SALVADOR, BA, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Candidatos que tiveram mais de 45% dos votos no primeiro turno e saíram derrotados nas urnas no segundo turno são casos raros na história das disputas eleitorais brasileiras.
Em 30 de outubro, no segundo turno da eleição presidencial que opõe Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), os 156 milhões de brasileiros aptos a votar vão decidir se desta vez vai prevalecer a regra ou a exceção.
No primeiro turno, em 2 de outubro, Lula teve 48,43% dos votos válidos contra 43,20% de Bolsonaro, margem mais estreita entre os dois primeiros colocados em uma disputa presidencial desde a redemocratização.
Nos estados, foram 85 disputas para governador em dois turnos desde 1998, com 19 vitórias de quem ficou atrás na primeira votação. Não há caso semelhante nas eleições presidenciais.
Das reviravoltas nos estados, apenas 7 candidatos terminaram o primeiro turno com mais de 45% dos votos e menos de 50% e foram derrotados nas urnas no segundo turno. Destes, apenas 2 tinham adversários que registraram menos que 45% dos votos no primeiro turno.
Os casos nos estados incluem até mesmo eleições em que o candidato a governador saiu na frente, mas terminou o segundo turno com menos votos do que conquistou na etapa anterior.
A eleição para os governos estaduais em 2014 foi a que mais registrou casos de viradas por margem estreita. A situação aconteceu nos estados do Pará, Paraíba e Rio Grande do Norte, onde os favoritos acabaram derrotados no segundo turno.
Na Paraíba, a disputa foi entre o então governador Ricardo Coutinho, hoje no PT e na época no PSB, e o ex-governador Cássio Cunha Lima (PSDB). O tucano encerrou o primeiro turno na frente, com 47,44% dos votos contra 46,05% do então governador.
No segundo turno, a disputa local replicou o acirramento da polarização nacional entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), já que, mesmo com o apoio do PSB ao tucano no segundo turno, Coutinho permaneceu com a petista.
"O processo de virada já tinha começado no primeiro turno, havia uma tendência de crescimento nossa. Eu acreditava muito que venceria aquela eleição, nunca passou pela minha cabeça que poderia dar errado", relembra Coutinho, que governou a Paraíba entre 2011 e 2018.
O segundo turno foi duro, com acusações mútuas e estratégias que incluíram "comitês rebeldes", que buscavam eleitores de Coutinho que votavam em Aécio e de Cunha Lima que apoiavam Dilma.
Três semanas depois da votação no primeiro turno, Coutinho prevaleceu nas urnas com 52,61% dos votos contra 47,39% de Cássio.
Na eleição no Pará em 2014, Helder Barbalho (do MDB, que na época ainda levava o nome PMDB), encerrou o primeiro turno muito perto da vitória: teve 49,02% dos votos contra 47,64% do então governador Simão Jatene (PSDB).
Mas o tucano reagiu no segundo turno e Barbalho saiu das urnas com menos votos do que no primeiro turno. Jatene ficou com 51,92% dos votos e Jatene com 47,64%.
A eleição foi fortemente marcada pela discussão em torno da possível divisão do Pará em três estados, que havia sido rechaçada em plebiscito três anos antes.
Na avaliação de Simão Jatene, as três semanas de segundo turno foram cruciais para contrapor as acusações de que ele seria a favor da divisão do estado e para mostrar que o adversário tinha posição dúbia sobre o tema.
"A verdade, felizmente, é teimosa. Os eleitores perceberam que havia um discurso falacioso do meu adversário", relembra o ex-governador. Ele ainda destaca que o segundo turno favorece o embate direto e mais transparente entre os candidatos, permitindo ao eleitor comparar os projetos.
No Rio Grande do Norte, o então presidente da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves, na época do PMDB, saiu derrotado após começar a eleição para governador como favorito.
O peemedebista teve 47,34% no primeiro turno contra 42,04% do então vice-governador Robinson Faria, na época no PSD. É o resultado mais próximo aos desempenhos de Lula e Bolsonaro em 2022
Na segunda etapa da eleição, contudo, o cenário se inverteu: Robinson chegou a 54,42% contra 45,58% de Henrique Eduardo Alves.
"Enfrentei um candidato muito poderoso, que uniu dois grupos políticos que se revezavam no poder há 60 anos. Eu tive a coragem de enfrentar esse acordão e acho que o povo admirou essa coragem. Foi, de fato, uma vitória histórica", afirma o ex-governador e deputado federal eleito Robinson Faria (PL).
Um dos fatores decisivos para a virada foi o apoio de Lula. No final do primeiro turno, o ex-presidente gravou um vídeo de apoio a Robinson, repetido à exaustão na segunda etapa da campanha. Robinson reconhece a importância da aliança, mas diz que foi uma parceria em que os dois lados ganharam.
Na época, Alves disse ter ficado surpreso e incomodado com a gravação de Lula, alegando que ele sempre agiu com lealdade com os governos petistas. Menos de dois anos depois, Robinson rompeu com o PT e apoiou o impeachment da então presidente Dilma Rousseff.
Outra virada emblemática aconteceu em 2006 no Maranhão, quando Jackson Lago (PDT) impôs uma derrota ao clã Sarney no segundo turno.
Roseana Sarney, na época no PFL, terminou o primeiro turno com 47,21% dos votos contra 34,36% de Lago. No segundo turno o quadro se inverteu: Lago cresceu mais de 15 pontos e saiu vitorioso nas urnas.
Em 1998, o Rio Grande do Sul também foi palco de uma reviravolta, quando Antônio Britto (PMDB) e Olívio Dutra (PT) foram para o segundo turno com uma margem estreita: 46,4% a 45,92%. Três semanas depois, o petista saiu vitorioso das urnas com 50,78% dos votos.
Ex-governadores que viraram eleições estaduais têm visões distintas ao comparar os cenários de suas respectivas eleições com a disputa presidencial de 2022.
Ricardo Coutinho (PT) destaca a cristalização do voto na polarização entre Lula e Bolsonaro que permanece desde o início da campanha.
"Não creio em reviravolta em uma eleição tão acirrada e que tem um alto grau de decisão do voto. É difícil para Bolsonaro virar o jogo neste cenário", diz.
De acordo com pesquisa Datafolha divulgada nesta quarta-feira (19), 94% dos eleitores de Lula estão totalmente decididos quanto ao seu voto, percentual que chega a 95% entre os apoiadores de Bolsonaro.
Robinson Faria, que é aliado de Bolsonaro e pai do ministro Fábio Faria (Comunicações), diz que o presidente está em tendência de alta e deve se reeleger: "Bolsonaro chegou ao segundo turno como um avião decolando, em curva ascendente. Ninguém derrota tendência".
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