SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Policiais militares entraram em uma ala do Hospital Ipiranga, na zona sul de São Paulo, e algemaram e prenderam uma médica de 53 anos na noite de domingo (1°). A ação ocorreu após a profissional de saúde, que atua na unidade desde 2000, recusar-se a fornecer detalhes do quadro clínico de um policial reformado que tentou cometer suicídio.

Como justificativa para a prisão, um tenente da PM afirmou que a médica o feriu com uma caneta no antebraço e o desacatou.

A Polícia Militar declarou que apura a conduta dos agentes e, se for comprovado excesso, medidas serão adotadas.

A Secretaria de Estado da Saúde disse que o Hospital Ipiranga lamenta o ocorrido e que dará total apoio à profissional médica envolvida no caso. Conforme a legislação, o boletim médico só pode ser passado a familiares, responsáveis legais ou por determinação judicial, diz trecho da nota enviada para a reportagem.

Em depoimento, a médica afirmou que assumiu o plantão na UTI às 19h. Ela soube, então, da internação de um PM em estado gravíssimo e que policiais tinham ido diversas vezes no dia até a unidade em busca de informações de como ele estava.

Por volta das 20h30, uma enfermeira a procurou para dizer que os policiais haviam voltado.

A médica afirmou à Polícia Civil ter deixado a UTI e explicado aos PMs que o estado de saúde do paciente era grave e, em virtude da alta demanda e da gravidade dos demais pacientes, não passaria mais nenhum boletim durante seu plantão.

Os PMs teriam, então, pedido à médica que se identificasse. A mulher afirmou ter se identificado como doutora e passou seu primeiro nome, mas explicou que não passaria o número de registro no CRM (Conselho Regional de Medicina) e, caso os policiais necessitassem de mais informações, poderiam buscar a diretoria do hospital.

Ela voltou para a UTI. No entanto, cerca de uma hora depois, os policiais voltaram. Enquanto conversava com a enfermeira, um grupo de 4 a 5 PMs invadiu a ala de conforto médico.

Um tenente exigiu o nome completo e o documento da médica. Em depoimento, ela disse ter fornecido o primeiro nome e um sobrenome. A médica tentou contato com um superior para saber se realmente teria obrigação em passar os dados dela, mas ele não atendeu a ligação.

Os policias continuaram insistindo em obter os dados da médica. Segundo ela, os policiais agiram de forma grosseira e "vinham para cima".

A médica confirmou ter atirado seu CRM em direção ao abdômen do tenente. Na sequência, recebeu voz de prisão e foi algemada. Ela disse ter sido conduzida pelo hospital e colocada no guarda-preso do carro da Polícia Militar.

Ela declarou para policiais civis que não sabia que era obrigada a se identificar.

Em seu depoimento, o tenente confirmou a ida até o hospital para obter informações sobre o estado de saúde de um policial reformado que tentou se suicidar no sábado (30). De acordo com o oficial, desde a internação, uma equipe vai constantemente até a unidade para receber atualizações médicas.

Ainda segundo o tenente, os dois policiais encarregados de obter as informações no domingo disseram a ele que a médica não quis a se identificar.

O tenente afirmou ter ido ao local para tentar resolver a situação. Segundo o policial militar, ele ouviu a médica dizer: manda o tenente embora que eu não vou passar nenhuma informação para ele e nem me identificar.

Segundo o oficial, ele aproveitou que a porta estava aberta e entrou na sala. A médica então teria perguntado para o policial se ele era alfabetizado e se conseguiria ler o nome dela no jaleco.

O policial contou que a mulher apresentou o documento de modo jocoso. A médica então teria jogado o CRM em seu rosto. Em depoimento, a médica negou que tenha jogado o documento no rosto do tenente.

O policial relatou ter dado voz de prisão à médica, momento em que ela pegou uma caneta e o golpeou no antebraço. Foi nesse instante que a médica foi algemada.

Em nota, o Cremesp disse que os médicos devem prezar pelos seus deveres éticos, de sigilo e confidencialidade, conforme determina o artigo 75 do Código de Ética Médica. A entidade afirmou, ainda, que vai acolher a médica que usou de suas prerrogativas éticas na ocasião, não podendo ser coagida e quebrar o decoro da profissão.


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