RECIFE, PE (FOLHAPRESS) - Alvo de pedido de investigação da PGR (Procuradoria-Geral da República) por possível apologia aos atos golpistas em Brasília, a deputada federal eleita Clarissa Tércio (PP-PE) tem ao longo da trajetória parlamentar episódios como uma tentativa de impedir um aborto legal e a defesa do uso da cloroquina para Covid durante período crítico da pandemia.

Bolsonarista, Erica Clarissa Borba Cordeiro de Moura, 38, é conhecida como Clarissa Tércio. O sobrenome usado na política é alusivo ao pai, o pastor Francisco Tércio, presidente da Assembleia de Deus Novas de Paz, igreja presente em diversas cidades da região metropolitana do Recife e do interior de Pernambuco.

Clarissa foi eleita para um cargo político pela primeira vez em 2018. Obteve 50.789 votos e tornou-se deputada estadual pelo PSC à época.

O pedido de investigação feito pela PGR foi enviado ao STF (Supremo Tribunal Federal) na quarta (11). Outros dois deputados federais eleitos, André Fernandes (PL-CE) e Silvia Waiãpi (PL-AP), também estão na mira da Procuradoria por possível incitação aos atos de violência e vandalismo registrados em Brasília no último dia 8 de janeiro.

De acordo com o MPF (Ministério Público Federal), postagens feitas pelos três deputados eleitos e diplomados em redes sociais "antes e durante as invasões podem configurar incitação pública à prática de crime e tentativa de abolir, mediante violência ou grave ameaça, o Estado democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais".

De acordo com as petições, no dia 8 de janeiro, a deputada federal eleita Clarissa Tércio divulgou, no Instagram, um vídeo fomentando atos de invasão e vandalismo.

Na postagem, segundo a PGR, ela publicou um vídeo em que um dos invasores diz: "Acabamos de tomar o poder. Estamos dentro do Congresso. Todo povo está aqui em cima. Isso vai ficar para a história, a história dos meus netos, dos meus bisnetos".

Em nota, Clarissa Tércio disse que não estava na capital federal no dia dos atos golpistas. A deputada também disse que a voz que aparece no vídeo não é dela e que não escreveu a frase em defesa da tomada de poder.

"Como já informei, eu não estava em Brasília e apenas repostei o vídeo de uma pessoa, com a seguinte legenda: "Brasília hoje, oremos pelo Brasil". Nada além disso! Inclusive na minha defesa, já apresentada à PGR, consta essa informação", diz.

"Em alinhamento com o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, ratifico que sou totalmente contrária a qualquer ato de violência, vandalismo ou de destruição do patrimônio público que venha ameaçar a nossa democracia. Dessa forma, repudio toda e qualquer tentativa de ser tachada de apoiadora de atos violentos e anticonstitucionais", acrescentou a deputada federal eleita, em nota.

A trajetória da parlamentar é marcada por outros momentos controversos. Na pandemia, Clarissa Tércio fez defesa do uso da cloroquina, mesmo com o medicamento comprovadamente ineficaz para o tratamento da Covid, e teve vídeo compartilhado pelo então presidente Jair Bolsonaro.

Em agosto de 2020, ela participou, com outros parlamentares estaduais, de uma manifestação com o intuito de impedir a realização de um aborto legal em uma maternidade do Recife.

O caso teve repercussão nacional. Na ocasião, uma criança de dez anos, estuprada no Espírito Santo, foi transferida para Pernambuco com o objetivo de realizar a interrupção legal da gravidez. A legislação brasileira prevê legalidade para o aborto em casos de anencefalia fetal, gravidez resultante de estupro e risco à vida da grávida.

Apesar do aborto legal ter sido autorizado pela Justiça, dezenas de pessoas, entre religiosos e parlamentares, incluindo Clarissa Tércio, se juntaram em frente à maternidade responsável pelo procedimento no Recife.

O acontecimento foi um dos impulsionadores da popularidade de Clarissa Tércio no segmento bolsonarista e no público evangélico em Pernambuco. Poucos meses depois, o marido dela, Júnior Tércio, foi eleito o terceiro vereador mais votado do Recife, com 12.207 votos, pelo Podemos.

José Ivanildo de Moura Júnior, chamado de Júnior Tércio popularmente, é apresentador de um programa na rádio Novas de Paz, voltada aos evangélicos. A emissora é uma das líderes em audiência da região metropolitana do Recife.

Desde que assumiram os mandatos parlamentares, Clarissa e Júnior Tércio mostraram alinhamento a Bolsonaro. Em 2021, o casal posou para foto com armas. Juntos, possuem mais de 1,6 milhão de seguidores no Instagram.

Clarissa Tércio também entrou em uma escola particular da zona oeste do Recife em maio de 2022 para contestar a atuação de uma professora. Opositores da deputada disseram que ela ingressou no espaço sem autorização da direção para criticar a educadora em razão de uma aula sobre o filósofo alemão Friedrich Hegel. Já a deputada alegou que foi chamada pelos pais de um aluno que teria sido chamado de esquizofrênico pela professora após o estudante dizer que ouvia a voz de Deus.

Em 2022, Clarissa Tércio foi a segunda deputada federal mais votada de Pernambuco, com mais de 240 mil votos, quase quintuplicando a sua votação em relação a quatro anos atrás. Júnior Tércio recebeu 183 mil votos para deputado estadual.

Ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) Clarissa Tércio declarou R$ 38,2 mil em bens em 2018. Quatro anos depois, R$ 1,38 milhão. Já Júnior Tércio não declarou bens em 2020, enquanto em 2022 foi declarado R$ 1,028 milhão.

Clarissa e Júnior Tércio tiveram dificuldades para se filiar ao PL, que é comandado em Pernambuco pelo ex-prefeito de Jaboatão dos Guararapes Anderson Ferreira, terceiro lugar na disputa para governador com apoio de Bolsonaro.

O impasse aconteceu porque Anderson Ferreira e o seu irmão, o deputado federal reeleito André Ferreira, disputam com os Tércio a aceitação no público evangélico. Com isso, Clarissa acabou indo para o PP, a convite do deputado federal Eduardo da Fonte.


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