SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O trecho remanescente de Mata Atlântica destoa das torres de concreto e vidro na marginal do rio Pinheiros, na zona sul de São Paulo.

A área verde, contígua ao parque Burle Marx, passa de um quilômetro de extensão. Quase a metade dessa floresta é uma reserva pública protegida. A outra porção só resiste na paisagem graças a decisões judiciais provisórias que impedem a construção de prédios no local.

Área contígua ao parque Burle Marx forma último trecho significativo de Mata Atlântica às margens do rio Barulhento, o movimento de moradores SOS Panamby expôs há quase uma década na imprensa a tentativa de supressão da mata nativa por empresas do setor imobiliário que tinham autorização da Prefeitura de São Paulo para construir na área, o que levou o Ministério Público Federal a investigar e denunciar o caso.

A repercussão fez da tentativa de empreender no local um engodo para os proprietários dos terrenos, o Fundo Imobiliário Panamby e as construtoras Camargo Corrêa e Cyrela. Agora, até as empresas defendem a incorporação dos terrenos ao parque.

Falta, porém, convencer o poder público municipal a assumir o custo da desapropriação da área com cerca de 160 mil metros quadrados, que faria o Burle Marx dobrar de tamanho.

Ao entregar à Câmara Municipal a sua proposta de revisão do Plano Diretor, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) não incluiu esses terrenos no quadro de novos parques previstos para a cidade. A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente diz que é necessário aprofundar estudos de viabilidade.

A revisão está na fase de audiências públicas promovidas pela Câmara, etapa anterior à votação do projeto, prevista para ocorrer até junho. Defensores da ampliação da área verde consideram que sua inclusão no plano de parques é uma chance ímpar de desestimular o interesse do mercado pelo espaço.

O terreno está nas franjas do Morumbi, bairro que, apesar de ter perdido posto entre os mais cobiçados da capital paulista, conserva atrativos como a proximidade com regiões nobres que ficam do outro lado do rio.

Acrescentam-se à localização privilegiada outros pontos que tornam o terreno valioso, como a própria floresta no quintal de potenciais novos empreendimentos de luxo.

Rafaela Parkinson, consultora do Fundo Panamby, sugeriu, ao conversar por email com a Folha, que a doação da área ao município poderia ser feita em troca de potencial construtivo em outro terreno da cidade, instrumento legal previsto no Plano Diretor.

Cyrela e Camargo Corrêa também disseram não fazer oposição à desapropriação, mas não deram detalhes de como seria o acordo com o município.

Já a a Fundação Aron Birmann, gestora do Burle Marx há 28 anos e detentora da concessão por mais três décadas, afirma que, embora seja favorável à ampliação do parque, é contra a maneira como a proposta de desapropriação é conduzida.

A fundação ligada ao empresário do setor imobiliário Rafael Birmann, conhecido pelos imóveis corporativos de alto padrão cujo prédio mais famoso tem uma praça com escultura de baleia metálica na avenida Faria Lima, diz que a desapropriação custaria muito caro. A instituição afirma que o valor de até R$ 500 milhões poderia ser destinado a demandas de segmentos carentes da população.

Relator na Câmara do projeto de revisão do Plano Diretor, o vereador Rodrigo Goulart (PSD) diz que propostas sem ônus à municipalidade deveriam ser consideradas. Entre as quais, cita a possibilidade de acordo para a liberação de uma fração do terreno para empreendimentos imobiliários, com a contrapartida de que o proprietário preserve o restante.

PRESERVAR PARA AS FUTURAS GERAÇÕES

Autorizar a derrubada da vegetação, porém, é inviável do ponto de vista ambiental, dizem conservacionistas.

O Burle Marx e o seu entorno representam a última área significativa de Mata Atlântica às margens do trecho urbano do rio Pinheiros, afirma o botânico Ricardo Cardim.

Laudo técnico sobre uma área de brejo próxima à via marginal Pinheiros apontou que a vegetação em estágio médio e avançado de regeneração possui mais de 100 espécies de aves, 490 tipos de borboletas e uma espécie de caramujo que só existe ali.

Cardim afirma que destruir até mesmo uma parte menor da floresta para a exploração imobiliária pode significar a morte desse sistema e um prejuízo irrecuperável do patrimônio natural da cidade.

"Não se trata de eventuais custos do presente, mas de preservar algo que é inestimável em uma metrópole que praticamente não tem mais remanescentes em sua malha urbana. Isso não nos pertence somente, mas às futuras gerações", diz Cardim.

Colocar os terrenos privados no quadro de parques do Plano Diretor é a única saída adequada para o impasse, diz o advogado Roberto Delmanto Junior, 55. Ele é o criador do movimento SOS Panamby.

"É evidente que haverá desvalorização do terreno e o custo para a prefeitura será menor com a inclusão no quadro 7 [que relaciona os parques previstos] porque nenhum incorporador terá interesse em comprar a área destinada a ser parque", diz.

Ao justificar a não inclusão dos terrenos no quadro 7, a gestão Ricardo Nunes argumentou que, mesmo sendo de propriedade privada, a área já se encontra preservada do ponto de vista ambiental pelo plano municipal de áreas protegidas, verdes e espaços livres.

Delmanto reafirma, entretanto, que só a conversão em parque garante a preservação definitiva.

"Não é verdade que essas áreas estão protegidas, tanto que os empreendimentos aprovados pela prefeitura só não foram construídos porque há duas liminares da Justiça Federal impedindo", diz. "Caindo essas liminares, haverá desmatamento."


Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!