SALVADOR, BA, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os deputados federais que concorrem à reeleição terão, em média, sete vezes mais recursos do fundo especial para financiamento de campanhas do que os demais candidatos à Câmara dos Deputados.

Ao todo, 464 deputados em reeleição receberam R$ 794 milhões do fundo eleitoral, repasses que chegam a uma média de R$ 1,7 milhão para cada deputado. Os dados incluem os recursos divulgados em prestações de contas até esta quarta-feira (21).

Os demais 7.044 candidatos à Câmara que foram contemplados pelo fundão levaram, juntos, R$ 1,6 bilhão do fundo eleitoral, o que dá uma média de R$ 227,1 mil para cada um.

A maior parte dos recursos --cerca de R$ 1,4 bilhão-- serão destinados a políticos que já disputaram cargos eleitorais, mas não têm mandato na Casa atualmente. Outros 233 milhões vão para nomes que fazem a sua estreia nas urnas.

Em geral, os partidos estão com dinheiro para gastar na eleição deste ano -são R$ 4,9 bilhões de fundo eleitoral contra R$ 1,7 bilhão na eleição passada, valor que, corrigido pela inflação do período, seria equivalente a R$ 2,9 bilhões.

Ao mesmo tempo, o limite máximo de gastos por candidatura foi atualizado apenas pela inflação. O resultado é que sobraram recursos para investir em mais candidaturas do que há quatro anos.

A campeã em repasses do fundo eleitoral entre os candidatos à Câmara nesta eleição é a deputada federal e candidata à reeleição Joice Hasselmann (PSDB-SP), com R$ 3,2 milhões.

Eleita em 2018 pelo PSL com mais de 1 milhão de votos em meio à onda bolsonarista, a deputada se tornou opositora do presidente Jair Bolsonaro (PL), se aliou ao então governador paulista João Doria (PSDB) e agora tenta renovar o mandato.

Ao todo, 26 candidatos a deputado federal receberam R$ 3 milhões ou mais do fundo eleitoral para financiar suas campanhas.

Dentre os deputados mais bem aquinhoados estão outros bolsonaristas arrependidos, caso do deputado federal Julian Lemos (União Brasil). Há quatro anos, ele foi coordenador da campanha de Bolsonaro no Nordeste e se elegeu deputado pela Paraíba com R$ 320 mil de fundo eleitoral.

Neste ano, quando vai às urnas dissociado de Bolsonaro, de quem se afastou, tem R$ 3 milhões à disposição para campanha, dos quais já gastou R$ 2,8 milhões.

Também estão entre os campeões de repasses candidatos que, por causa do fim das coligações nas disputas proporcionais, terão campanhas mais duras e precisarão de mais votos para atingir o quociente eleitoral. É o caso deputada federal e ex-prefeita de Salvador Lídice da Mata (PSB), aposta do partido para garantir ao menos uma vaga na Câmara pela Bahia, com R$ 3 milhões.

Outro ponto de destaque é a representatividade de mulheres entre os candidatos a deputado federal que mais receberam recursos. Dos 50 que tiveram mais repasses, 20 (40%) são mulheres.

A aposta em candidaturas femininas é resultado do incentivo dado pela nova legislação eleitoral. Os recursos do fundo eleitoral devem ser destinados pelos partidos de maneira proporcional à quantidade de mulheres candidatas, que devem ser no mínimo 30%.

Os votos dados para mulheres na eleição para a Câmara neste ano também contarão em dobro no cálculo da distribuição de recursos do fundo eleitoral entre os partidos. O mesmo vale para candidatos negros.

O Solidariedade foi um dos partidos que optou por apostar alto em candidaturas femininas. Dos cinco candidatos a deputado que mais receberam recursos do partido, quatro são mulheres: Maria Arraes e Fabíola Maciel (PE), Fernanda Gomes (PI) e Loreny Mayara (SP).

"Como a gente tem que investir os 30%, escolhemos investir nas mulheres que tinham mais possibilidade de se eleger", explica o presidente nacional do partido, Paulinho da Força. Dos atuais nove deputados do partido, oito são homens e a única mulher é Marília Arraes, que disputa o governo de Pernambuco.

Também estão entre as prioridades das legendas candidatos que já disputaram mandatos e agora tentam chegar ou retornar à Câmara dos Deputados.

Dentre eles estão dois ex-candidatos à Presidência: o senador José Serra (PSDB), que disputa uma vaga de deputado federal por São Paulo, e a ex-senadora Heloísa Helena (Rede), que trocou Alagoas pelo Rio de Janeiro e concorre a uma vaga na Câmara. Cada um recebeu R$ 3,2 milhões.

Deputados que decidiram não concorrer a um novo mandato optaram por deixar o espólio de recursos do fundo eleitoral para parentes. Na Bahia, são dois exemplos: Neto Carletto (PP), sobrinho do deputado federal Roberto Carletto, e Gabriel Nunes (PSD), filho do deputado licenciado José Nunes (PSD).

Prefeitos, vereadores e deputados estaduais bem votados também são apostas para Câmara neste ano e receberam recursos no mesmo patamar de candidatos em reeleição. O PSDB, por exemplo, destinou R$ 3,1 milhões para Paulo Alexandre Barbosa, prefeito de Santos de 2013 a 2020.

Já o PDT apostou as fichas em nomes como Duda Salabert (MG), vereadora mais votada em Belo Horizonte em 2020, e Léo Prates (BA), deputado estadual e ex-secretário de Saúde em Salvador. Ela recebeu cerca de R$ 1,2 milhão e ele, R$ 1 milhão.

Dentre os candidatos à Câmara que disputam uma eleição pela primeira vez, os que mais receberam recursos são parentes de políticos.

A campeã em repasses nesse grupo é a candidata Maria Arraes (Solidariedade-PE), que recebeu R$ 3,2 milhões do fundo eleitoral. Advogada, ela faz campanha ancorada na irmã, a candidata a governadora Marília Arraes (Solidariedade).

O segundo na lista é Fred Machado (PSDB), irmão do prefeito de Jundiaí (SP), o também tucano Luiz Fernando Machado (PSDB), com quase R$ 3 milhões.

Na sequência, aparecem Dayany do Capitão (União Brasil), mulher do candidato a governador do Ceará Capitão Wagner, e Marisete Bastos (União Brasil), candidata a deputada pela Bahia e mulher de Zito Barbosa, prefeito de Barreiras (875 km de Salvador). Elas levaram R$ 2,9 milhões e R$ 2,8 milhões, respectivamente.

Professor da Fundação Dom Cabral, o analista político Bruno Carazza destaca que os partidos historicamente tendem a prestigiar com mais recursos os candidatos à reeleição ou ligados às cúpulas partidárias.

Mas lembra que a aplicação do fundo eleitoral não possui regras bem definidas e dá poder para os dirigentes partidários distribuírem os recursos de forma discricionária, criando um desnível de competição entre os candidatos.

"Nada contra os partidos privilegiarem seus quadros tradicionais e com maior viabilidade eleitoral, faz parte do jogo. O que não pode é fazer isso em uma proporção exagerada, criando um encastelamento, uma oligarquização", afirma Carazza, que é autor do livro "Dinheiro, Eleições e Poder".

Ele ainda defende que sejam definidos critérios mais específicos para distribuição do fundo eleitoral, com incentivo a mais democracia interna nos partidos.


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