SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O anúncio do Ministério da Saúde de que vai priorizar a população entre 6 e 16 anos na vacinação contra dengue foi bem recebido por especialistas. Enquanto não há doses suficientes para ampliar a imunização para adultos e tampouco aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para aplicação em idosos, a avaliação é que iniciar a estratégia por crianças e adolescentes está correta.

O público foi anunciado na segunda-feira (15), após uma reunião da CTAI (Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização), e segue a recomendação do grupo de assessoramento (Sage, em inglês) da OMS (Organização Mundial da Saúde).

Em encontro realizado em setembro de 2023, os integrantes do Sage aconselharam a introdução da vacina Qdenga, produzida pela Takeda, para o público de 6 a 16 anos. "Dentro dessa faixa etária, a vacina deve ser introduzida cerca de 1-2 anos antes do pico de incidência de hospitalizações relacionadas à dengue. A vacina deve ser administrada em um esquema de 2 doses com um intervalo de 3 meses entre as doses."

Renato Kfouri, presidente do Departamento de Imunizações da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria) e membro da CTAI, explica que a orientação do grupo internacional parte dos estudos com a vacina ?a eficácia clínica da Qdenga foi avaliada em uma pesquisa com 20.099 crianças e adolescentes entre 4 e 16 anos de idade no Brasil, Colômbia, República Dominicana, Nicarágua, Panamá, Sri Lanka, Tailândia e Filipinas.

No Brasil, não são os mais jovens que compõem a maior parcela de casos graves e mortes por dengue. Dados da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente mostram que, entre janeiro e setembro do ano passado, 6,4% das vítimas da doença tinham entre 60 e 69 anos. Dos 5 aos 9 e dos 10 aos 14, essa taxa foi de 0,9%. Ainda assim, como o imunizante não foi liberado pela Anvisa para aplicação em idosos, Kfouri avalia que o benefício de vacinar adultos não seria muito superior a vacinar crianças.

"Dependendo da região, as taxas de hospitalização são até maiores em crianças de 5 a 9, por exemplo, ou de 10 a 11 do que em adultos e idosos. A escolha pelas crianças e adolescentes é baseada nessa epidemiologia de hospitalizações, que aqui no Brasil se concentra muito na faixa pediátrica, e também nos estudos da vacina."

Outro aspecto diz respeito aos levantamentos realizados no país. Os estudos mostram que, em boa parte do Brasil, 50% dos moradores já tiveram contato com o vírus da dengue aos 10 anos de idade. Nesse sentido, englobar a faixa etária na vacinação é uma maneira de minimizar os riscos ante uma segunda infecção, na maioria das vezes mais grave do que a primeira.

"Se nós tivéssemos um estoque ilimitado de vacinas, com certeza a indicação seria de 4 a 60 anos, como está na bula", diz o infectologista Alexandre Naime Barbosa, professor na Unesp e coordenador científico da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia). "Mas estamos com um cobertor muito curto. Vamos ter que escolher uma porção da população de 6 a 16 anos e ainda regionalizar para situações mais epidêmicas."

A Takeda tem capacidade para entregar até novembro deste ano 5 milhões de doses. Como o esquema vacinal é composto de duas doses, essa quantidade é suficiente para vacinar 2,5 milhões de pessoas. Para se ter uma ideia, apenas a cidade de São Paulo tem 1,5 milhão de pessoas entre 6 e 16 anos de acordo com o Censo 2022.

Em seu parecer, o Sage recomendou que a vacina seja aplicada em locais com alta carga da doença e grande intensidade de transmissão, de forma a maximizar o impacto na saúde pública. No caso do Brasil, União, estados e municípios ainda vão se reunir para definir as áreas de distribuição do imunizante.

Para Kfouri, a definição de regiões é complexa porque, às vezes, um município que registra melhor os dados pode dar a impressão de ter um cenário pior do que outro que falha na contabilização de casos e hospitalizações. "Não é fácil estabelecer esses indicadores, mas vamos construir esses critérios junto com o Departamento de Arboviroses para que seja justa a introdução das vacinas aos poucos."

OPORTUNIDADE DE MELHORAR A PROTEÇÃO CONTRA HPV

Os especialistas destacam por fim outro impacto de iniciar a imunização por essa parcela da população: ampliar as taxas de vacinação contra HPV, grupo de vírus associado a vários tipos de câncer, como o de colo uterino, o de ânus, o de pênis e o de cabeça e pescoço.

A vacina contra o HPV está disponível no SUS para meninas e meninos de 9 a 14 anos, mas nos últimos anos houve queda na procura pelo imunizante e o país está longe da meta.

"A minha sugestão particular seria imunizar aqueles entre 9 e 14 anos, faixa em que já há vacina no calendário. Assim não seria necessária mais uma ida ao posto de saúde", afirma Kfouri.


Entre na comunidade de notícias clicando aqui no Portal Acessa.com e saiba de tudo que acontece na Cidade, Região, Brasil e Mundo!