RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Segundo investigação da Polícia Federal, mensagens encontradas no celular de um homem suspeito de integrar a maior milícia do Rio de Janeiro apontam que o grupo criminoso teria bancado a estrutura usada numa reunião entre a deputada estadual Lucinha (PSD), o prefeito Eduardo Paes (PSD) e motoristas de van da zona oeste da cidade.

O grupo criminoso teria fornecido lona, cadeiras e motoristas para participarem do encontro, em setembro de 2021. A investigação aponta que a deputada agiu para que uma regra do transporte alternativo que beneficiava a milícia fosse mantida pela prefeitura. Paes não é investigado.

O aparelho com as mensagens pertencia a Domício Barbosa de Sousa, suspeito de fazer parte da milícia comandada por Luiz Antônio Braga, o Zinho, que atua principalmente na zona oeste do Rio.

A deputada não foi localizada para comentar. O processo segue sob sigilo, motivo pelo qual não se sabe quem faz sua defesa. Em nota, a prefeitura afirmou apenas que "toda e qualquer decisão sobre o sistema STPL [transporte alternativo] é feita de forma uniforme em toda a cidade". "Não há qualquer interferência política nas decisões tomadas sobre o tema."

"Eventuais pleitos políticos são analisados e decididos sob a perspectiva técnica e de interesse da população. Desde o início dessa administração, o sistema voltou a ser fiscalizado", afirmou a prefeitura.

Lucinha foi afastada do cargo nesta segunda-feira (18) por decisão do desembargador Benedicto Abicair, do Órgão Especial, foro do TJ-RJ que analisa acusações contra deputados estaduais. Ela é suspeita de atuar em favor do chamado "bonde do Zinho".

O nome de Lucinha apareceu na investigação a partir da quebra de sigilo de Domício. Segundo a Procuradoria-Geral de Justiça, o miliciano encontrou Lucinha e uma assessora sua pelo menos 15 vezes ao longo de 2021.

De acordo com a PF, Lucinha organizou uma reunião do prefeito com motoristas de van em setembro de 2021 para tentar manter uma regra que permitia a entrada de veículos na zona norte na oeste, área de atuação da milícia. A cobrança de taxas sobre o setor é uma das principais fontes de renda desses grupos criminosos.

As mensagens sugerem que a deputada não tinha conhecimento da regra, e também não busca informações sobre ela. O objetivo, segundo ela, é atuar de acordo com os interesses de Domício.

"Então o senhor [Domício] coloca um desses aí [motoristas], pra poder explicar isso direitinho, porque eu não consegui entender. Se isso é bom pra vocês ou não é. Isso na 'hora H' eu

fiquei em dúvida. Entendeu, Dom? Já que eu não tenho tanto entendimento assim, se

isso é bom ou se é ruim", disse Lucinha em mensagem de áudio para o miliciano.

"P5 [a regra] estando aberta para a gente é bom, porque não falta carro nas nossas linhas. O pessoal... eles têm vontade de vim trabalhar pra cá, entendeu. Só que as linhas deles foi licitada lá pra baixo, ganharam lá pra baixo, mas pra lá não tem movimento. Vem muita gente de lá trabalhar aqui. Vem muita gente! A P5 ficando do jeito que tá, tá ótimo!", respondeu Domício.

Nas mensagens, Lucinha questiona Domício sobre se "as cadeiras e o paraquedas está [sic] resolvido". Para a PF, a pergunta se refere a lona e aos assentos usados na reunião.

A PF incluiu na representação fotos publicadas por Lucinha e Eduardo Paes nas redes sociais, mostrando o uso de cadeiras e lonas no encontro no Cesarão.

"As imagens a seguir acostadas convergem integralmente com a conversa entre 'madrinha' e Domício, isto é, confirmam data, local, horário, as pessoas envolvidas, o tema da reunião, bem como demonstram o 'paraquedas' (lona) e as cadeiras encomendadas pela deputada Lucinha a Domício", escreve a PF.

Segundo a PF, Lucinha também pede que Domício oriente os presentes a baterem palmas quando ela falar em defesa do transporte alternativo.

A polícia afirma também, com base nas mensagens, que a deputada organizou uma reunião no gabinete de Paes na prefeitura com motoristas indicados por Domício. O encontro também foi divulgado pela própria deputada em suas redes sociais.

Os dados mostram também, segundo o MP-RJ, que Domício teria pedido à deputada, por meio da assessora, a realização de uma operação policial contra uma facção rival.

Lucinha é suspeita também de ter atuado em favor de milicianos do "bonde do Zinho" presos pela polícia. Segundo o MP-RJ, em novembro de 2021, Domício solicitou à deputada atuação em favor de criminosos presos em flagrante com armas, fardamento e veículo roubado.

A Procuradoria afirma que a deputada fez ligações e informou Domício sobre o fato da ocorrência ter se encerrado sem preso. De acordo com o MP-RJ, ela disse ao miliciano que "fez sua parte" e que "agora quebraria o telefone", orientando que ele fizesse o mesmo.

O quinto episódio narrado se refere à suposta tentativa de interferir na nomeação do então comandante do 27º Batalhão da PM (Santa Cruz), tenente-coronel Eduardo Lopes.

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