BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A CGU (Controladoria-Geral da União) revogou um ato do governo Jair Bolsonaro (PL) que limitava críticas e manifestações políticas de servidores públicos federais. A anulação era um pedido dos sindicatos de carreiras do funcionalismo público e promessa do atual ministro, Vinícius Carvalho.

"[A nota] firmou entendimento no sentido de limitar a manifestação de agentes públicos", disse Carvalho durante discurso de posse, no início do mês. Segundo ele, isso era uma "afronta à livre manifestação de pensamento".

Servidores chamavam o ato de Bolsonaro de "nota da mordaça". A nota técnica foi publicada pelo ex-ministro da CGU Wagner Rosário em 2020.

Em um dos trechos, o texto dizia que a "divulgação pelo servidor de opinião acerca de conflitos ou assuntos internos, ou de manifestações críticas ao órgão ao qual pertença, em veículos de comunicação virtuais, são condutas passíveis de apuração disciplinar".

Além disso, estava previsto que "as condutas de servidores que tragam repercussão negativa à imagem e credibilidade de sua instituição" poderiam ser enquadradas em descumprimento da lei com regras para o funcionalismo público.

O Fonacate (Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado), que reúne 37 associações e sindicatos de carreiras de estado, publicou um documento em que disse que as medidas do governo Bolsonaro violavam a liberdade de expressão dos servidores e representavam assédio institucional.

Na época, a CGU disse que as normas foram feitas em razão das mudanças nas condições de trabalho recentes e dos avanços tecnológicos. A nota foi publicada em meio à pandemia da Covid-19.

Na gestão Bolsonaro, o órgão afirmou ainda que as orientações não se referiam "a eventual tratamento que deva ser dado a opiniões políticas ou sobre o governo por parte de algum agente público".

Por isso, a equipe de Rosário argumentou que não se tratava de censura. "A internet não é --e não pode ser-- um território sem lei, em que o agente público possa veicular informações que comprometam a credibilidade das instituições", justificou o órgão de controle.

Ao revogar a nota técnica, a pasta comandada por Carvalho informou que a anulação foi realizada diante de "controvérsias em torno de possíveis interpretações resultantes do documento que poderiam causar danos à liberdade de expressão de agentes públicos".

Segundo a CGU, não foram encontrados processos abertos ou sanções aplicadas com base na nota técnica da gestão Bolsonaro.

Para escapar de punições, servidores passaram a usar perfis anônimos ou falsos nas redes sociais para criticar atos e decisões dos órgãos em que trabalham.

Um exemplo é o perfil chamado "O Fiscal do Ibama" no Twitter. O objetivo da página é a "divulgação e fiscalização da gestão dos órgãos federais de meio ambiente e desmontes das políticas ambientais".

"O Fiscal do Patrimônio Histórico" é outro perfil de rede social que foi criado durante a vigência da nota técnica da CGU de Rosário.

A professora de administração pública e governo da FGV-SP, Gabriela Lotta, aponta que o ato da gestão do ex-presidente "foi o ápice de um processo de censura que foi experimentado em diversas organizações desde o início do governo Bolsonaro".

O primeiro ensaio foi no ICMBio (Instituto Chico Mendes). Depois, explicou, tentaram replicar a mesma no Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

"Aos poucos esse processo foi crescendo em diversos órgãos até que a CGU institucionalizou nesse decreto da mordaça, que passou a valer de forma generalizada", afirmou.

Para Lotta, a normativa "foi um dos instrumentos de opressão que o governo Bolsonaro usou contra servidores públicos e que tinha como objetivo diminuir a capacidade deles de criarem barreiras à agenda de destruição do governo".

"A censura inibia que servidores, por exemplo, dessem entrevistas ou postassem informações denunciando ilegalidades ou decisões equivocadas do governo. Acaba criando um clima de medo e até de autocensura, com servidores com receio de retaliações", acrescentou.

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