RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Os cinco anos que se passaram desde o início das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes colocaram "limites intransponíveis" para a resolução do caso. É o que aponta a Polícia Federal afirmou no relatório do novo inquérito do caso.
Marielle e Anderson foram mortos a tiros no dia 14 de março de 2018. Eles voltavam de um evento na Lapa, e o carro onde estavam foi alvejado enquanto passavam pelo Estácio, na região central do Rio. Um ano após a morte, os ex-policiais Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz foram presos.
Em fevereiro, o ministro da Justiça, Flávio Dino, determinou a abertura de novas investigações, desta vez encabeçadas pela Polícia Federal com o apoio do Ministério Público do Rio e da própria pasta federal. Até então, o inquérito era tocado pela Polícia Civil do estado e passou por uma sequência de trocas de comando --desde 2018, foram cinco delegados designados ao cargo.
No relatório do novo inquérito, a PF diz que os obstáculos enfrentados pelos agentes para esclarecer o assassinato não existiriam se os investigadores passados tivessem tomado as medidas corretas. Entre as dificuldades, a Polícia Federal cita a falta de registros telefônicos dos suspeitos do crime e de imagens do entorno de onde aconteceu o assassinato
"Tais amarras temporais impõem à equipe de investigação limites intransponíveis que seriam supridas caso fossem adotadas as providências necessárias em momento contemporâneo aos fatos", diz o documento.
A PF cita ainda os prazos já expirados para conseguir informações importantes, como registros de chamadas, históricos de navegação online e imagens de câmeras de segurança.
Uma dos principais dificuldades apontada pela corporação é que passou o prazo de cinco anos previsto em lei para para as concessionárias de telefonia manterem os registros de ligações.
Isso impediu que os agentes conseguissem novas informações através da quebra do sigilo telefônico de Lessa, Élcio e de outros outros dois suspeitos de participação na morte de Marielle: o ex-bombeiro Maxwell Simões Corrêa, conhecido como Suel, e o ex-policial Edmilson Oliveira da Silva, o Macalé. Este último, morto em 2021, foi apontado como quem teria chamado Lessa para assassinar a vereadora.
Suel foi preso na operação de segunda-feira (24) e transferido na tarde desta terça (25) para a Penitenciária Federal de Brasília, no Complexo da Papuda. É o mesmo presídio em que Élcio se encontra e firmou seu acordo de delação.
De acordo com a investigação, Ronnie, Suel e Macalé estavam empenhados na vigilância e monitoramento de Marielle desde os últimos meses de 2017. O relatório da PF diz que era "oportuna a análise dos históricos de chamadas que abarcassem tal período", mas que como já se passaram cinco anos do crime, o prazo para se ter esse registros expirou.
Em relação aos dois primeiros, o policial reformado e o ex-bombeiro, os agentes conseguiram seguir a investigação confrontando os registros de chamadas e os dados em nuvem dos dois com a delação de Élcio. Já em relação a Macalé, o trabalho da PF foi prejudicado.
"Impende esclarecer que em relação a Macalé, tal análise restou comprometida, uma vez que esta equipe de investigação não identificou seu histórico de chamadas no período em questão e, com o decurso do prazo de cinco anos, o resgate de tais dados restou impossibilitado", diz o relatório.
Outro obstáculo citado pela Polícia Civil é falta de imagens de segurança do entorno de onde aconteceu o assassinato. Tais gravações poderiam mostrar Ronnie e Élcio no local do crime, corroborando a denúncia dos investigadores.
A corporação cita, em seu relatório, que as imagens das câmeras de segurança do antigo Centro de Convenções Sulamérica, ao lado de onde Marielle e Anderson foram mortos, nem sequer foram solicitadas oficialmente pela Polícia Civil. A empresa informou que houve apenas uma visita informal e que as gravações não existem mais.
"O vigilante local recebeu um policial civil na época, o mesmo portava somente sua documentação funcional e veio em uma viatura caracterizada da civil. Não nos foi passada nenhuma documentação formal de pedido de gravação. O policial seguiu até a sala de monitoramento e pediu para fotografar com seu próprio celular um de nossos monitores", disse a empresa à Polícia Federal.
Segundo a delação de Élcio, ele e Ronnie passaram em frente ao centro de convenções logo após o crime.
ORIGEM DA ARMA DO CRIME
Na colaboração, Élcio afirmou que a arma usada por Ronnie para matar Marielle foi extraviada de um incêndio ocorrido no Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais), onde o policial reformado já tinha sido lotado. O delator, no entanto, não soube precisar quando foi incêndio.
A Polícia Federal, no entanto, afirmou que não foi possível comprovar a origem da arma segundo a versão de Élcio. À corporação, a Polícia Militar do Rio confirmou que houve um incêndio no batalhão em maio de 1984 em que houve a destruição de matéria bélico.
A PM, porém, disse desconhecer um possível extravio de submetralhadoras MP5 relacionado ao acidente e completou que, em setembro de 2016, houve um alagamento no Bope que causou a perda de documentos e diversos materiais da polícia. Por isso, a corporação não teria nenhuma informação em seu banco de dados de armas que foram extraviadas do batalhão especial.
A MP5 é a arma que teria sido usada por Ronnie na noite do crime. Esse modelo é utilizado somente pelas forças especiais por seu poder de precisão.
"[Ronnie] tinha um carinho por aquela arma, que ele usava sempre quando estava em operação no Batalhão de Operações Especiais. Ele reformou ela todinha, deixou ela cem por cento", disse Élcio na colaboração, explicando que o policial reformado teria comprado a arma anos após ela ter sido extraviada do Bope.
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