BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Em uma negociação marcada por uma disputa entre a mãe e a ex-mulher da vítima, o governo federal e a família de Genivaldo de Jesus Santos, que morreu asfixiado em uma ação de agentes da PRF (Polícia Rodoviária Federal), não chegaram a um acordo referente à indenização pela morte.
Genivaldo, 38, tinha esquizofrenia. Ele foi morto depois que policiais usaram gás lacrimogênio dentro do porta-malas da viatura em que ele foi colocado após ser detido por dirigir uma moto sem capacete.
A família pretende recorrer à Justiça em busca da indenização. Pessoas que acompanham as negociações afirmam que o valor oferecido pelo governo é de R$ 920 mil ?com três parte iguais de R$ 200 mil para a mãe, o filho e a ex-mulher de Genivaldo, além de R$ 200 mil a título de pensão para a ex-companheira e o filho e R$ 120 mil em honorários advocatícios.
A última proposta feita pela defesa da família, no entanto, foi de R$ 3,6 milhões divididos igualmente entre mãe, a ex-mulher e o filho de Genivaldo ?R$ 1,2 milhão para cada um.
Antes de apresentarem esse número, a mãe e a ex-companheira de Genivaldo chegaram a travar uma disputa na Justiça de Sergipe. Ex-mulher de Genivaldo, Maria Fabiana Estevam Oliveira entrou na Justiça para pedir a anulação de declarante em certidão de óbito de Genivaldo, atestada pela mãe dele, Maria Vicente de Jesus.
Em resposta, os advogados de Maria Vicente disseram que Genivaldo e Maria Fabiana não mantinham união estável havia pelo menos três meses antes da morte e que ela nem compareceu ao velório do ex-companheiro.
"Não só fosse isso, a autora [Maria Fabiana] afirma que conviveu por 17 (dezessete) anos com o Sr. Genivaldo, ou seja, que supostamente iniciou a relação no ano de 2005. Ocorre que, conforme certidão de casamento em anexo, a autora era casada com o Sr. Daniel Costa Estevam, divorciando-se apenas no ano de 2007", diz a petição.
Para provar que Maria Fabiana e Genivaldo já não viviam sob o mesmo teto na época da morte, os advogados da mãe anexaram ao processo um vídeo da casa onde ele morava sem que houvesse objetos pessoais de sua ex-companheira. Depois dessa disputa, porém, as duas teriam se reconciliado e chegaram a um valor comum de indenização.
Mas, com base nas petições, a União pediu a exclusão de Maria Fabiana do polo passivo da ação indenizatória.
A defesa da família de Genivaldo disse, por nota, que a situação foi resolvida entre as partes considerando o bem do filho. "A defesa, portanto, atuou de forma a dirimir todo e qualquer conflito que pudesse existir", disse.
Afirmou ainda já haver nos autos o acervo probatório, inclusive que a companheira era procuradora de Genivaldo.
Fazem parte da negociação membros da Secretaria de Acesso à Justiça do Ministério da Justiça, a AGU (Advocacia-Geral da União), a Educafro (Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes) e os advogados da família.
Marivaldo Pereira, secretário de Acesso à Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública, disse que a pasta segue acompanhando e aberta ao diálogo com o advogado e especialmente com a família de Genivaldo para a construção de um acordo. "Acreditamos que será possível fechá-lo em breve."
A defesa da família de Genivaldo tem como referência principal o caso Carrefour, que pagou R$ 1,1 milhão à viúva de João Alberto, morto após ser agredido por seguranças no estacionamento de uma unidade da rede em Porto Alegre em 2021.
Além disso, a rede de supermercados fechou um acordo de R$ 115 milhões com autoridades e representantes da sociedade civil. O valor do TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) será encaminhado a ações de combate ao racismo e deverá ser investido no prazo de três anos.
A Educafro é autora da ação contra a rede de supermercados que gerou esse acordo milionário e repetiu a iniciativa contra a União no caso Genivaldo.
Antes de iniciadas as tratativas, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse nas redes sociais em 6 de janeiro que havia determinado ao secretário de Acesso à Justiça, Marivaldo Pereira, providências visando à indenização legalmente cabível.
"Genivaldo morreu, em 2022, em face de uma ação de policiais rodoviários federais, em Sergipe. É clara a responsabilidade civil, à luz da Constituição", disse em um trecho da postagem.
No caso, os policiais rodoviários Kleber Nascimento Freitas, Paulo Rodolpho Lima Nascimento e William de Barros Noia viraram réus sob acusação de tortura-castigo e homicídio triplamente qualificado e serão julgados em júri popular.
O advogado Glover Castro, que defende William de Barros Noia, disse que já recorreu da decisão da Justiça.
A PF reconstituiu a cena da morte e concluiu que a detonação de gás lacrimogêneo liberou substâncias tóxicas como monóxido de carbono e ácido sulfídrico. De acordo com a perícia, a concentração de monóxido de carbono foi pequena e a de ácido sulfídrico foi maior, o que pode ter causado convulsões e incapacidade de respirar.
As cenas geraram forte comoção pela violência empregada e ganharam repercussão internacional.
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