RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Novo vídeo de reconstituição da morte de uma das vítimas do massacre no Jacarezinho, ocorrido em maio de 2021, contesta a versão apresentada por policiais civis. Omar Pereira da Silva, 21, foi morto durante a operação que deixou outros 27 mortos na zona norte do Rio de Janeiro, a mais letal da história do estado.

Dois policiais foram denunciados pelo Ministério Público por envolvimento no caso. Anderson Silveira Pereira é acusado de fraude processual, assim como Douglas de Lucena Peixoto Siqueira, que responde também por homicídio.

Embora os dois sejam réus no processo, eles continuam na ativa, lotados na Core (Coordenadoria de Recursos Especiais) da Polícia Civil.

A defesa dos policiais afirmou que não vai comentar o caso. A Polícia Civil também foi procurada, mas não se manifestou até a publicação deste texto.

Na versão dos agentes, Omar foi baleado em confronto e socorrido pelos policiais, mas não resistiu e morreu. No entanto, o novo vídeo apresentado pela Defensoria Pública, que é assistente de acusação no caso, contesta essa versão e corrobora a tese da Promotoria.

Segundo o Ministério Público, Omar estava desarmado e foi morto enquanto estava encurralado, já baleado no pé. A acusação diz também que Douglas, policial que atirou no jovem, e Anderson não prestaram socorro à vítima e retiraram o cadáver do local antes de a perícia chegar. A denúncia afirma ainda que os agentes implantaram uma granada e uma pistola no local do crime.

Das 28 mortes na operação, apenas 4 se tornaram inquéritos. O caso de Omar é um dos que está em fase mais avançada na Justiça, mas ainda não há data para julgamento dos policiais. De acordo com o Tribunal do Rio, não há previsão de quando será feita uma nova audiência de interrogatório dos réus, etapa que antecede o julgamento.

O novo vídeo faz a reconstituição em 3D das duas versões apresentadas no caso: a dos policiais e outra, baseada nas informações apontadas em perícias passadas, material visual coletado na cena do crime e depoimentos de testemunhas. Para isso, utiliza técnicas da arquitetura forense.

Os policiais afirmaram que entraram na casa e encontraram Omar dentro de um quarto de criança, onde ele havia se escondido. O jovem, segundo a versão dos agentes, estaria em pé segurando uma arma em riste e teria jogado uma granada contra eles.

O novo parecer, porém, aponta que Omar não poderia estar em pé na hora em que foi baleado, pois, se estivesse, haveria uma marca do tiro que atravessou seu corpo na parede oposta à porta -o que não havia. O laudo afirma que o jovem estava provavelmente sentado, devido às marcas e à poça de sangue no quarto, conforme mostram fotos e vídeos da cena do crime.

Omar também tinha um ferimento grave no pé. Esse machucado, que lhe arrancou um dedo, o impossibilitaria de estar de pé.

Quanto à granada e à pistola que estariam com Omar, todas as testemunhas que estavam na casa disseram que o jovem não estava armado e vestia apenas uma bermuda, o que impediria de esconder qualquer coisa nas roupas. Os únicos depoimentos que dizem o oposto são os dos dois policiais.

O parecer também aponta que não haveria espaço para que Omar lançasse uma granada, porque a casa em que estava era pequena e não seria possível atirar o artefato sem que ele também se vitimasse.

Por fim, o novo laudo pericial mostra que as fotos do corpo de Omar sendo levado pelos policiais já do lado de fora da casa indicam que o jovem não foi socorrido assim que foi baleado -o tiro que o acertou foi disparado entre as 8h e as 9h da manhã, e o corpo foi retirado do local à tarde.

"O corpo de Omar ficou entre duas e três horas em área próxima ao apartamento ou dentro do mesmo, como constatado pela análise de sombras [nas fotografias do caso], o que contradiz a versão dos policiais sobre a prestação de socorro imediata e posterior justificativa para a alteração da cena do crime", diz o relatório.

O vídeo e o novo laudo foram produzidos por peritos independentes que fazem parte do Projeto Mirante, parceria entre a Defensoria Pública do Rio e o Ministério da Justiça. O objetivo da iniciativa é revisar a perícia de casos emblemáticos do Rio de Janeiro e de São Paulo.

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