BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Líderes da base do governo resistiram nesta terça-feira (11) a uma tentativa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de votar a toque de caixa um projeto que busca criminalizar a divulgação de pesquisas eleitorais no país.
Com isso, a discussão ficou para a próxima semana, mas há uma ala de parlamentares que defende que o tema não seja tratado antes do segundo turno das eleições, marcado para o dia 30 de outubro.
Lira tem comandando uma articulação bolsonarista para aprovar a criminalização de pesquisas eleitorais, movimento que tomou corpo após diferenças entre os resultados do primeiro turno com levantamentos de intenção de voto até a véspera da disputa.
A ofensiva tenta desacreditar os institutos com argumentos que ignoram características de pesquisas eleitorais.
A tese defendida pelo grupo político liderado pelo presidente da Câmara é que institutos devem acertar o resultado das eleições, desconsiderando que pesquisas eleitorais medem declaração ou intenção do eleitor no dia da sondagem --não o efetivo voto dado no pleito.
A atual mobilização encorpa um antigo desejo de parte dos congressistas de censurar pesquisas eleitorais.
Um projeto elaborado pelo líder do governo Jair Bolsonaro (PL) na Câmara dos Deputados, Ricardo Barros (PP-PR), tem como espinha dorsal a criminalização (com pena de prisão de até 10 anos) de institutos que publicarem pesquisas "erradas" nos 15 dias que antecedem a votação.
O texto não explica o que seria considerado erro nem o que acontece no caso de flutuações eleitorais ocorridas nas duas últimas semanas da eleição.
A proposta de Barros diz considerar "erro grotesco que sete empresas já estabelecidas no mercado tiveram pesquisas indicando a possibilidade de vitória de Lula no primeiro turno". Ocorre que de fato houve essa chance --apenas 1,57 ponto percentual dos votos válidos separou o petista do triunfo no último dia 2.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, Barros disse que institutos têm o dever de acertar ou devem se retirar do mercado. Ele também não soube explicar qual critério usou para estabelecer o tamanho da pena que colocou em seu projeto.
Desde a abertura das urnas no primeiro turno, Lira manifestou contrariedade com as pesquisas eleitorais e manobrou para acelerar a votação. Ele é um dos principais aliados de Bolsonaro, que aparece atrás de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas do segundo turno divulgadas até agora por Datafolha, Ipec e Quaest.
Nesta semana, o presidente da Câmara anexou a proposta de criminalização das pesquisas a um texto que já havia sido incorporado a um terceiro projeto que está pronto para votação em plenário.
Dessa forma, não seria necessária a análise em comissões ou a aprovação de tramitação em caráter de urgência pelos deputados.
Em reunião com líderes da base governista nesta terça, porém, não houve consenso para que a votação ocorresse. Com isso, o tema nem começou a ser discutido no plenário. Devido ao feriado desta quarta (12), a Câmara só deve ter sessões de votação novamente na próxima semana.
"Não faremos nada no Congresso Nacional, como nunca fizemos, na calada da noite ou com manobras. Sempre com votos, sempre com maioria de votos, sempre discutindo as matérias. E as teses são de dar uma regulamentação à metodologia das pesquisas para dar uma uniformização de números", disse Lira nesta terça em entrevista ao UOL.
O deputado afirmou não saber se o texto de Barros será o votado pela Câmara e disse ter dúvidas sobre como poderia ser feita a responsabilização objetiva penal em uma regulamentação de institutos de pesquisa. "É o estatístico? É o dono da empresa? É quem pesquisou? A gente não pode é estar o tempo todo publicando pesquisas na véspera da eleição e dizer que o povo mudou [de opinião] da véspera para o dia", criticou.
Lira negou que a intenção da proposta seja criminalizar os institutos, embora tenha defendido banir aqueles cujos resultados divergirem muito da margem de erro. Ele afirmou ainda que o objetivo não é proibir a divulgação de levantamentos, citando como exemplo normas existentes em países como França e Itália --onde são adotados o semipresidencialismo e o parlamentarismo, respectivamente.
"Mas nós poderíamos regulamentar para dizer: aquelas pesquisas que forem registradas na semana da eleição, seja de quais institutos forem, que tiverem seu registro, sua metodologia na Justiça Eleitoral, elas deverão ter o tratamento igualitário nos meios de comunicação. É uma regulamentação", disse.
Alguns parlamentares bolsonaristas coletam na Câmara assinaturas para que seja criada uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre os institutos de pesquisa. Lira voltou a dizer que, se houver objeto determinado e número de assinaturas, ele pretende instalar o colegiado.
Além da resistência na Câmara, a mobilização bolsonarista liderada por Arthur Lira deve encontrar obstáculo no Senado.
O presidente da casa legislativa, Rodrigo Pacheco (PSD-MD), afirmou que a criminalização de pesquisas eleitorais a partir dos resultados das urnas, como propõe Ricardo Barros, é algo "absolutamente inadequado".
Segundo Pacheco, caso o projeto de Barros seja aprovado na Câmara e chegue ao Senado, ele terá que passar pela Comissão de Constituição de Justiça e ser amplamente debatido antes de ir ao plenário, o que não deve acontecer antes do segundo turno das eleições presidenciais.
"O texto que eu vi desse projeto, com todo respeito, é um texto, especialmente na parte penal, absolutamente inadequado, porque pune muito severamente o erro. Eventual erro de uma pesquisa numa quinta, cujo resultado não seja idêntico [depois], poder ser punido com quatro a dez anos de prisão --pena superior a peculato, a corrupção--, isso não é adequado juridicamente", afirmou Pacheco.
Para ele, a punição da diferença entre o resultado das pesquisas e o resultado das urnas é "inapropriado sob todos os aspectos". "Se há erros que na verdade são com a intenção de manipulação de dados, obviamente que isso invade uma esfera de natureza criminal, que pode ser coibida", completou.
Diferentemente de Lira, cujo alinhamento ao governo é quase absoluto, Pacheco tem adotado uma linha de independência em relação ao Palácio do Planalto. Em vários casos, ele tem se colocado em posição oposta a pontos defendidos por Bolsonaro e por Lira.
Pacheco também lembrou que as pesquisas de voto são importantes para o período eleitoral e reiterou que foi acordado entre os líderes da Casa que qualquer CPI só deve ser instaurada após as eleições.
O líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), também adotou tom de cautela ao tratar do tema. Segundo ele, que é autor de um requerimento para realizar uma audiência pública sobre os institutos de pesquisa, qualquer movimentação deve acontecer apenas após o período eleitoral --inclusive a possível instauração de uma CPI.
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