RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), 43, candidato à reeleição, não compartilha da opinião de Jair Bolsonaro (PL) sobre a ameaça que representaria uma eventual vitória de Lula (PT) à Presidência.
"Nessa época de campanha os nervos estão aflorados. No final das contas, Bolsonaro não fez aquilo que as pessoas falam, e o Lula não vai fazer aquilo que falam. É uma guerra política", disse ele à Folha de S.Paulo.
Líder nas pesquisas, Castro se declara um aliado fiel do presidente. Contudo, avalia não ter dificuldade em dialogar com o petista. "Não tenho problema nenhum com isso. Convivi muito bem com o presidente [da Assembleia Legislativa] André Ceciliano, que é do PT. Já demonstrei o quanto sou um político do diálogo. Ficarei mais feliz se o presidente Bolsonaro ganhar, mas exercerei o diálogo também se ele não ganhar."
Há dois anos no cargo, Castro defende as ações da polícia, responsável por 31% das mortes violentas do estado até agosto. "Hoje foram apreendidas uma arma para abater helicóptero e uma metralhadora que faz blindado virar margarina. Quem tem um poder bélico desse não está brincando com a polícia."
PERGUNTA - O presidente Bolsonaro até agora apareceu pouco na sua campanha. Qual o seu nível de fidelidade a ele?
CLÁUDIO CASTRO - Sou 100% fiel a ele. Em todos os meus discursos peço voto para ele. Sempre digo: "Eu tenho lado". E o meu lado é Bolsonaro. O que eu sempre disse -e é a minha crítica a adversários- é que sou o único que estou no mandato. Eu tenho que mostrar. Não nacionalizei a eleição em momento algum.
O apoio dele a mim é fundamental. Até porque a franja que ele tem no Rio de Janeiro é enorme. O eleitor dele já entendeu que eu estou divulgando o trabalho que eu fiz. Tenho que defender o meu legado. Estou há 24 meses à frente do estado. É uma questão de ser apoiado, não de ele ser minha bengala.
P. - O sr. acha que ele tem responsabilidade por esse clima bélico que o país vive hoje na eleição? Sabe aquela frase: "Quando um quer, dois não brigam"?
CC - Os dois lados foram bélicos o tempo todo. Não me lembro de um outro presidente em que a oposição fez uma coisa tão raivosa e tão "fora, fora, fora, fora, fora" o tempo todo. Quando você é agredido o tempo todo, acaba reagindo.
Bolsonaro usa muito a retórica religiosa nessa campanha, falando em bem contra o mal. [A primeira-dama] Michelle até falou que, antes, o Planalto era ocupado por demônios. O sr. concorda com o uso desses termos? É uma guerra em que os dois lados usam suas armas. Ao mesmo tempo, o outro lado o chama de genocida e fascista. É uma guerra de retórica dos dois lados.
P. - O que representaria uma volta de Lula à Presidência?
CC - Não é o meu lado, né? Hoje sou do lado do presidente Bolsonaro. Estar aqui teve a ver com a onda bolsonarista. Seria até uma falta de caráter não estar do lado dele. Para mim, [uma vitória de Lula] representaria uma pessoa do outro lado, mas eu também não tenho problema nenhum com isso. Convivi muito bem com o presidente [da Assembleia Legislativa] André Ceciliano, que é do PT. Já demonstrei o quanto eu sou um político do diálogo. Ficarei mais feliz se o presidente Bolsonaro ganhar, mas exercerei o diálogo também se ele não ganhar.
P. - O sr. acha que, com Lula, o país põe em risco a liberdade religiosa e de expressão, como o presidente diz?
CC - Tem que ver o que vai acontecer. Nessa época de campanha os nervos estão muito aflorados. No final das contas, Bolsonaro não fez aquilo que as pessoas falam, e Lula não vai fazer aquilo que falam. É uma guerra política, de campanha. Estou com Bolsonaro, é o melhor para o país. Mas se o outro lado governar, temos que aceitar a decisão do povo. Espero que o povo reconheça o bom trabalho do Bolsonaro.
P. - Bolsonaro tem usado muito a questão da corrupção e as delações contra o ex-presidente na campanha. O que o sr. acha desse tipo de estratégia?
CC - É igualzinho ao que o [Marcelo] Freixo usa aqui contra mim. O Freixo hoje falou o quê? "O presidente Lula está livre e apto a ser candidato." Eu sou livre e apto a ser candidato. As delações e as prisões dos ministros do Lula não têm a ver com ele. Mas ele [Freixo] fala que a de ex-secretários tiveram a ver comigo. É mais uma vez a grande guerra política.
P. - O sr. foi alvo de delações. É um instrumento político adequado para ser usado por Bolsonaro contra o ex-presidente?
CC - As situações são bem diferentes. Aqui são duas delações em que estou processando os delatores, que não têm nenhuma prova. Não sou réu em nada, nunca fui denunciado em nada. Lá tem denúncia. Sabemos os excessos que tiveram no Ministério Público, no Judiciário. Essa é uma página que o país está virando. Tiveram coisas muito importantes na Lava Jato. Mas também tiveram excessos.
P. - Lula foi vítima desse excesso?
CC - Eu não sei. Não estou nos processos para saber.
P. - O senhor tem apoio da família do Sérgio Cabral, do Anthony Garotinho, do Eduardo Cunha. É possível fazer diferente com o mesmo grupo político no poder?
CC - [O candidato ao Governo do RJ pelo PDT] Rodrigo Neves foi secretário do Cabral. O partido do Freixo [PSB] era titular da Secretaria de Ciência e Tecnologia. O líder dele na Assembleia [Carlos Minc] era secretário de Meio Ambiente do Cabral. E o partido que o apoia [PT] foi quem deu a base para o Cabral governar. Isso é política. Se as pessoas acham que sou o melhor para o Rio hoje, que bom! Não tenho nenhum compromisso com ninguém. Todos que achem que sou o melhor para o Rio hoje, agradeço e quero apoio.
P. - O sr. já reconheceu erros no caso do Ceperj [Centro Estadual de Estatística, Pesquisa e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro] e explicou que o objetivo era fugir de acordos com organizações sociais. Foi uma decisão do sr. usar o Ceperj para realizar os projetos sociais?
CC - Nenhuma decisão é só do governador. Há uma equipe do governo que acha as melhores soluções. Não queria usar OSs e também queria fazer os programas sociais. Aquela foi uma solução muito boa até que pessoas errassem e manchassem um projeto que era maravilhoso. O responsável no fim das contas sempre serei eu.
P. - O sr. perdeu o controle?
CC - Não acho. Tenho 460 mil servidores ativos e inativos de pensionista, mais terceirizados. Um governador achar que vai controlar tudo é impossível.
P. - O seu chefe de Polícia Civil foi preso acusado de envolvimento com o jogo do bicho. Até que ponto o governo do sr. e as ações dele na secretaria ficam comprometidos?
CC - Zero ponto. A Polícia Civil é uma instituição bicentenária. Não tem governador, secretário, subsecretário que faça a polícia não fazer o que é correto. O papel do secretário é organizar, e isso ele fez com maestria. Tem que esperar as investigações.
P. - O sr. acredita na inocência dele?
CC - Não tenho que acreditar ou não porque não estou no processo. Eu tenho como testemunhar o trabalho da Polícia Civil enquanto o Allan [Turnowski] foi secretário.
P. - Um estudo apontou que as milícias já crescem desde 2018. A que se deve esse resultado?
CC - Respeito a academia demais. Mas um estudo [divulgado] dentro do período eleitoral, falando de 16 anos e que, quando você vai olhar na rede social, mais da metade [dos autores] apoia um outro candidato?
P. - Mas não é a realidade?
CC - Não é o que a Polícia Civil fala. A inteligência da Polícia Civil inclusive me relata que em 18 comunidades que eram tomadas pela milícia, hoje a polícia já tem que enfrentar o tráfico. Dado ao trabalho que a gente fez contra as milícias, o tráfico hoje volta a tentar entrar nessas comunidades.
P. - Mais de 30% das mortes violentas no estado hoje são provocadas pela polícia. Não é um indicativo de uso desproporcional da força?
CC - Hoje foram apreendidas uma arma para abater helicóptero e uma metralhadora que faz blindado virar margarina. Coisa de grandes arsenais. Quem tem um poder bélico desse não está brincando. A força do arsenal que os traficantes têm é uma coisa nunca vista. A polícia está repelindo.
P. - Bolsonaro flexibilizou muito a posse de armas. Isso prejudicou a segurança pública no Rio de Janeiro?
CC - Não. Quem vende arma para bandido é bandido, não é cidadão.
P. - Mas o fato de ter mais armas circulando não facilita o acesso do bandido a arma?
CC - Não. A pessoa tem todo um critério para comprar. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. As armas que continuam entrando são de tráfico internacional.
Apurações mostram CACs [Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador] usados por facções. São criminosos usando uma liberação. O que tem que haver é fiscalização rígida sobre quem compra arma.
Raio-X
Cláudio Castro, 43 Nascido em Santos (SP), foi vereador (2017-2018) e vice-governador do Rio de Janeiro até agosto de 2020, quando assumiu o Palácio Guanabara após o afastamento de Wilson Witzel. Tornou-se governador em definitivo em 1º de maio de 2021, após o impeachment do antecessor. Membro da Renovação Carismática da Igreja Católica, construiu carreira como cantor gospel. É formado em Direito pela UniverCidade.
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Cláudio Castro
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