Em um dia de muito sol e calor no verão carioca, um grupo de amigos e amigas resolveu comemorar o seu dia de uma forma muito comum e natural para temperaturas acima dos 30 º Celsius (ºC): indo à praia. Mas, para esse grupo, o ato corriqueiro para a maioria das pessoas de ir à praia é um ato político. Eles e elas são ativistas, homens e mulheres transexuais e travestis.
O coordenador da Marcha Trans e Travesti do Rio de Janeiro, Gab Van, destaca que o ato Ocupa Leme, praia na zona sul da cidade, foi pensado para expor os corpos considerados “fora do padrão”, na comemoração do Dia da Visibilidade Trans, que é celebrado em 29 de janeiro.
“Hoje, ocupar esse espaço, ocupar o Leme, para a gente é um ato de militância. Porque muitas pessoas nunca vieram depois da sua transição [de gênero]. Não voltaram às praias. Então, voltar com uma outra perspectiva, com um outro olhar, com uma outra presença, e se sentindo acolhido e pertencente a esse lugar, traz não só uma qualidade de vida, para além do sentimento de pertencimento. O sentimento de existir. Eu posso existir em todos os lugares”, disse Gab.
Ir à praia para pessoas transexuais e travestis pode representar perigo e agressão - Fernando Frazão/Agência Brasil
Atuante na ONG Capacitrans, Ágata Tariga, disse que o Dia da Visibilidade Trans remete à 2004, quando foi lançada em ato em Brasília a campanha Travesti e Respeito. Para ela, ir à praia cotidianamente pode representar perigo e agressão.
“Nós não somos corpos muito passáveis, somos corpos diversos. E por ser mulheres e homens trans, muitos não mastectomizados, e outras trans com corpos fora do padrão, então a gente fica meio receoso de vir à praia, porque só o fato de vir à praia a gente já é olhado com outros olhares, xingamentos ou o assédio sexual. Então se a gente ocupar a praia, todo mundo junto, vai se sentir mais à vontade. A gente nota que até os olhares mudam, porque muitos estão aqui. Se é uma só, um só, realmente são diferente os olhares”, disse.
Ágata lembra que, nas últimas décadas, alguns direitos foram alcançados pela população trans, como fazer a terapia hormonal pelo SUS, o nome social nos documentos e o direito à retificação de nome e gênero na certidão de nascimento.
Bancada trans
Deputada estadual eleita, Dani Balbi comemora este histórico 29 de janeiro, às vésperas da posse da primeira bancada trans na Câmara Federal. Os parlamentares eleitos em outubro serão empossados na quarta-feira (1º).
“Nós temos ali a Duda Salabert, a Érica Hilton, ocupando aquele espaço com toda a qualidade política, com toda a história e densidade. Para dizer que mulheres trans, travestis, pessoas LGBTQIA+ precisam estar ali para falar de si, mas para falar também de pautas urgentes que interseccionam a existência de pessoas transsexuais e travestis. E aqui no estado do Rio de Janeiro, eu, em outros lugares, em Natal a minha companheira Linda Brasil. Então são muitas experiências, é um avanço tímido e a gente espera que cada vez mais a gente continue avançando”, disse a deputada estadual eleita.
De acordo com Dani Balbi, a estimativa é que no Rio de Janeiro cerca de 15 mil pessoas se declarem transexuais. Essas pessoas têm demandas específicas a serem atendidas pelas políticas públicas.
“A gente espera fazer um mapeamento qualitativamente denso, não só quantitativamente, para que a partir daí a gente possa balizar as políticas públicas. São fundamentais, principalmente aquelas que garantem acesso à educação formal, porque a maioria das pessoas transexuais e travestis acaba sendo evadida da escola. E também saúde pública. Porque a saúde das pessoas transexuais e travestis é peculiar, exige algum grau de peculiaridade, de especificidade e de formação”.
Outros eventos marcam o Dia da Visibilidade Trans no Rio de Janeiro, como a feira de empreendedorismo 1º Mercado Mundo Trans, no Museu de Arte do Rio na Praça Mauá e intervenções artísticas da cena Ballroom no evento Transcentralidades, na Lapa.