RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O Rio de Janeiro tem uma média de quatro presos torturados por dia, conforme aponta levantamento feito pela Defensoria Pública do estado. De janeiro de 2022 até 11 de maio deste ano, o órgão recebeu 1.506 relatos de agressões físicas e psicológicas contra pessoas presas e sob custódia.

O relatório anterior foi feito entre entre junho de 2019 e agosto de 2020, o que não permite a comparação dos dados. Na época, foram registrados 1.250 casos de maus-tratos e tortura. Ao todo, desde 2018, a Defensoria compilou 4.444 casos de tratamentos desumanos praticados contra pessoas presas.

Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (26), Dia Internacional em Apoio às Vítimas de Tortura. O levantamento foi feito com informações enviados ao Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública e de audiências de custódia.

Procurada, a Polícia Militar disse em nota que "não tolera possíveis cometimentos de abusos por parte dos seus entes, apurando com rigor fatos nesse sentido quando relatados". A corporação disse também que a corregedoria está à disposição para receber denúncias desses casos.

O levantamento indica que o perfil de presos agredidos são, em ampla maioria, homens negros --identificam-se como pretos e pardos--, jovens e de baixa escolaridade.

"Esse é um recorte racial que não corresponde nem de perto à população fluminense", diz o defensor público André Castro, coordenador do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos. "Esse é mais um elemento que denuncia que o racismo estrutural é um conceito muito presente na nossa sociedade."

Segundo dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), de 2022, a população do estado do Rio é formada por 44,6% de brancos, 37,5% de pardos e 16,9% de pretos.

Ao todo, 1.422 vítimas eram homens, o que equivale a 95,7% dos casos. O número de mulheres foi de 57 e pessoas trans, 6. Uma pessoa não quis identificar seu gênero na pesquisa.

Já em relação à faixa etária, 751 vítimas tinham entre 18 e 25 anos --isto é, 52,3% dos casos. A segunda maior incidência das agressão se deu contra pessoas de 26 a 40 anos: 541, ou 37,7%.

Dos presos com mais de 40 anos, esse percentual foi de 9,8% --135 vítimas. Duas vítimas das torturas tinham menos de 18 anos.

Pretos e pardos também são maioria entre as vítimas das agressões, somando 77,7% dos casos. Em comparação, 22,3% das vítimas são brancas. Segundo o relatório, nos casos em que consta a autodeclaração do preso, 651 se identificaram como pardo, 281 como preto e 268 como branco.

Em relação à escolaridade, 72,2% estudaram até o ensino fundamental. No entanto, ampla maioria não o concluiu. Isto é, dos 766 que chegaram a esse nível de educação básica, 603 não o completaram.

De acordo com o relatório, a maioria das agressões aconteceu nos locais do crime e onde foi feita a prisão. Quando se trata de ataques físicos, esse locais representam 47,1% e 38,4% dos casos, respectivamente. Já em relação às agressões psicológicas, 42% e 39%.

O levantamento constatou poucos casos de tortura e maus-tratos acontecendo dentro das prisões: quatro. No entanto, segundo Castro, esse número não representa o universo real da quantidade de agressões no sistema prisional.

"Os relatos de presídio são um número bastante menor, mas nós sabemos que há uma cifra oculta muito grande. Isso não é uma coisa do Rio de Janeiro ou do Brasil, é algo que acontece internacionalmente. Muitas vezes as denúncias são feitas, mas depois voltam atrás com medo de eventuais represálias", diz o defensor.

O relatório indicou que 82,4% dos casos registrados foram de agressões físicas. Outros 7,2% relataram ter sofrido tortura psicológica. Os demais presos afirmaram que foram submetidos a ambas as violações.

Entre as agressões físicas identificadas, as mais frequentes foram chutes (406 relatos), socos (423) e tapas na cara (223). Há também relatos de uso de saco plásticos para asfixiar o preso (42 casos) e coronhada (73), quando se usa a parte de trás da arma para bater numa pessoa.

A Defensoria também usa uma categoria como "outros" para incluir agressões diversas, que não se enquadrariam nas demais classificações. Entre essas agressões estão pisões, torções, enforcamento e até casos em que o preso teve o pé atropelado por viaturas.

O relatório aponta que, segundo os presos agredidos, a maioria dos agressores são policiais militares. Ao todo, 1.153 afirmaram que poderiam reconhecer quem cometeu a agressão --77,9% disseram que PMs eram os responsáveis, um total de 898 casos.

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