SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Justiça Eleitoral ainda não tem uma explicação conclusiva para as longas filas observadas por todo o país no primeiro turno das eleições. No último domingo (2), eleitores em diferentes estados reclamaram da espera que durava horas e chegou a atrasar o início da apuração dos votos em algumas localidades.

Uma das hipóteses é que a ampliação do uso da identificação biométrica tenha contribuído para a demora, segundo representantes de Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Em 2018, longas filas também foram registradas pelo país e, à época, também houve menção à biometria como uma das causas.

CONVÊNIOS DE AMPLIAÇÃO DA BIOMETRIA

Além do aumento do número de eleitores que tiveram a biometria coletada pela Justiça Eleitoral, uma parcela que não tinha cadastrado sua digital nos TREs neste ano também se identificou por meio dela.

Isso foi possível devido a um convênio do TSE com outros órgãos públicos -como o Denatran, o Departamento Nacional de Trânsito- para que o tribunal pudesse utilizar as bases de dados dessas entidades, desde que respeitadas as regras legais sobre compartilhamento de dados pessoais.

Ao todo, as digitais de 9,8 milhões de pessoas foram incluídas nas urnas junto às que já haviam sido recolhidas pelo TSE. Não houve, portanto, coleta de biometria no domingo, apenas validação.

Como a iniciativa não era de amplo conhecimento, a mudança gerou ruído. Para o eleitor, não muda quase nada: o procedimento para quem coletou a biometria na Justiça Eleitoral é igual aos daqueles que tiveram os dados importados de outros órgãos: bastava colocar o dedo na máquina para fazer a leitura.

Já os demais votantes, que não possuem biometria documentada nas bases usadas, foram identificados com os documentos válidos para votação e tiveram que assinar os registros com os mesários.

Segundo a Justiça Eleitoral, o Bioex, projeto de importação de dados de outros órgãos, acelera o cadastro biométrico de eleitores e diminui despesas. Ele dispensa a necessidade de o votante comparecer ao cartório para a coleta -quem teve a digital validada já nesse pleito não precisará passar pelo processo.

A meta do TSE é cadastrar 100% do eleitorado, diretamente ou com dados de outros órgãos, até 2026.

FALHAS DE LEITURA

O estranhamento dos eleitores se aliou aos diversos relatos de falhas de leitura.

É o leitor biométrico que libera a urna para o voto, e, nos casos de erro de identificação, o mesário só pode fazer a liberação manual da urna após quatro tentativas com as digitais, como prevê a legislação.

Essas falhas podem acontecer tanto com quem teve a digital obtida por meio do convênio com outros órgãos quanto com aqueles que compareceram a um órgão eleitoral para o cadastro.

Diferentes condições ou características físicas individuais podem estar entre os motivos para a dificuldade de leitura, como mal posicionamento do dedo, dedos molhados ou secos demais e até mudanças no padrão das digitais, provocadas pelo envelhecimento, cortes e substâncias abrasivas.

NÚMEROS Das quase 156 milhões de pessoas aptas a votar neste ano, cerca de 118 milhões já tinham cadastrado a biometria na Justiça Eleitoral. Em 2018, esses eleitores somavam 73,7 milhões, e, em 2014, 21,7 milhões.

Além disso, outros 9,8 milhões podem ter a digital validada neste pleito por meio do convênio. Para que essa validação ocorra, os eleitores cujos dados foram importados têm de votar em ao menos um dos turnos desta eleição. Ao ter a digital lida com êxito na máquina antes de votar, o sistema entende que está tudo correto e que essa pessoa não precisará mais cadastrar sua biometria na Justiça Eleitoral.

A consolidação dos dados só acontecerá após o pleito, quando a Justiça Eleitoral pretende divulgar um balanço. A identificação por biometria começou a ser testada em 2008 e estava em expansão até 2020. A coleta era executada em cartórios e postos dos TREs, mas foi interrompida há dois anos devido à Covid.

Em São Paulo, maior colégio eleitoral do Brasil, 67% dos mais de 34 milhões de eleitores têm a biometria coletada pelo órgão eleitoral. Outros 12% tiveram as digitais importadas da base do Denatran. Em 2018, 45% do eleitorado paulista tinha biometria registrada, e a captação foi prejudicada pela pandemia.

SEGUNDO TURNO

O procedimento de identificação ocorrerá do mesmo modo no segundo turno, durante o qual digitais de eleitores que não compareceram no dia 2 ainda poderão ser autenticadas. Quem não coletou a biometria na Justiça Eleitoral antes do pleito ainda precisará apresentar um documento com foto válido para votar.

Na terça (4), o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, disse que a Justiça Eleitoral trabalha para evitar filas. Em nota, a corte e o TRE-SP citaram o menor número de cargos em disputa desta vez --presidente e, em alguns casos, governador--, e familiaridade maior de mesários e eleitores com o processo.

POSICIONAMENTOS DA JUSTIÇA ELEITORAL SOBRE AS FILAS Não há ainda um posicionamento conclusivo do TSE sobre os motivos do tempo elevado de espera. Em resposta à Folha, o tribunal afirmou que "os dados oficiais sobre as filas ainda não foram consolidados" e que foram observadas filas mesmo em estados "com volumes irrisórios de biometrias importadas de órgãos externos", como Distrito Federal, com 1.060 digitais, e Amazonas, com 1.061.

No domingo, Moraes minimizou o impacto da demora e apontou que o período do almoço concentra mais eleitores. Já Claucio Corrêa, diretor-geral do TRE-SP, disse que o tempo de espera ficou dentro da expectativa e que a biometria não é um meio ágil de votar, mas um meio seguro. "Ela serve para garantir que o eleitor que comparecer perante a mesa receptora de votos realmente é de fato quem diz ser."

O TRE-RS apontou a dificuldade em identificar a digital de idosos como uma das razões. O TRE-AM atribuiu as filas à biometria, à quantidade de cargos para votação, à falta de anotação dos números pelos eleitores e à alteração de horários --pela primeira vez o país todo votou segundo o horário de Brasília.

Já o TRE-DF apontou a dificuldade na identificação por biometria em alguns locais de votação, especialmente nos que usavam o modelo de urna de 2015. Segundo o tribunal, por serem mais antigos, esses equipamentos têm o leitor biométrico menos sensível e calibrado do que os mais atuais.

Entre outros motivos apontados estão falhas na distribuição das seções eleitorais, com salas muito próximas umas às outras e dificuldade de eleitores para digitar os votos.


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