RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O número de operações policiais no Rio de Janeiro teve um aumento de quase 240% em meses que antecederam as eleições de outubro, em comparação ao mesmo período do ano passado.
O levantamento, feito pela reportagem com base em registros do Ministério Público, mostra que nos meses de junho, julho e agosto deste ano foram registradas 333 operações no estado. Já no mesmo período de 2021 foram 98 ações policiais.
Para especialistas, há indícios de que o governador Cláudio Castro (PL), que concorre à reeleição, tenha ganho político com o aumento das ações. Procurada, a assessoria do Governo do Estado do Rio disse que iria se manifestar pela Polícia Militar. A PM, por sua vez, declara que "a corporação atua dentro de protocolos técnicos e em cumprimento rigoroso das determinações legais vigentes".
Já a coordenação da campanha eleitoral de Castro afirmou que não irá se manifestar.
Os registros do mês de setembro ainda não foram divulgados pela Promotoria, que é avisada até 24 horas após o início de uma operação, de acordo com determinação da ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) 635, em vigor desde junho de 2020.
A decisão do ministro Edson Fachin do STF (Supremo Tribunal Federal) ficou conhecida como "ADPF das favelas" e limitou as operações em comunidades do Rio, durante a pandemia, a casos excepcionais.
Se a comparação da deflagração de operações levar em conta somente o mês de agosto foram 116 realizadas neste ano, contra 39 do mesmo mês de 2021, um aumento de 197%. A maioria delas foi realizada pela Polícia Militar.
Oficiais da corporação afirmam que as operações, como a que ocorreu no Complexo da Maré, zona norte do Rio, na segunda (26), deixando sete mortos, nunca teria ocorrido nas vésperas do período eleitoral.
À Folha de S.Paulo um coronel da PM, sob condição de anonimato, disse que não era comum ter operações policiais tão próximas do período eleitoral como neste ano. Em 25 anos de carreira, diz ser a primeira vez que nota essa constância.
O coronel Robson Rodrigues, atualmente especialista do Labes-Uerj (Laboratório de Estudos Socieducativos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro), confirma a atipicidade de operações no período que antecede as eleições. Ele foi chefe do Estado-Maior da corporação, em 2015, cargo que, entre outras funções, avalia e autoriza operações.
"O recomendado é que a operação ocorra somente se for algo excepcional. Não é comum ter uma operação próximo a datas com grande circulação de pessoas ou em festas, como eleições, Carnaval, Réveillon", disse.
Rodrigues disse que percebeu um aumento de ativismo policial com ganho político baseado em operações.
"Há candidatos que usam operações policiais como plataforma política. Se há uma ordem do Palácio Guanabara [sede do governo estadual] para o aumento de operações, eu não sei. Mas seria um desvio de finalidade das polícias e algo muito temerário, pois coloca a população e o policial em risco em troca de votos. Isso seria um desvio de finalidade", disse.
A Folha de S.Paulo apurou que há pesquisas internas feitas pelo Palácio Guanabara apontando apoio da população à política de confronto, que reverberam em votos.
Sílvia Ramos, coordenadora da Rede de Observatórios de Segurança, também avalia que há uso das polícias para fins eleitorais. "Isso é muito preocupante para um estado com a nossa história traumática de megaoperações em favelas. É preciso inteligência e investigação para desarticular quadrilhas armadas, não helicópteros e blindados dando tiros em cima de favelas", afirmou.
Para Daniel Loyzola, defensor público do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, operações acarretam, além do aumento de violência, "capitalização política e econômica de alguns grupos", declarou. "Fora o uso de plataforma política, há o crescimento de milícias. Formalmente, a ADPF está em vigor, mas perdeu sua efetividade. Não existe critério do que é excepcional", disse.
O que diz a PM Procurada, a Secretaria de Estado de Polícia Militar diz que a corporação "atua dentro de protocolos técnicos e em cumprimento rigoroso das determinações legais vigentes". O saldo operacional, diz, revela o grau de complexidade enfrentado diariamente pelos policiais nas operações.
"Durante as ações, eventuais confrontos são provocados por criminosos fortemente armados, que tentam impedir a presença do Estado em espaços públicos. Os ataques destes criminosos ocorrem em operações planejadas, devidamente comunicadas ao Ministério Público, e principalmente em missões de rotina de patrulhamento"
A PM diz que, somente neste ano, prendeu mais de 22.700 criminosos e apreendeu mais de 4.600 armas de fogo, "entre as quais mais de 260 fuzis idênticos aos utilizados em guerras convencionais".
A corporação também diz que os números do ISP (Instituto de Segurança Pública), do governo do Rio, apontam redução no índice de letalidade violenta no último ano. No acumulado de janeiro a agosto deste ano, a taxa caiu 11,5% em relação ao mesmo período do ano passado.
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