RECIFE, PE (FOLHAPRESS) - A Justiça Federal negou nesta quarta-feira (1º) um pedido do Ministério Público Federal para impedir que o casco do porta-aviões São Paulo seja afundado em águas brasileiras. O pedido foi feito na terça (31), após se tornar pública a intenção da Marinha de adiar o afundamento em razão de oferta de um grupo saudita para adquirir o casco.

De acordo com o MPF, o ajuizamento da ação foi motivado por informações de que o afundamento da embarcação estaria programado para esta quarta-feira (1º).

Na decisão, o juiz Ubiratan de Couto Maurício, da 9ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco, justificou a rejeição da alegação de "plausibilidade" do pedido de decisão liminar.

"Se a posição da Marinha Brasileira é pelo afundamento de que se cuida, compreensão amparada pela presunção ôntica da legitimidade de seus atos, não é minimamente crível que a extensão do dano ambiental não tenha sido por ela considerado em juízo de ponderação dos interesses", escreveu o magistrado.

O juiz também escreveu que o "interesse coletivo" prevalece e determinou que o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) seja informado da decisão.

O casco do São Paulo é composto de nove toneladas de amianto, substância com potencial tóxico e cancerígeno.

A proposta do grupo saudita, oferecendo cerca de R$ 30 milhões, foi feita na segunda-feira (30), após a Folha de S.Paulo revelar que a Marinha planejava afundar a embarcação diante do avançado grau de degradação do antigo aeródromo.

Com a proposta, a Marinha decidiu adiar o afundamento do casco, que estava previsto para ocorrer nesta quarta-feira (1º). Fontes militares não descartam a possibilidade de a embarcação naufragar de forma involuntária, já que as condições de flutuabilidade do navio estão péssimas.

O MPF pedia, na ação, que a Justiça Federal determinasse à Marinha a imediata suspensão de "qualquer serviço voltado ao afundamento da embarcação, em alto-mar ou próximo ao litoral, sem a apresentação de estudos que comprovem a ausência de risco ambiental".

O objetivo do MPF, conforme consta na ação, era evitar que a decisão de afundamento cause "dano irreparável ao meio ambiente marinho, à saúde pública da população e consequências sanitárias irreversíveis".

Na ação, o MPF pediu ainda que o Ministério da Defesa promova estudos técnicos para a adequada destinação do casco, sem riscos ao meio ambiente e à saúde pública, ou opte pela venda do ex-navio a alguma empresa com condições para fazer os reparos necessários ao descarte seguro.

No dia 13 de janeiro, quando foi submetido a uma inspeção técnica, o porta-aviões navegava, sob reboque, a 20 milhas náuticas do Porto de Suape, em Pernambuco.

O porta-aviões São Paulo tem 266 metros de comprimento. Seu armamento era composto de três lançadores duplos de mísseis e metralhadoras de grosso calibre.

Inutilizado há décadas, o navio passou por um desmanche na França. Na década de 1990, ele chegou a passar por um processo de desamiantação, que retirou 55 toneladas do produto tóxico.

Mesmo assim, o amianto ainda está presente nas paredes do porta-aviões -a substância era usada como isolante térmico e acústico, para reduzir o barulho da decolagem das aeronaves para a tripulação.

O porta-aviões foi vendido pela Marinha ao estaleiro turco Sök Denizcilik and Ticaret Limited, especializado em desmanche de navios. O veículo deixou o Brasil no dia 4 de agosto, em viagem que gerou protestos pelo mundo e foi monitorada em tempo real pelo Greenpeace.

A Marinha diz que, após a decisão de desmobilizar o porta-aviões, optou pela venda do casco para "desmanche verde", um processo de reciclagem segura para o qual o estaleiro turco Sök é credenciado e certificado.

Mas, diante de denúncias sobre a exportação ilegal de amianto, o governo turco revogou autorização para entrada da embarcação no dia 26 de agosto, quando o navio se aproximava do estreito de Gilbraltar, em viagem feita com o auxílio de um rebocador.

A decisão atendeu a denúncias de organizações como o Greenpeace e a ONG Shipbreaking Platform, que protestavam contra o recebimento do navio.

Análises feitas pela ONG Shipbreaking em um porta-aviões gêmeo ao São Paulo identificou 760 toneladas de amianto na embarcação. Diante disso, a organização passou a questionar se, de fato, o casco enviado pelo Brasil teria as 10 toneladas da substância tóxica como previsto no inventário.

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) suspendeu a licença de exportação e determinou o retorno do navio ao Brasil.

Em águas brasileiras, os rebocadores turcos deixaram o casco do porta-aviões e a Marinha voltou a assumir o controle da embarcação.

O relatório de uma perícia técnica da Marinha realizada na embarcação em 13 de janeiro constatou rasgos no casco, aumento no nível de alagamento e corrosão.

"Pode ser constatado o aumento crítico da degradação da segurança do casco, quer seja pela perda das condições de flutuabilidade, quer seja pela perda irreversível da estabilidade mínima em avaria para navegação em mar aberto, além do aumento da extensão da avaria do casco", alertam os técnicos, em documento obtido pela Folha de S.Paulo.

Até meados de janeiro, cerca de 2.787 metros cúbicos de água entraram no casco. O limite para navegação em segurança é de 3.530 metros cúbicos.

"É possível afirmar que se pode garantir a segurança da navegação até que se chegue ao limite ora estabelecido de embarque de mais 743 m³ de água, prevista para acontecer, nas melhores hipóteses, em, no máximo, quatro semanas", adverte.

Sem empresas no Brasil para realizar o desmanche verde previsto no contrato e com o imbróglio com a empresa turca, a Marinha planejava o afundamento controlado da embarcação.

A técnica utilizada envolveria uma série de explosões para abrir rasgos no casco, o que levaria ao oceano também as mais de nove toneladas de amianto presentes na embarcação.


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