SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Aliadas na Guerra Fria 2.0 contra o bloco ocidental liderado por Washington, China e Rússia fizeram críticas nesta terça (14) ao pacto militar Aukus, que une EUA, Reino Unido e Austrália para conter a ascensão de Pequim no Indo-Pacífico.
"Esses três países, em nome de seus interesses geopolíticos, desconsideram completamente as preocupações da comunidade internacional e estão caminhando mais e mais rumo a uma via de erro e perigo", disse Wang Wenbin, porta-voz da chancelaria chinesa.
O pacto em si havia sido anunciado de surpresa ao mundo em setembro de 2021, estabelecendo uma nova dinâmica na disputa em torno daquilo que Pequim vê como seu quintal geopolítico ?mais de 80% de seu fluxo comercial passa por rotas marítimas de seus portos no sudeste do país para o Índico.
O Aukus (um acrônimo com as iniciais inglesas dos aliados) somou-se ao Quad, um grupo mais político liderado por EUA com a mesma Austrália, Índia e Japão como instrumento de pressão americana contra as pretensões chinesas de proteger tais rotas e ter maior profundidade estratégica contra bloqueios e ataques.
O ponto principal do acordo é transformar Camberra na sétima operadora mundial de submarinos com propulsão nuclear. Segundo o Ministério das Relações Exteriores do país, o projeto todo pode custar 0,15% do PIB do país por ano, chegando a US$ 245 bilhões (R$ 1,3 trilhão em conversão direta hoje).
Primeiramente, o país irá já a partir de 2027 acomodar submarinos nucleares americanos e britânicos em Perth, porto na costa ocidental, mirando diretamente o flanco sul chinês. Depois, a Austrália irá comprar de três a cinco modelos americanos de ataque da classe Virginia, que poderão ser de segunda mão ?de 2000 para cá, os EUA construíram 21 dos 66 barcos previstos.
Por fim, os três países trabalharão de forma conjunta para, até o fim da década de 2030, equipar Londres e Camberra com um novo modelo de submarino de ataque de última geração, com desenho britânico.
Tudo isso é um "plano militar e econômico de longo prazo", como disse o premiê australiano, Anthony Albanese, que assinou o pacto com o presidente americano Joe Biden e o colega britânico Rishi Sunak na segunda (13), em San Diego, sede da Frota do Pacífico dos EUA.
O país tenta reforçar o primeiro componente, dizendo que a Austrália receberá US$ 6 bilhões (R$ 31,5 bilhões) de investimentos diretos e poderá gerar 20 mil empregos em 30 anos com o acerto. Sunak foi na mesma linha, enquanto Biden realçou o aspecto geopolítico do Aukus ?a venda de tecnologia nuclear militar é a primeira em 65 anos a um aliado pelos EUA.
Nesta terça, a chanceler australiana, Penny Wong, acabou falando do último aspecto. Seu país, disse, buscou o acordo porque "quer garantir melhor um equilíbrio estratégico" no Indo-Pacífico.
Com efeito, a principal aliada da China, a Rússia em plena invasão da Ucrânia, denunciou o acordo, que já chamou de expansionista em outras ocasiões, mas em termos mais técnicos. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que o Aukus gera "questões acerca da não proliferação nuclear".
Este é um ponto sensível. Embora as três nações tenham estabelecido que o status de país livre da armas atômicas da Austrália será mantido, e nenhuma embarcação terá a bordo tais ogivas, há dúvidas acerca da rastreabilidade do combustível nuclear utilizado para alimentar os reatores dos submarinos.
Isso fez a China registrar um protesto na AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), enquanto o trio aliado entrou com um pedido de acompanhamento e análise de seus planos pela agência. Até aqui, o órgão ligado à ONU disse que o Aukus está sendo transparente.
Provavelmente o será, dado o status de seus integrantes, mas há o fato de que o acordo se ampara em uma brecha do Tratado de Não Proliferação Nuclear acerca de combustível para reatores navais para existir, e politicamente a China se apega a isso.
Haverá efeitos colaterais, como o caso brasileiro, que fez um pedido semelhante de criação de salvaguardas para o combustível que pretende empregar no reator de seu futuro submarino nuclear, projeto que se arrasta há mais de 40 anos.
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