SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em vigor desde 2010, a Lei de Alienação Parental é considerada polêmica e rodeada de embates. Para especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo, a medida acirra conflitos, pune mães e expõe crianças a situações de violência.
Atualmente, a legislação caracteriza como alienação parental quando o pai ou a mãe toma atitudes para colocar o filho contra o outro genitor.
Entre os exemplos estão impedir o acesso e a convivência do filho, dificultar o acompanhamento das informações escolares e de saúde da criança e registrar uma falsa denúncia contra um dos responsáveis.
Por um lado, entidades, como o Ibdfam (Instituto Brasileiro de Direito de Família), concordam com a lei e afirmam que ela cumpre uma função pedagógica. Do outro, críticos alegam que ela se baseia em conceitos controversos e que estigmatiza mulheres.
Isso porque a regra costuma ser mais usada por homens que respondem a processos de violência sexual, violência doméstica e falta de pagamento de pensão.
Um relatório do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) já apontou esse uso da lei de alienação parental como estratégia de defesa.
Um seminário, que acontece nesta quinta (1º) e sexta-feira (2), vai discutir os impactos da lei no sistema de proteção à infância e juventude e será transmitida online. A roda de conversa é promovida pelo Neij (Núcleo de Estudos da Infância e Juventude) em parceria com o Departamento de Artes Visuais e o Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares da UnB (Universidade de Brasília).
Entre os convidados, estão as advogadas Rubia Abs da Cruz, coordenadora nacional do Cladem (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher), e Claudia Galiberne Ferreira, autora do artigo científico "Síndrome da Alienação Parental: uma Iníqua Falácia".
Claudia diz que a lei costuma ser banalizada, mas que é necessário cautela. Isso porque, durante um divórcio, é comum que aconteçam brigas e que os filhos acabem envolvidos e tomem partido.
"Isso é algo muito diferente do que tentam conceituar como alienação parental", diz ela que ressalta que a lei criou um mercado lucrativo para psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, uma vez que o processo exige um estudo psicológico das partes envolvidas.
Este, aliás, é um dos argumentos do CFP (Conselho Federal de Psicologia) que formulou uma nota técnica sobre a lei e afirma que alienação parental foi cunhada por Richard Gardner, um psiquiatra americano. O termo não está incluído no manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais da APA (Associação Americana de Psiquiatria) e nem no CID (Classificação Internacional de Doenças).
A nova nota do conselho, que deve ser publicada ainda nesta semana, conclui que a lei criou um ilícito civil com base em um psiquiatra envolvido em polêmicas e acusado, entre outras coisas, de sexismo. Além disso, pede pela revisão total do seu teor e enumera nove recomendações aos psicólogos em relação à lei.
Entre elas, o Conselho recomenda que os profissionais examinem de forma crítica as demandas de estudo e avaliação psicológica que envolvam alegação de alienação parental.
Em abril deste ano, o Senado aprovou mudanças em um projeto que modifica as regras de alienação parental. Um dos pontos mantidos pela nova lei estabelece que em casos nos quais o pai ou a mãe sejam investigados ou processados por violência doméstica, caberá ao juiz decidir se o suspeito de agressão poderá ter a guarda compartilhada ou não.
Para isso, ele deverá avaliar o que é melhor para a criança ou o adolescente. Uma possível condenação por violência doméstica, por exemplo, pode ser levada em conta pelo magistrado na hora de decidir, mas não há uma obrigação legal para que isso aconteça.
A advogada Rubia considera que a implementação da legislação causou uma tensão ainda mais constante entre os pais e acirrou conflitos entre as partes. "Parece que os processos não buscam a paz social e o fim do litígio", diz ela que avalia que lei visa punir comportamentos maternos muito mais do que efetivamente detectar quando existe manipulação entre um dos genitores.
Em maio, uma reportagem da Folha de S.Paulo mostrou que os processos que envolvem alienação parental dispararam na pandemia. Especialistas atribuíram o aumento ao isolamento social, que intensificou problemas de convivência e financeiros, além de casos de violência doméstica.
À frente da Cladem no Brasil, a advogada afirma ainda que a lei é usada como uma espécie de escudo para a Lei Maria da Penha. Segundo ela, é comum que uma mãe que relata que ter sofrido violência doméstica acabe sendo acusada de alienadora por inventar uma suposta falsa agressão para afastar a criança do pai.
Seminário Impactos da Lei da Alienação Parental Quando: Quinta (1º) e sexta-feira (2)
Horário: 14h às 19h30
Quanto: Gratuito. É necessário realizar inscrição por meio do site da Unb
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