BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Às vésperas das eleições, o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) convocou servidores a participarem de um culto evangélico com uma pastora bolsonarista no auditório do órgão. O comunicado foi distribuído por vários dias aos servidores a partir de um email oficial da autarquia.
O culto ocorreria na segunda-feira (26) com a pastora Delci Magalhães, defensora do presidente Jair Bolsonaro (PL) nas redes sociais. A celebração, que seria realizada dentro do órgão e no meio do expediente, acabou cancelada após a associação de servidores do FNDE divulgar nota em que afirma que o culto constituiria agressão à laicidade do Estado brasileiro.
Ligado ao MEC (Ministério da Educação), o FNDE é responsável por ações como transferências de recursos a prefeituras. O órgão está envolvido em denúncias de corrupção, inclusive com a atuação de pastores em tratativas para liberar recursos a aliados.
A mensagem foi distribuída diariamente desde ao menos o dia 20, segundo servidores. Os emails, com convites elaborados, partiram do endereço comunicador@fnde.gov.br e chamavam para a celebração que ocorreria às 12h de segunda-feira (26).
Em condição de anonimato, funcionários dizem ser algo inédito que a própria direção da instituição se envolva na convocação de um evento religioso. Não é incomum que servidores religiosos organizem orações, por exemplo, mas sem uma mobilização oficial como a que ocorreu.
Há ainda relatos sobre sensação de constrangimento e de um viés eleitoral entre os servidores.
Questionado, o FNDE não respondeu à reportagem. A autarquia não informou, por exemplo, quem organizou o culto e se ele foi remarcado para outra data.
O culto não chegou a ser desmarcado oficialmente. Somente no local é que algumas pessoas foram avisadas que o encontro não ocorreria mais.
Os evangélicos constituem uma das principais bases de apoio do presidente Bolsonaro, que tenta a reeleição. O apoio da pastora Delci Magalhães a Bolsonaro é explícito nas redes.
A pastora tem mais de 11 mil seguidores na internet e faz diversas postagens em favor de Bolsonaro. Há, inclusive, publicações dela ministrando culto no auditório do Ministério da Saúde.
Ela também costuma publicar conteúdos amplamente compartilhados pela base bolsonarista, como convocações para as manifestações de 7 de Setembro deste ano.
O vídeo postado por ela traz um discurso de Bolsonaro com críticas ao STF (Supremo Tribunal Federal) coberto de imagens de Brasília. Em um dos trechos, o presidente afirma que "quase toda a população está apavorada com a supressão de liberdade de alguns poucos que habitam a Praça dos Três Poderes".
A pastora foi procurada, mas não respondeu aos questionamentos da reportagem até a noite de terça.
A nota da associação de servidores do FNDE de sábado (24) pede que a direção do fundo "se abstenha da utilização do aparato de comunicação, bem assim das estruturas logísticas e patrimoniais da Autarquia, a fim de promover denominações ou práticas religiosas, seja elas quais forem, haja vista o evidente caráter laico do Estado, na forma da legislação em vigor".
A entidade diz que o convite para o culto causou "estranhamento" por ter partido "de email institucional" e por haver "flagrante uso da estrutura da autarquia para fins diversos daqueles que pormenorizam suas missões institucionais".
O FNDE é controlado pelo centrão, outro grupo de sustentação do presidente. O presidente do FNDE, Marcelo Lopes da Ponte, foi chefe de gabinete do de Ciro Nogueira (PP-PI) -ministro da Casa Civil e líder do centrão.
Além de estar no centro das denúncias de corrupção que resultaram na prisão do ex-ministro da Educação, o também pastor Milton Ribeiro, o FNDE também acumula falhas de gestão durante a gestão Bolsonaro. O órgão cometeu erros em transferências milionárias de recursos carimbados da educação, como a Folha revelou.
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