SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Nenhuma outra cidade paulista tem tantos casos de febre maculosa quanto Campinas, a 93 km de São Paulo. Só o município responde por 11% (115) dos pouco mais de mil registros no estado, de 2007 até este ano, ou seja, uma média de sete por ano.
E as notificações por cidade reunidas pela Secretaria de Estado da Saúde, as mais recentes, ainda nem compreendem o atual surto, registrado na sequência de dois eventos promovidos na Fazenda Santa Margarida. O espaço fica em Joaquim Egídio, distrito da zona leste campineira classificado como área de risco para a doença.
Até o momento, houve a confirmação de que a doença matou quatro participantes da Feijoada do Rosa, realizada em 27 de maio.
Mais dois casos são investigados: o de uma mulher de 40 anos, que está internada desde sábado (10), e o de uma mulher de 38 anos também hospitalizada no sábado (10) com suspeita de ter contraído a doença. Ela, porém, foi a um show do cantor Seu Jorge na fazenda uma semana depois da feijoada.
A enfermidade é um problema de longa data na cidade de mais de 1,2 milhão de habitantes, a terceira maior população do estado, só atrás da capital e de Guarulhos.
"Quem mora ou visita Campinas tem que estar informado que áreas verdes têm risco de febre maculosa", afirmou nesta quarta (14) Andrea von Zuben, diretora do Devisa (Departamento de Vigilância em Saúde).
No mesmo dia, a gestão municipal anunciou que, de agora em diante, toda área de risco deverá contar com cartazes, faixas ou placas que indiquem o risco de transmissão da doença.
As outras quatro cidades que historicamente reúnem mais casos de infecção ficam perto de Campinas. São elas Piracicaba (87), Valinhos (51), Santa Bárbara D'Oeste (47) e Americana (40), com uma média de 2 a 5 cinco casos anualmente.
Nos cinco municípios, a enfermidade resultou da bactéria Rickettsia rickettsii, transmitida pelo carrapato Amblyomma sculptum, conhecido como carrapato-estrela. É comum que capivaras sirvam de hospedeiro para essa espécie, que também se refugia em cavalos.
A febre maculosa desse tipo de bactéria é grave e pode levar rapidamente à morte.
Uma das explicações para a disseminação da doença no interior paulista é a transformação do uso e ocupação do solo, segundo o biólogo Stefan Vilges de Oliveira, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia.
"Matas nativas foram ao longo dos anos sendo modificadas com a expansão da agricultura, que acaba fornecendo alimentação para o principal hospedeiro dos carrapatos, as capivaras", explica ele, um dos organizadores do guia "Febre Maculosa: Aspectos Epidemiológicos, Clínicos e Ambientais".
Oliveira afirma ser complexo controlar a doença, uma vez que sua disseminação envolve animais silvestres. Uma das saídas, a seu ver, é avisar à população quais são as áreas de risco e alertar sobre a necessidade de procurar ajuda médica rapidamente em caso de sintomas.
REGIÃO METROPOLITANA E LITORAL
Santo André e São Bernardo do Campo, na região metropolitana de São Paulo, ocupam o sexto e o sétimo lugar da série histórica, com 33 e 32 casos respectivamente. Mas a primeira cidade teve seu último caso em 2018 e a segunda, em 2020.
A capital paulista, por sua vez, aparece na décima posição, com 27 casos acumulados desde 2007, sendo o último deles em 2021.
Em comum, essas três cidades observaram a transmissão da febre maculosa por outro carrapato: o Amblyomma aureolatum, que igualmente carrega a Rickettsia rickettsii. Seus hospedeiros podem ser cães e gatos com acesso a áreas de mata atlântica.
Episódios da doença no litoral paulista foram bem mais raros. Ubatuba, por exemplo, somou 12 casos desde 2007. Em Caraguatatuba, houve sete; São Sebastião teve cinco e Bertioga, apenas um.
Nesses municípios, a infecção foi associada à bactéria Rickettsia parkeri, cujo vetor é o carrapato Amblyomma ovale, e os sintomas são considerados menos severos em comparação aos provocados pela bactéria Rickettsia rickettsii.
LETALIDADE
De 2007 até este ano, a letalidade da febre maculosa nunca ficou abaixo de 34%, taxa observada tanto em 2007, quando houve 12 óbitos em 35 casos, quanto em 2008, ano com 16 mortes em 47 casos.
Esses dados abrangem casos registrados em São Paulo em que a infecção ocorreu não só no próprio estado mas também fora dele, o que são poucos.
A mais alta proporção foi observada em 2014: de 85 pacientes, 60 morreram devido à doença, o que corresponde a 71%.
Quatro anos depois, São Paulo teve seu maior número de casos. Foram 115, com 63 mortes (55%).
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