SALVADOR, BA (UOL/FOLHAPRESS) - Um adolescente indígena pataxó, identificado como Gustavo Silva da Conceição, 14, foi assassinado neste domingo (4) com um tiro na cabeça após novo ataque de supostos pistoleiros ao grupo da Aldeia Alegria Nova que ocupa uma fazenda de eucalipto situada no Território Indígena Comexatiba, na cidade de Prado, no Sul da Bahia.
Em protesto, familiares e parentes da comunidade Pataxó bloqueiam a estrada em direção à cidade de Corumbau, a 750 km de Salvador.
Após ser atingido, Gustavo Silva da Conceição, Sarã Pataxó, foi levado desacordado a uma unidade de saúde no município de Itamaraju. Já em estado grave, foi transferido para o Hospital de Teixeira de Freitas e chegou a ser intubado, mas não resistiu. O Colégio Estadual Indígena Kijetxawê Zabelê, onde o garoto estudava, emitiu uma nota de pesar pelo seu falecimento.
De acordo com relato de lideranças da aldeia ao UOL, homens fortemente armados chegaram ao local em um carro modelo Fiat Uno, disparando contra jovens, crianças e mulheres. Eles estariam portando armas de grande porte como espingardas e fuzis. Além do indígena adolescente morto, outro teria ficado ferido. As lideranças não sabem dizer a idade e estado de saúde do segundo baleado.
As lideranças afirmam que o ataque seria feito inicialmente à comunidade indígena Córrego da Cassiana, mas os pistoleiros teriam encontrado dificuldades pelo maior número de indígenas, provocando a ida do grupo para o Território Indígena Comexatiba, que estaria "desprevenido". Os suspeitos de cometerem o ataque fugiram e ainda não foram identificados.
"Aconteceu novamente uma tentativa de massacre. Os caras foram atacar e no tiroteio mataram um um menino e balearam outro. Precisamos que acionem a polícia, pois tem vários homens armados na região", relatou um cacique que preferiu manter o anonimato em razão das ameaças sofridas e o medo de retaliação.
A Aldeia Alegria está no processo de retomada pacífica de áreas que fazem parte do território demarcado pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e que teve o RCID (Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação da Terra Indígena) publicado ainda em 2015.
Apesar da publicação do documento, durante este período de sete anos ainda não foi realizada a homologação e o registro não avançou devido à demora. Os não indígenas deveriam ser indenizados pela União por meio do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e retirados dos territórios.
"É preciso comunicar às autoridades para entrar em ação e ajudar o povo Pataxó. A Funai não se move mais em nada", relatou outra liderança pataxó a reportagem.
A reportagem entrou em contato com a Polícia Militar da Bahia e com a Funai, mas até o momento da publicação não obteve resposta.
Histórico de conflitos
Em 2006, começou um processo de levantamento histórico para demarcação da Terra Indígena Comexatiba Cahy-Pequi, na cidade de Prado, a cerca de 200 km de Porto Seguro.
No ano seguinte foi entregue um relatório à Funai com análise minuciosa de uma antropóloga, que fez estudos considerando a parte ambiental, histórica, agrária e cartográfica para definir a área a ser demarcada.
Somente em 2015, contudo, a Funai publicou no Diário Oficial o relatório com a delimitação de 28 mil hectares. O tamanho seria menor do que o reivindicado pelos indígenas, mas o órgão alegou à época que uma área mais extensa seria difícil de controlar.
No perímetro delimitado estão fazendas de agricultores locais, principalmente de eucalipto, monocultura que domina a região, e que contestam a demarcação dos territórios indígenas. Desde então, a comunidade espera uma manifestação da Funai para dar celeridade ao processo de registro e garantir a sua segurança jurídica.
No dia 22 de julho, pataxós da Aldeia Alegria Nova, incomodados com a demora da Funai e falta de ação do estado brasileiro, começaram o processo de ocupação da Fazenda Santa Bárbara, onde em 2000 houve um massacre com quatro mortes e espancamentos.
Eles tentam resistir no local, mas sofrem cotidianamente com ameaças e repressão de homens supostamente contratados pelos fazendeiros. Os indígenas também sofrem com a falta de água potável, devido às nascentes que secaram nos últimos anos, situação agravada pela monocultura de eucalipto na região.
O cultivo em larga escala provoca grande impacto ambiental com uso de insumos químicos e com a degradação que atrapalha a cultura de outras espécies, com a monocultura de eucalipto.
A comunidade também tem dificuldades para conseguir mantimentos nas cidades vizinhas, pois tem medo de retaliação e emboscadas nas estradas.
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