SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Prefeitura de São Paulo foi acionada junto ao Ministério Público paulista e ao Tribunal de Contas do Município por parlamentares que questionam a implementação do Smart Sampa, serviço de monitoramento que prevê, entre outros pontos, o uso da tecnologia de reconhecimento facial como parte do sistema de segurança pública da capital.
De acordo com o Executivo municipal, a iniciativa busca modernizar e ampliar o sistema de monitoramento por câmeras da cidade. "Com recursos de identificação facial e detecção de movimento, as câmeras reconhecerão atitudes suspeitas, pessoas procuradas, placas de veículos e objetos perdidos", afirma um portal informativo do órgão municipal.
Em uma primeira versão, o edital que lançou o programa afirmava que o rastreamento de pessoas suspeitas se daria por meio de "diferentes tipos de características como cor, face", entre outras. A menção à cor foi retirada após repercussão negativa.
"A cor da pele como critério de rastreamento traz embutido suspeição odiosa em face das pessoas pretas, sendo revelador do racismo estrutural em que vive a nossa sociedade", afirma o deputado federal Orlando Silva (PC do B-SP), em ofício ao Ministério Público de São Paulo.
Procurada pela coluna, a Prefeitura de São Paulo afirma, por meio da Secretaria Municipal de Segurança Urbana, que as acusações são improcedentes. "Em nenhum momento o programa Smart Sampa prevê o uso generalizado do reconhecimento facial, muito menos com base em critérios de grupos sociais previamente definidos", diz.
A leitura atenta do edital mostra claramente que essa orientação não existe e que a utilização do reconhecimento facial é um recurso que ficará à disposição do Poder Judiciário, das Polícias Militar e Civil e, complementarmente, à Guarda Civil Metropolitana", afirma ainda.
Atual presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Orlando Silva afirma que a política é "odiosa" e "higienista" por incluir, entre as atividades suspeitas que poderiam ser identificadas pelo sistema de monitoramento, a prática de pedir esmolas.
"O reconhecimento facial generalizado e focado em grupos sociais previamente definidos são incompatíveis com o Estado democrático de Direito, possível apenas em estados totalitários, policiais, jamais numa democracia pujante como a brasileira", diz o deputado.
"É evidente que a segurança pública merece investimento em tecnologia e inteligência, é óbvio que todos aspiram por uma cidade mais segura, mas não às custas de princípios constitucionais caros", acrescenta.
Nesta quinta-feira (1º), os vereadores de São Paulo Erika Hilton (PSOL), Eduardo Suplicy (PT), Daniel Annenberg (PSB) e Celso Gianazzi (PSOL) enviaram uma representação ao Tribunal de Contas do Município em que pedem a suspensão do edital do Smart Sampa.
Eles afirmam que o uso de uma tecnologia de reconhecimento facial pode se somar a violências já praticadas contra pessoas negras, "que são abordadas de maneira conflituosa e injustificada por autoridades policiais" e confundidas com criminosos simplesmente por serem negras.
Dizem, ainda, que o mau uso do reconhecimento facial na segurança pública pode gerar práticas discriminatórias contra transexuais e travestis, imigrantes, neurodivergentes e pessoas em situação de rua por causa do "racismo algorítmico".
Os vereadores da capital paulista também criticam o edital por falar em comportamento "mendicante" como um tipo de atividade suspeita. "Num país que tem milhões de cidadãos sofrendo os efeitos dilacerantes da crise sanitária e econômica, que acentuou severamente a situação de desemprego entre os brasileiros, estaria a Prefeitura de São Paulo intencionando perseguir e punir condutas praticadas por setores sociais que estão em completa situação de vulnerabilidade?", questionam.
"Estaria a Prefeitura intencionando vulnerabilizar, ainda mais, a população em situação de rua, que hoje soma mais de 42 mil pessoas apenas na cidade de São Paulo?", seguem.
Os parlamentares pedem ao tribunal de contas que a suspensão do edital seja mantida até que seu conteúdo seja apreciado de forma detalhada e que se ouça a sociedade civil e grupos diretamente atingidos pela política pública proposta.
"Embora tenha havido consulta e audiência pública sobre o tema, o portal da prefeitura não informa se o processo de escuta social foi positivo, se contou com a participação efetiva de munícipes paulistanos e pessoas diretamente atingidas pela iniciativa e, pior, se a prefeitura está efetivamente levando em consideração as contribuições eventualmente apresentadas pela sociedade civil", afirmam.
Leia, abaixo, a íntegra da nota enviada à coluna pela Prefeitura de São Paulo:
"A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), esclarece que são totalmente improcedentes as acusações citadas pela reportagem. Em nenhum momento o programa Smart Sampa prevê o uso generalizado do reconhecimento facial, muito menos com base em critérios de grupos sociais previamente definidos. A leitura atenta do edital mostra claramente que essa orientação não existe e que a utilização do reconhecimento facial é um recurso que ficará à disposição do Poder Judiciário, das Polícias Militar e Civil e, complementarmente, à Guarda Civil Metropolitana.
O Smart Sampa é um projeto que visa integrar os mais diversos serviços municipais e garantir mais segurança aos cidadãos e agilidade nas ações das instituições públicas por meio de sistema digital, com equipamentos de última geração, integrando plataformas de diferentes órgãos públicos. O projeto foi desenvolvido com base na legislação em vigor referente à gestão e armazenamento de dados dos cidadãos e prevê diversos mecanismos de controle e fiscalização de uso do sistema, conforme edital anexo. O processo de licitação dos equipamentos segue em andamento, de forma transparente e com acompanhamento de outras instituições públicas e vinculadas à sociedade civil."
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