SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O currículo de formação dos médicos deve ser atualizado para incorporar conceitos de oncologia já no primeiro ano de graduação, e os cursos precisam desenvolver nos alunos habilidades como comunicação e capacidade de trabalhar em equipe
Esses foram pontos defendidos por especialistas em oncologia que participaram da 9ª edição do Congresso Todos Juntos Contra o Câncer, que começou na manhã desta terça-feira (27), em São Paulo.
O evento acontece até quinta-feira (29) e reúne especialistas de diferentes áreas da saúde, referências na oncologia nacional e internacional. O congresso é uma realização do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer, entidade que reúne mais de 200 organizações da sociedade civil.
"Essa história de esperar quatro anos para chegar um iluminado na sala de aula para dizer tudo o que o aluno precisa saber sobre oncologia custa muito tempo. Esse conhecimento tem que ser ensinado ao longo do curso", afirma Edson Arpini Miguel, professor de saúde coletiva da Universidade Estadual de Maringá.
Além de inserir o assunto mais cedo na grade curricular, o especialista diz que os cursos precisam estimular no estudante competências não apenas acadêmicas. Ele cita como exemplo a capacidade de colaborar com outras pessoas e de se comunicar com clareza.
"Competência é uma mistura de habilidade, conhecimento e atitude. Não é sobre quem é melhor que os outros", diz ele, acrescentando ser importante atualizar a formação dos médicos porque a própria medicina passou por transformações.
"A gente quer mudar o ensino porque a assistência mudou. Não fazemos mais atendimento de parada cardiorrespiratória como fazíamos há 30 anos. Então por que a aula continua a mesma?"
Na UFPA (Universidade Federal do Pará), o currículo já foi atualizado para dar mais espaço para a oncologia. De acordo com Marianne Fernandes, professora visitante da instituição, o tema se tornou matéria obrigatória do curso de medicina, onde ensinam como atender pacientes oncológicos e como identificar sintomas.
Segundo Fernandes, a maior parte das universidades apresenta conceitos de oncologia de forma pontual ao longo do curso, mas isso não se dá de modo contínuo.
"Falar de educação em oncologia é um desafio. Muitos acham que vão aprender o básico no assunto e está tudo bem, mas um profissional deve estar preparado para atuar em todas as áreas", diz ela.
A especialista diz ainda ser preciso estimular o professor a sair de sua zona de conforto para buscar atualização. "A gente tem que incentivá-los a fazer diferente em vez de ficar no padrão. O padrão não existe mais."
Professor do programa de residência do Inca (Instituto Nacional de Câncer), Mario Jorge Sobreira diz ser importante ensinar os alunos sobre letramento em medicina, ou seja, a capacidade de saber dialogar bem com o paciente e com membros da equipe.
"Nós precisamos conseguir falar uns com os outros. Letramento nada mais é do que isso. É entender o que está sendo dito."
Ele defende que isso é importante porque a equipe que acompanha os pacientes pode ser composta por múltiplos profissionais, desde fisioterapeutas a assistentes sociais. "Você tem que fazer a adequação da linguagem para que cada um deles possa entender o que está sendo dito."
Além disso, o especialista diz que os médicos devem usar linguagem acessível para se comunicar com o paciente. "Ele deve compreender a sua situação e o itinerário que vai realizar dentro do centro de saúde. São aspectos fundamentais que a gente precisa trabalhar na formação em oncologia."
Residente em oncologia-hematologia, a assistente social Eduarda Maria Campelo sabe bem a importância do diálogo entre pacientes e profissionais de saúde.
Ela conta que, na unidade em que atua, uma paciente com leucemia pediu para ver os familiares, mas eles não eram autorizados a comparecer ao centro médico em razão da pandemia.
"Mas a nossa equipe não mediu esforços para realizar esse desejo. Na quarta tentativa, a gente conseguiu a liberação da visita", diz Campelo. "Feita a visita, a paciente morreu no dia seguinte."
Essa experiência inspirou a criação do Correio Afetivo, um projeto que conecta o paciente com parentes por meio de cartas.
O projeto é importante, diz ela, para pessoas que não podem visitar os familiares com frequência por falta de dinheiro para o deslocamento. "O paciente no leito tem desejos e gostos. A gente precisa ajudá-lo a realizar essas vontades", diz ela.
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