entrevistados se negam a responder sobre a Ucrânia, o que é irrelevante", escreveu em um texto defendendo os levantamentos. Sobre a repressão, disse que ela já estava instalada no país antes da guerra.

Assim, dados como o consumo em massa da propaganda do Kremlin pela TV, um movimento que remonta aos anos 2000, a edulcoração do cotidiano nas grandes cidades, além de diferenças de opinião entre gerações, parece dizer mais sobre o impacto da guerra sobre os russos.

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