SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) -Embora a prescrição de antidepressivos para tratar a obesidade seja considerada adequada por especialistas em alguns casos, pacientes relatam insegurança e falta de informação quanto ao uso dos medicamentos. Cloridrato de fluoxetina, de sertralina e de bupropiona são os mais recomendados em consultório.
Segundo Fábio Trujilho, diretor do departamento de obesidade da SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) e vice-presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica), as instituições que representa consideram correta a prescrição de antidepressivos para o tratamento da obesidade desde que a alternativa seja recomendada para pacientes que não responderam de forma satisfatória a medicamentos específicos para a finalidade, como a sibutramina e o orlistate.
O uso de remédios para tratar doenças diferentes daquelas determinadas na bula e aprovadas pela Anvisa (Agência Brasileira de Vigilância Sanitária) é conhecido como off label. Apesar de não existir a recomendação da fabricante, os medicamentos mais usados para fins diferentes dos indicados têm o respaldo de estudos científicos que comprovam sua eficácia, afirma Trujilho.
Em nota, a Anvisa afirma que "não regulamenta o uso off label. Contudo, esse uso deve ser baseado em evidências científicas e sustentadas na responsabilidade do médico prescritor a partir da avaliação do quadro clínico de cada paciente".
Segundo Durval Ribas, presidente da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia), alguns antidepressivos funcionam para o emagrecimento porque atuam no sistema nervoso central da mesma maneira que a maioria dos remédios antiobesidade.
"Percebeu-se que alguns antidepressivos tinham um efeito no sistema nervoso central relacionado aos neurotransmissores que diretamente estavam interligados ao mecanismo de fome e de saciedade", afirma Ribas.
Embora profissionais apontem que a prescrição é recomendada em alguns casos, pacientes relatam insegurança e falta de informação.
Maria (nome fictício, a pedido) conta que, apesar de ter emagrecido nos primeiros meses em que tomou fluoxetina, voltou a engordar e não viu benefícios a longo prazo. Além do efeito sanfona, ela relata enjoo e irritabilidade como desvantagens do tratamento conduzido por um endocrinologista.
Segundo ela, a insegurança ao tomar o antidepressivo também foi um problema, já que o médico não explicou devidamente o porquê da prescrição.
"Acho que na maioria das vezes o medicamento é passado sem se dar outras alternativas para a pessoa", afirma. Após a frustração com o tratamento, ela decidiu intensificar os cuidados com a dieta e fazer exercícios físicos.
Caso similar é o de Ana Paula Siqueira, 54, profissional de relações públicas que tomou antidepressivos para tratar sobrepeso em dois momentos da vida. Ainda que sempre com indicação médica, Siqueira relata ter se sentido mal com o tratamento. Ela acredita que a prescrição não era adequada.
Incentivada por sua psicóloga, Siqueira interrompeu o uso da sertralina depois de apenas 10 dias de uso. "Me sentia culpada", afirma.
Após a experiência, ela emagreceu 10 kg com dieta e exercícios físicos. Hoje, mantém o foco nesse tipo de tratamento por considerar uma estratégia mais natural, além de usar uma injeção para tratar a pré-diabetes.
Para José Carlos Appolinário, psiquiatra e coordenador da Comissão de Transtornos Alimentares da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria), o uso de antidepressivos para tratar a obesidade deve ocorrer somente depois de esgotadas outras alternativas. Segundo ele, não há estudos suficientes para garantir a efetividade do tratamento a longo prazo.
O psiquiatra explica que, embora a utilização isolada dos remédios não tenha essa comprovação, a Anvisa liberou a associação de bupropiona com naltrexona, medicamento usado no combate à dependência de opiáceos e álcool, para o tratamento antiobesidade.
Segundo Appolinário, o paciente que recebe a prescrição de antidepressivo para emagrecer deve, sempre que tiver dúvidas, procurar o acompanhamento de um psiquiatra.
O endocrinologista Fábio Trujilho reforça que nem todo tratamento precisa ser medicamentoso, mas que é necessário desmistificar o uso de remédios para quem precisa.
"A medicação bem prescrita, para a pessoa certa na dose certa, vai contribuir. Mas também vemos o uso indiscriminado e prescrições que não são adequadas", afirma ele.
Segundo Trujilho, o uso de medicamentos é indicado para pacientes que tenham IMC (índice de massa corporal) maior que 30 e que não tenham emagrecido apenas com mudanças no estilo de vida. Pessoas com IMC maior do que 27 e com outras comorbidades relacionadas à obesidade, como artrose ou gordura no fígado, também se encaixam na indicação.
O médico afirma que a maneira como o profissional aborda o tema com o paciente também é importante. Segundo ele, o correto é explicar as alternativas aos pacientes, que devem ter uma postura ativa durante a consulta, e não impor formas de tratamento.
Por último, Trujilho declara que o paciente nunca deve se automedicar ou fazer um tratamento sem o acompanhamento de um especialista. Os riscos do uso dos remédios sem acompanhamento médico são vários, como piora na hipertensão, complicação cardiovascular, taquicardia, desequilíbrio emocional e morte, afirma.
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