RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), herdou do ex-vice de sua chapa, Washington Reis (MDB), um apoio de peso em algumas favelas de Duque de Caxias: a vereadora Fernanda Costa (MDB), filha do traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar.

Ré em uma ação penal sob acusação de ser o "braço político" do pai, a dentista participa pela primeira vez de uma campanha política com mandato.

O principal foco da atuação política da Doutora Fernanda, como a cirurgiã dentista é chamada, é ajudar na reeleição de Gutemberg e Rosenverg Reis, irmãos de Washington, a deputado federal e estadual pelo MDB, respectivamente.

Contudo, a vereadora tem se empenhado também na vitória de Castro e do senador Romário (PL). Ela ainda não se posicionou em suas redes sociais sobre a eleição presidencial.

Em agosto, participou de duas caminhadas com o governador num calçadão da cidade, na Baixada Fluminense.

No dia 14, também promoveu uma reunião em favor dos deputados e do governador, mesmo após Washington Reis deixar a vice na chapa em razão da Lei da Ficha Limpa. O encontro ocorreu na favela Parque das Missões, uma de suas bases eleitorais.

A campanha do governador disse, em nota, que sua coligação "é composta por 14 partidos e conta com o apoio de muitos parlamentares, que são livres para expressar as suas preferências políticas".

Fernanda não retornou aos contatos da reportagem ao seu gabinete na Câmara Municipal.

"Não cabe a esta coligação censurar qualquer tipo de manifestação política", diz a nota da campanha.

Gutemberg, presidente do MDB de Duque de Caxias, disse em janeiro de 2021 que ela se filiou à sigla "por sua atuação política e liderança". Procurado no dia 16, ele acrescentou: "Doutora Fernanda Costa é dentista, vereadora eleita pelo povo, mãe de três filhos, casada, moradora de Duque de Caxias e, como todos nós, inclusive você, não escolheu o pai".

Fernanda recebeu 3.999 votos na eleição de 2020 e ficou na primeira suplência do MDB para a Câmara de Duque de Caxias. Contudo, assumiu a cadeira já no primeiro dia da legislatura após Washington Reis, à época prefeito da cidade, nomear um vereador da sigla como secretário.

Ela conseguiu a vaga definitiva em outubro de 2021 após o vereador Danilo Francisco da Silva, o Danilo do Mercado (MDB), 53, ser assassinado em circunstâncias ainda não esclarecidas pela polícia -ele era suspeito de integrar um grupo de extermínio na cidade.

Pai da vereadora, Fernandinho Beira-Mar é apontado como uma das maiores lideranças do Comando Vermelho, tendo construído uma rede internacional de tráfico de drogas e armas. Já foi condenado a mais de 300 anos de cadeia.

Fernanda é ré desde 2017 numa ação penal na Justiça Federal de Rondônia sob acusação de integrar a organização criminosa liderada pelo pai. Ainda não houve sentença.

O processo é resultado da Operação Epístola, uma investigação da Polícia Federal baseada em bilhetes e gravações de Fernandinho Beira-Mar supostamente enviando, de dentro do presídio federal de Porto Velho (RO), recados a membros da quadrilha para manter ativa a comercialização internacional de drogas, bem como a lavagem de dinheiro do grupo

De acordo com a Procuradoria, a aliada de Castro era identificada pelo codinome Vasconcelos nos bilhetes enviados por Beira-Mar. Ela recebia, segundo as investigações, uma mesada de R$ 10 mil da quadrilha.

Fernanda é descrita pelo MPF-RO (Ministério Público Federal de Rondônia) como responsável pelo "papel social e político da organização [criminosa], em razão dos serviços que presta em comunidades de Duque de Caxias".

As principais acusações contra a vereadora se referem ao fato de ela usar o dinheiro proveniente do tráfico de drogas para atividades assistenciais nas favelas da cidade. Para o MPF-RO, a prática configura lavagem de dinheiro -crime pelo qual, contudo, ela não é acusada.

"Luiz Fernando [Beira-Mar] comandava vasta gama de negócios ilícitos, notadamente o tráfico de drogas, além de empreendimentos comerciais que, a despeito de buscarem, em alguma medida, benefícios sociais, eram financiados com recursos obtidos ilicitamente", afirma a Procuradoria.

"O próprio réu admite ainda que buscava realizar um trabalho social nas comunidades que estavam sob sua influência. Contudo, em seu entendimento -e isso ficou claro no interrogatório-, uma vez desenvolvida determinada atividade de forma 'lícita', não importava a origem do investimento inicial, o que, à evidência, somente reforça a conclusão de que houve de fato o crime de lavagem de dinheiro perpetrado por membros da organização", escreveu o MPF-RO nas alegações finais do processo.

Entre as acusações contra Fernanda está sua participação na criação da Associação de Moradores do Parque das Missões, bem como de clínicas populares de saúde, das quais parte do lucro era distribuído para membros da família.

Foi na região que ela obteve quase metade dos seus votos, segundo dados do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

A vereadora é acusada ainda de enviar recados ao pai para solicitar aportes financeiros num bar usado, segundo as investigações, para lavagem de dinheiro. Ela também liberava dinheiro para um outro acusado após visitas ao pai no presídio, de acordo com o MPF-RO.

Também reforça o pedido de condenação da integrante do MDB-RJ o fato de residir num imóvel "adquirido com proveitos dos crimes praticados pelo seu pai".

Cirurgiã dentista formada em 2009 pela Unigranrio, a vereadora estreou na política em 2016, quando tentou pela primeira vez uma vaga na Câmara caxiense. Filiada ao PP, teve 3.098 votos e não foi eleita.

Na ocasião, sua candidatura já era motivo de preocupação do então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann.

"Sem fazer pré julgamento dela, mas para mim simboliza tudo que venho denunciando: o Rio de Janeiro hoje convive com um estado paralelo que captura as instituições seja Legislativo, Executivo e mesmo Judiciário. Isso é um câncer", completou.

Fernanda não é a primeira parente de Beira-Mar a frequentar a Câmara Municipal da cidade da Baixada Fluminense. A Operação Epístola identificou que o traficante tinha uma filha, sogra e irmã empregadas em gabinetes no Legislativo da cidade.

"De dentro do presídio, sabia, até mesmo, a remuneração de cada cargo e determinava para quem deveria ser destinado", afirma a denúncia do MPF-RO.


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