SÃO CARLOS, SP (FOLHAPRESS) - Alguns dos adoçantes mais usados no mundo, criados para substituir o açúcar e evitar os efeitos nocivos de seu consumo, na verdade podem acabar tendo efeitos semelhantes aos dele sobre o metabolismo, além de afetar os micro-organismos intestinais, indica um estudo feito por pesquisadores israelenses.
Ainda é cedo para dizer o que esses achados significam para a saúde de quem consome adoçantes há muito tempo ou em grandes quantidades. Mas eles equivalem a um sinal amarelo quanto ao uso dessas substâncias e indicam que não se deve esperar que eles sejam "neutros" para o organismo, conforme se achou durante muito tempo.
"Isso significa que esses compostos provavelmente não são inertes no corpo humano", disse à reportagem o coordenador do estudo, Eran Elinav, do Instituto Weizmann de Ciência.
"É importante destacar que nossas descobertas não sugerem, de modo algum, que o consumo de açúcar seja mais recomendado que o de adoçantes. Acreditamos que o açúcar deve ser evitado ou ter seu uso minimizado, especialmente em populações suscetíveis a doenças metabólicas, como a diabetes, ou que sofrem delas", afirma.
Na pesquisa, que acaba de sair na revista especializada Cell, a equipe israelense, junto com colegas da Alemanha, investigou a fundo os efeitos metabólicos de um quarteto dos chamados ANNs (adoçantes não nutritivos), assim designados porque sua absorção pelo organismo é muito baixa ou nula. O grupo de ANNs da pesquisa inclui sacarina, sucralose, aspartame e estévia.
Conforme explica Elinav, os sachês comerciais desses adoçantes normalmente recebem um pequeno acréscimo de glicose (um tipo de açúcar "real"), que serve para aumentar seu volume e amenizar o gosto característico deles. Para evitar que isso confundisse a análise, os pesquisadores também testaram o efeito dessa pequena quantidade de glicose nos participantes do estudo.
Aliás, selecionar essas pessoas foi um desafio por si só. Depois de recrutar mais de mil voluntários, a equipe fez uma triagem rigorosa para identificar apenas adultos saudáveis que não tinham consumido os adoçantes anteriormente. Chegaram, por fim, a um grupo de 120 pessoas, que passaram a receber os adoçantes de forma randomizada (ou seja, por um sorteio no qual os participantes eram designados a consumir determinado composto). Dentro desse total havia também dois grupos de controle, um recebendo apenas a pequena quantidade de glicose e outro sem nenhuma substância extra.
Os voluntários recebiam os sachês três vezes ao dia, num total bem inferior ao máximo diário recomendado. O consumo dos adoçantes aconteceu ao longo de duas semanas, durante o qual a equipe monitorou o metabolismo dos participantes e também a sua microbiota (conjunto dos micro-organismos) da boca e do intestino. A análise da microbiota é relevante porque o organismo humano é uma espécie de zoológico dessas criaturas, que afetam fatores como a digestão de alimentos e a imunidade, e já havia indícios de que os adoçantes são capazes de afetar esses micróbios.
O achado mais preocupante dessa análise inicial foi o de que a sacarina e a sucralose são capazes de afetar negativamente o metabolismo dos açúcares no sangue. Para que esse metabolismo aconteça, a pessoa não precisa ingerir açúcar diretamente: qualquer alimentação normal converte parte dos alimentos em glicose na digestão. Segundo o estudo, quem consumiu os adoçantes tinha mais dificuldade para absorver normalmente a glicose, que ficava mais presente do que o normal em sua corrente sanguínea.
Além disso, todos os adoçantes modificaram de forma significativa a microbiota dos voluntários. Numa fase seguinte do experimento, os pesquisadores transferiram essa microbiota alterada dos participantes humanos para camundongos criados em condições de higiene completamente estéreis --ou seja, os roedores não tinham micro-organismos próprios.
Acontece que, em vários desses casos, os animais desenvolveram os mesmos desvios no metabolismo de glicose que tinham aparecido nos voluntários. Ou seja, provavelmente é a interferência dos adoçantes na microbiota que está por trás das alterações metabólicas, conforme os cientistas israelenses suspeitavam.
Para os autores do estudo, os resultados mostram que é preciso cautela quanto ao consumo de adoçantes e, principalmente, que é preciso entender melhor os efeitos de longo prazo das substâncias sobre o organismo.
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