SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A aluna da USP Alicia Dudy Muller Veiga, 25, suspeita de desviar quase R$ 1 milhão da festa de formatura da sua turma da Faculdade de Medicina, aparece como beneficiária de R$ 3.000 do Auxílio Emergencial.
Ela recebeu a ajuda, criada no governo de Jair Bolsonaro (PL) para reduzir os danos sociais da Covid-19, durante cinco meses, entre junho e novembro de 2020. O valor não foi devolvido à União.
Além disso, em setembro do ano passado, Veiga abriu uma empresa com capital de R$ 1 enquadrada como MEI (Micrompreendedor Individual). De acordo com a Receita Federal, a empresa ainda está com CNPJ ativo.
Veiga foi aprovada no curso de farmácia, em 2017, mas decidiu estudar por mais um ano. Em 2018, ela passou no vestibular para medicina da USP, um dos cursos mais concorridos do país. Após a aprovação, em entrevista ao jornal da universidade, ela afirmou que se interessava pela área de cirurgia.
"É muito sensível, delicado e desafiador", disse ela na ocasião. Em outro depoimento, colhido pelo cursinho Poliedro, ela disse que tinha um sentimento de compensação por ter conseguido ingressar na USP.
"É como se todo o tempo que você gastou fazendo simulado, aula, parece que aquilo não foi nada comparado com o dia que você vê o seu nome na lista", afirmou. De acordo com o seu perfil na plataforma acadêmica Lattes, ela fez ensino médio na Escola Técnica Estadual Getúlio Vargas, localizada no bairro do Ipiranga, na região central de São Paulo.
Aluna do sexto ano, Veiga também aparece na lista dos estudantes que receberam orientação da cardiologista Ludhmila Hajjar, diretora da unidade de cardio-oncologia do Incor (Instituto do Coração) do Hospital das Clínicas da USP que em março de 2021 recusou o convite para ser ministra da Saúde do governo Bolsonaro.
Procurada, Hajjar disse que não comentaria o caso da estudante.
A reportagem entrou em contato com Veiga nesta quarta-feira (18), mas ela afirmou que não falaria com a imprensa. A reportagem também a procurou em sua casa, na terça, e ela disse que não atenderia. Alunos da USP afirmam que também foram orientados juridicamente a não dar declaração sobre o fato.
Um estudante de medicina da USP, que tinha pagado pela formatura e pediu para não ser identificado, afirmou que Veiga é uma pessoa "normal" e "simpática".
Veiga era presidente da comissão de formatura. Aos colegas, em um grupo de WhatsApp, ela afirmou ter investido cerca de R$ 800 mil do fundo no Sentinel Bank, uma corretora de investimentos. A estudante diz ter sofrido um golpe e perdido todo o dinheiro e gasto o restante, cerca de R$ 120 mil, com advogados para tentar reaver os valores.
"Estou escrevendo para dizer que não temos dinheiro. Com toda a dor, culpa e arrependimento que vocês podem imaginar", diz a mensagem da estudante enviada no grupo.
Nota assinada pelos alunos da comissão afirma que a suspeita descumpriu "o Estatuto ao movimentar esse montante sem a assinatura de nenhum outro membro e transferindo-o a uma conta pessoal sua" e que "a atitude não representa moral e eticamente a postura dos demais membros desta comissão e os mais de 110 alunos aderidos".
Em geral, para aderir à formatura, alunos desembolsavam cerca de R$ 12 mil -quem comprovasse baixa renda pagava R$ 6.000.
O caso está sendo apurado pelo Deic (Delegacia Especializada em Investigações Criminais) de São Bernardo do Campo (Grande SP). A estudante já era alvo de investigação por suspeita de tentativa de golpe em uma lotérica.
De acordo com informações do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) fornecidas à Polícia Civil, ela ganhou sete vezes na loteria entre abril e julho de 2022 -ela apostou ao menos R$ 397 mil e ganhou R$ 366 mil em prêmios.
Na terça, a delegada responsável pelo caso afirmou que apura ainda se Veiga agiu sozinha ou se teve ajuda de outras pessoas e disse que "tudo indica" que a suspeita tenha usado o dinheiro do fundo de formatura para fazer as apostas.
Por meio de nota publicada nas redes sociais, a Faculdade de Medicina da USP afirmou que os fatos estão sendo apurados e que a diretoria está apoiando na orientação aos alunos envolvidos.
A reportagem tentou contato com a Sentinel Bank, mas não obteve retorno. O site da empresa estava fora do ar nesta quarta.
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