SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - As escolas da rede estadual de São Paulo iniciaram o ano letivo nesta quinta-feira (15) com milhares de professores sem aulas atribuídas. Em algumas unidades, já no primeiro dia, os estudantes ficaram sem aula por falta de docentes.
O problema ocorreu após a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) mudar as regras de definição das aulas para os professores temporários (chamados de categoria O), que são quase metade do total de 216 mil docentes que atuam na rede paulista.
Depois de dez anos sem contratar efetivos, a Secretaria Estadual de Educação fez um concurso com a previsão de convocar 15 mil docentes. A contratação deles, no entanto, só está prevista para 2025. Para este ano letivo, a secretaria definiu que os aprovados teriam apenas prioridade na atribuição de aulas.
Com a nova regra, aqueles que foram aprovados com maior nota no concurso receberam prioridade para escolher as aulas que queriam assumir em 2024. Em anos anteriores, isso era reservado aos professores com maior tempo de atuação na rede, ou seja, os que têm mais experiência em sala de aula.
Como alguns dos aprovados com maior pontuação podem ter cargo em outras redes de ensino ou escola, muitos não quiseram assumir as aulas como professores temporários. Assim, diversas aulas ficaram sem ser destinadas a um profissional.
Em nota, a pasta informou que alterou no início de janeiro as regras em razão do concurso, mas não explicou o motivo da mudança. A secretaria afirmou que a atribuição das aulas que continuam sem docente mesmo após o início do ano letivo será feita ainda nesta semana.
Questionada, a secretaria não respondeu qual o percentual de aulas que está sem professor.
"Devido à designação de docentes para outros cargos e à desistência de outros professores, a atribuição dessas aulas será feita esta semana", disse em nota.
O governo Tarcísio também afirmou que "nenhum aluno será prejudicado". "Na ausência de professor em qualquer unidade e em qualquer período, todos os docentes que estejam designados como vice-diretores, professores-coordenadores, bem como os profissionais que trabalham nos projetos da secretaria, podem atuar como professores substitutos", disse.
Já neste primeiro dia do ano letivo, em algumas escolas, professores tiveram que dar aula para mais de uma turma ao mesmo tempo. Houve casos em que os estudantes ficaram com o horário vago por falta de profissionais.
Foi o que aconteceu na escola estadual Jardim Jacira, em Itapecerica da Serra, que na manhã desta quinta tinha sete professores a menos do que o necessário no quadro.
"É um cenário de precariedade total, mal começou o ano e os professores já têm que se desdobrar em mil para compensar a falta de funcionários", diz Mariana Lopes, 39, que é mãe de uma aluna do 6º ano da unidade.
Além de ver a escola da filha sem funcionários em número suficiente, Mariana também é professora e ficou sem aulas neste ano, mesmo tendo sido aprovada no concurso. "Fiquei tão contente quando fui aprovada, porque, como temporários, nós não temos nenhum direito assegurado. Mas a alegria durou pouco, porque não adianta ser aprovada e não ter trabalho."
Professora de educação física, ela não recebeu durante o mês de janeiro por não ter aulas atribuídas e depois do governo estadual rescindir o contrato dos temporários. "Estou há um mês sem salário e não sei quando vou receber."
Marisa Santos, 35, também ficou com receio quando o filho chegou em casa nesta quinta após o primeiro dia de aula. No 1º ano do ensino médio de uma escola estadual de Campinas, o menino contou que passou dois horários no pátio por falta de professor.
"Todo ano é a mesma coisa, nunca tem professor em número suficiente. O menino vai pra escola e na melhor das hipóteses assiste a duas ou três aulas por dia. É tudo muito precário", disse a mãe.
A falta de contratação de efetivos há mais de uma década no estado provoca todos os anos um déficit de profissionais disponíveis para atuar nas escolas. Apesar de a secretaria ter recorrido à contratação de temporários, esse tipo de contrato deixa os docentes sem vínculo com as unidades.
Pela primeira vez, desde que começou a atuar como professor temporário na rede paulista, Manoel Fernandes Silva está sem aulas. Ele atua há 13 anos nas escolas estaduais como docente de sociologia e filosofia. Nos últimos anos, teve que atuar em até quatro unidades diferentes para conseguir um número suficiente de aulas.
"Fui aprovado no concurso e achei que finalmente iria acabar com essa vida precária de ter que ficar correndo por mil escolas. Mas fui aprovado, tenho muitos anos de magistério e até agora não fui chamado", diz.
"Os critérios de prioridade não são claros e não há nenhuma transparência", afirma o docente, que também não teve salário em fevereiro e diz ter medo de ficar um mês sem receber.
Desde que os novos critérios de atribuição foram publicados, professores criticaram a medida, já que questionam os resultados do processo seletivo. A Apeoesp, principal sindicato da categoria, chegou a entrar com uma ação e conseguiu uma liminar que suspendeu por alguns dias a atribuição com essa nova regra.
O sindicato alega que vários candidatos tiveram a nota zerada na etapa prática, uma videoaula, por um erro da organização do concurso. A liminar foi revogada após a Vunesp, responsável pelo processo seletivo, apresentar explicação.
Agora, o sindicato apresentou uma representação ao Ministério Público, pedindo que o caso seja investigado.
Em nota, além de informar que continuará com o processo de atribuição nesta sexta (16), a secretaria estadul disse ainda que "trabalha continuamente com o reconhecimento e a valorização da atividade docente".
Apesar do contrato ter sido realizado no ano passado, na gestão do secretário Renato Feder, o processo seletivo foi autorizado no início de 2022, ainda na gestão do ex-governador João Doria.
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