Raquel Marcato Raquel Marcato 20/06/2015

Crônica: Quem precisa do limite?

É a última vez que vou falar, se fizer mais uma vez…”.

Esta frase repetimos pelo menos todos os dias e várias vezes! Dissemos que é a última vez, quando na verdade, estamos criando mais uma possibilidade para que volte a ocorrer… Isso é o cúmulo da insegurança, do dizer para si mesmo: Será que sou capaz? Então vem a ameaça com tom educativo.

Uma mãe que deixou claro estar falando pela última vez, precisa terminar a frase no ponto final. Ali finalizou a última pirraça. Não tem mais repetições e se houver toma-se uma atitude, pois você fixou o limite. Quando eu me dei conta que a minha exaustão vinha pelo exercício de colocar limites, muitos, sem êxitos, entendi que este era o ponto a ser trabalhado de outra forma. As duas, mãe e filha, precisavam de limites claros.

Primeiro, identifiquei quais eram os meus limites como Mãe. E um deles ganhou muita transparência; Não estou disponível tempo integral para minha filha, sendo mais verdadeira, Eu Não quero estar disponível em todos os momentos. Sim, é fundamental nos permitir a não querer. Percebi que estar todo o tempo com ela não me fazia sentir uma mãe melhor. Na teoria eu estava ali, mas na prática eu queria estar comigo, apenas.

Acolhi essa emoção.

Dei um passo na maternidade.

Evolui como mãe.

Dentro da evolução saudável, a criança chega a uma etapa na qual ela precisa começar a se conectar com ela mesma. A estar com ela, a brincar com ela. Mas, para que isso ocorra, nós, mães, precisamos exercer o limite para que esta possibilidade possa ser real. Foi a partir desta certeza que criamos o “Momento da mamãe”.

Este “momento” não tem hora certa, acontece quando percebo que quero brincar com ela junto com o WhatsApp, ou tomando notas para o blog, ou lendo um livro. Ato Falho. Eu não estarei com ela. Estarei dando migalhas da minha presença. Esse foi o segundo limite que me coloquei como mãe: Não darei migalhas para minha filha. Isso, nos duas não merecemos. Não quero enganar a ela e, principalmente, a mim mesma.

Dei mais um passo na maternidade.

Evolui como Mãe.

O terceiro limite que, consequentemente, veio, foi ressignificar o sentimento de culpa. O sobrenome de todas as mães.

Como posso me sentir culpada por não ter uma vontade?

Como posso me sentir culpada por ser verdadeira?

Isso é ser muito cruel comigo mesma. Sinceramente, eu não mereço.

Eu não mereço ser a mãe que os outros querem que eu seja. Eu não mereço ser comparada. Eu não mereço ter que suprir a carência de outras presenças. Eu não mereço ser entendida no mundo apenas como mãe. Eu não mereço me definir como mãe através da lente social.

Também sou mulher. E quero, muito, compartilhar tempo com este Ser mulher. Quero conhecer esta mulher, cada vez mais. Esse foi o quarto limite que me coloquei: acolher a ausência de mãe enquanto mulher.

Dei mais um passo na maternidade.

Evolui como Mãe.

Depois deste divã, estamos as duas mais calmas, mais inteiras quando estamos juntas e quando estamos separadas.

Evoluímos como mãe e filha.

Atualmente, entendo que os limites com minha filha não funcionavam porquê era EU quem estava carente deles. Ela? Só precisava saber que existia a possibilidade de estar com ela mesma.

Com afeto e gratidão,

Até a próxima.


Raquel Marcato, mãe da Marta de 4 anos, blogueira do portal mamaesavessas.com, escritora, questionadora por essência, ativista pelo autoconhecimento e mestre em Literatura Comparada pela Universidade Autônoma de Barcelona.

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