SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Espremida e pautada pelo antagonismo entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) na eleição nacional, a disputa pelo Governo de São Paulo será decidida entre Fernando Haddad (PT), Tarcísio de Freitas (Republicanos) e Rodrigo Garcia (PSDB).
A depender do resultado, o principal estado do país irá coroar o domínio de um dos polos ou terá o papel de reduto da oposição --pode também indicar que a terceira via e o PSDB ainda respiram.
A pesquisa Datafolha divulgada neste sábado (1º), véspera do primeiro turno da eleição, mostra Haddad com 39% dos votos válidos, seguido de Tarcísio, com 31%, e Rodrigo, com 23%. Nas simulações de segundo turno, o petista vence o bolsonarista por 46% a 41% e empata tecnicamente com o tucano, que aparece com 43% ante 42% de Haddad.
Na pesquisa espontânea, 34% dizem ainda não ter decidido em quem votar. E 27% afirmam que ainda podem mudar de voto.
Também participam do pleito Elvis Cezar (PDT) e Vinicius Poit (Novo), franco-atiradores em debates, e outros candidatos igualmente nanicos: Carol Vigliar (UP), Gabriel Colombo (PCB), Antonio Jorge (DC), Edson Dorta (PCO) e Altino (PSTU).
Ex-prefeito da capital e ex-ministro da Educação, Haddad, 59, liderou em toda a campanha --cenário improvável no estado onde o PSDB vence desde 1994 e o PT não chegou a ter chances reais de vitória.
É consenso que o petista terá dificuldade no segundo turno, seja contra o ex-ministro da Infraestrutura Tarcísio, 47, representante de Bolsonaro, ou Rodrigo, 48, o atual governador que foge da polarização.
Haddad se ancorou em Lula e viajou ao interior com outro padrinho, o ex-governador e ex-tucano Geraldo Alckmin (PSB), em busca de suavizar a resistência do paulista conservador.
Ciente da oportunidade histórica, o PT operou uma inédita união da esquerda, com PSB, PSOL, Rede, PV e PC do B.
Tarcísio, que angariou os apoios de Republicanos, PL, PSD , PTB, PSC e PMN, teve a campanha marcada pela necessidade de se afirmar como bolsonarista e paulista --sua ignorância sobre o local de votação em São José dos Campos (SP), onde nunca morou, virou meme.
Assim como Haddad, grudou no padrinho e percorreu o estado em motociatas, sempre refém da ambiguidade entre se apresentar como técnico ao mesmo tempo em que testemunhava Bolsonaro questionar urnas e atacar mulheres.
Para se diferenciar, Rodrigo pregou "nem esquerda nem direita" e disse não ter padrinhos --escondendo seu antecessor João Doria (PSDB), de quem foi vice.
Embora não tenha tido um presidenciável para chamar de seu, o tucano teve onde se apoiar. Atraiu União Brasil, partido com maior verba e tempo de TV, e montou uma aliança com Cidadania, MDB, Podemos, Solidariedade, PP, Avante e Patriota.
Mas, principalmente, utilizou a máquina pública a seu favor, multiplicando recursos para municípios e parlamentares.
Com o desafio de se tornar conhecido, o neotucano, que entrou para o PSDB em 2021, foi quem visitou mais cidades a cada dia. Até sexta-feira (30), a campanha gastou R$ 2,3 milhões com empresas de táxi aéreo.
No sábado (1º), os três encerraram a campanha na região metropolitana. Mais uma vez, os dois primeiros colocados estiveram ao lado dos padrinhos.
Haddad participou de caminhada com Lula e Alckmin na rua Augusta, e Tarcísio saiu em motociata com Bolsonaro do Campo de Marte ao Ibirapuera. Rodrigo percorreu Osasco e São Bernardo do Campo.
Reproduzindo o discurso de frente ampla de Lula, Haddad pregou que São Paulo e o país deveriam remar na mesma direção. Ele mirou o eleitorado mais pobre ao prometer ampliar o salário-mínimo paulista e criar o Bilhete Único metropolitano.
Já Tarcísio chegou a ser acusado de traidor e foi alvo de fogo amigo por não embarcar plenamente na guerra cultural bolsonarista. Passou, então, a demonstrar alinhamento --valorizou a família e a religião, além de atacar Lula e o PT.
Na campanha, ele vendeu uma imagem de eficiência do governo federal na geração de empregos e crescimento da economia. "A gente não quer ver a volta do retrocesso, da corrupção. A gente não quer ver a volta da esquerda", disse ao lado de Bolsonaro, em Santos, na quarta (28).
Em Guarulhos, um dia depois, afirmou ter entendido "o que as pessoas estão precisando, o que o setor produtivo está precisando". "Comunicamos isso à sociedade e a recepção foi a melhor possível."
A eleição para o Planalto acabou norteando até mesmo Rodrigo, ainda que para dar as costas à disputa nacional a cada vez que repetiu querer "proteger São Paulo da briga política".
Na reta final e em terceiro lugar, apostou nos eleitores indecisos, no voto útil contra o PT e na mobilização de prefeitos e deputados irrigados com entregas do estado. O volume de obras em São Paulo, aliás, foi munição contra Tarcísio e o governo federal.
Em comício com mais de 500 prefeitos no último dia 19, afirmou que seu time "representa a história e o futuro" e que está em jogo na eleição "a vitória da boa política de São Paulo". "Preciso de cada um aqui", encerrou, antes de ser carregado pelo público.
"Pesquisa reflete o momento, e, com esta quantidade de indecisos, o resultado está aberto. Fiz uma campanha propondo o futuro de São Paulo, fui atacado por todos os candidatos", disse Rodrigo, acompanhado do apresentador Ratinho no Mercadão, na sexta.
Até 2018, o PSDB vinha de três vitórias no primeiro turno em São Paulo. Naquele ano, o PT mais uma vez fracassou, e a polarização nacional foi representada no BolsoDoria, fórmula que elegeu novamente um tucano.
Quatro anos mais tarde, no estado que tem o antipetismo como marca, principalmente no interior, a reprovação ao bolsonarismo também ganhou expressão. O eleitor de São Paulo, inclusive, rejeita mais Bolsonaro do que Lula, que pode vencer em primeiro turno neste domingo.
É nesse contexto mais favorável à esquerda, sobretudo após a queda da Lava Jato, em que Haddad busca sua redenção nas urnas, apesar da pecha de pior prefeito da capital e da derrota em 2018.
Em Campinas, na sexta, o ex-prefeito esteve acompanhado de Alckmin e Márcio França (PSB), candidato ao Senado.
"As pessoas compreenderam o nosso recado para São Paulo. Estamos com uma equipe maravilhosa, [...] dois ex-governadores com larga experiência que deram um suporte técnico e político para essa nossa empreitada", disse.
Evitando criticar o legado tucano como um todo, por causa de Alckmin, Haddad passou a denunciar direitos cortados por Doria, Rodrigo e também Bolsonaro. "O que estamos propondo não é nenhum milagre: é a volta de um projeto de emancipação do nosso povo", disse em Itaquera, no último dia 24, ao lado de Lula.
No segundo turno, Haddad perde o favoritismo e será alvo. Sua dificuldade já está expressa no trajeto de queda, ainda que lenta e tímida, no Datafolha. Caso perca e Lula vença, há a opção de integrar o ministério em Brasília.
Uma vitória de Tarcísio, que concorre em São Paulo a pedido do presidente, seria um atestado de que o bolsonarismo mantém sua força eleitoral. O domínio do governo paulista seria a catapulta desse campo na eleição de 2026.
Tido como mais palatável que Bolsonaro, o ex-ministro prometeu retomar o interesse de empresas em investirem e se instalarem no estado.
Cobrado pelos radicais, flertou com o negacionismo ao criticar a obrigatoriedade da vacina para servidores e as câmeras no uniforme de policiais. Na medida em que colou em Bolsonaro, tornou-se mais conhecido e teve uma trajetória de alta constante no Datafolha.
O governador, que também chegou à disputa desconhecido, cresceu de maneira mais lenta e estagnou no final, segundo o instituto. Em desvantagem, enfileirou medidas populistas, como diminuição de impostos e congelamento da tarifa do pedágio.
Prometeu ainda devolver o ICMS aos mais pobres e criar um auxílio alimentação de R$ 300, o cartão Bom Prato.
De olho no eleitor bolsonarista, fez acenos às forças de segurança e ao agronegócio --numa ocasião, pediu que um aliado de Bolsonaro transmitisse um abraço ao presidente.
Rodrigo reivindicou para si o legado tucano de Mário Covas (PSDB) e apresentou-se como "paulista raiz" para se diferenciar do carioca Tarcísio. O combalido PSDB vê na manutenção do governo paulista a chave para que o partido sobreviva após a crise com Doria.
Ocupante do cargo em disputa, Rodrigo viu seus rivais se unirem em dobradinhas nos debates --a estratégia de Tarcísio era chegar ao segundo turno e a de Haddad, eliminar o adversário mais competitivo na segunda etapa.
O petista e o bolsonarista, por sua vez, também tiveram que se esquivar de ataques. As críticas disparadas entre os três rivais afastou a possibilidade de que o perdedor apoie um dos adversários no segundo turno, embora estrategistas das campanhas não descartem nenhum cenário até o veredito das urnas.
Pontos fracos e ataques explorados
Fernando Haddad (PT)
- escândalos de corrupção do PT
- má avaliação na gestão na Prefeitura de São Paulo, com reprovação de 48%, o pior índice desde Celso Pitta
- obras não entregues na capital, como hospitais
- programa Braços Abertos na cracolândia, apelidado de bolsa crack
Tarcísio de Freitas (Republicanos)
- ser carioca e não morar no endereço que declarou em São José dos Campos (SP), além de não conhecer seu local de votação
- baixo investimento e entregas em São Paulo como ministro em comparação a outros estados e ao governo estadual
- aliados polêmicos como Eduardo Cunha (PTB), Douglas Garcia (Republicanos) e Frederico D'Avila (PL), deputado que xingou o papa
- ter gravado vídeo de apoio para o prefeito de Embu das Artes, Ney Santos (Republicanos), suspeito de ligação com o PCC, e para Fernando Collor (PTB)
Rodrigo Garcia (PSDB)
- se aliar e depois esconder João Doria (PSDB), cuja rejeição é alta no estado
- patrimônio milionário não declarado ao TSE
- o irmão Marcelo Aurélio Garcia, condenado por lavagem de dinheiro na chamada máfia do ISS
- aumento de impostos na pandemia
Principais propostas
Fernando Haddad (PT)
- Salário Mínimo Paulista: elevar para R$ 1.580, aumentando o poder de compra do trabalhador;
- Menos impostos: zerar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre a carne e a cesta básica
- Bilhete Único Metropolitano: unificar os bilhetes únicos municipais com o estadual e permitir a integração das regiões metropolitanas, com redução de custos
- Hospitais Dia: criação de 60 unidades no interior e demais regiões metropolitanas e outras 10 na Grande SP
- Trem intercidades: inicialmente ligará as regiões de São Paulo com Campinas; depois, Santos, Sorocaba e São José dos Campos
Tarcísio de Freitas (Republicanos)
- Combate à evasão escolar: auxílio mensal de R$ 120 em 12 meses para 1,3 milhão de alunos do ensino médio
- Isenção previdenciária: isenção do recolhimento da contribuição previdenciária para quem recebe até o teto do INSS, de R$ 7.087,22
- Saneamento básico: antecipação da universalização do saneamento básico de 2033 para 2027
- Ação social: medidas conjuntas nas áreas de saúde, assistência social e segurança para pessoas em situação de rua
- Proteção às mulheres: investimento em políticas de segurança, com monitoramento de agressores, além de mais delegacias com atendimento 24 horas
Rodrigo Garcia (PSDB)
- Cartão Bom Prato: criação de cartão com até R$ 300 para famílias em situação vulnerável
- Dinheiro de volta: devolução do valor de ICMS da Nota Fiscal Paulista à população mais pobre
- Modernização dos AMEs: ampliação do horário de atendimento em todos os Ambulatório Médico de Especialidades, que farão também hemodiálise e quimioterapia
- Universalização do ensino de tempo integral: ensino técnico integrado para todos os alunos do ensino médico, além de universalização do ensino integral para estudante do fundamental 2 e médio
- Mais metrô: expansão das linhas na zona norte de São Paulo e início das obras da extensão para Guarulhos
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