BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A votação do PL das Fake News na Câmara dos Deputados, prevista para esta terça-feira (2), pode ser adiada diante das chances de o texto ser rejeitado pelo plenário.

Nesta terça, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), conversará com os líderes dos partidos para tomar uma decisão. O relator do texto, Orlando Silva (PC do B-SP), também deve se reunir com seus pares. O adiamento é cenário considerado provável por governistas -o Palácio do Planalto endossa a matéria- e oposição.

O placar apertado para impor urgência à matéria, a pressão de big techs contra o texto e o desembarque de deputados, especialmente da bancada evangélica, tornaram o cenário incerto em relação à aprovação do texto.

O projeto é visto, junto com a pauta econômica, como um dos mais importantes para o governo neste primeiro semestre. A avaliação do Executivo é que a regulamentação das redes sociais impediria um avanço ainda maior da militância do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na internet.

Apoiadores do ex-chefe do Executivo, no entanto, têm esperança de derrubar o projeto.

Na última quinta-feira (28), Orlando Silva publicou a versão final do texto que será submetido ao plenário, com concessões feitas para atender a reivindicações da bancada evangélica e da oposição. Foi retirada, por exemplo, a previsão de uma agência reguladora.

A movimentação, no entanto, não parece ter sido suficiente para garantir a aprovação da matéria. No sábado (29), o presidente do Republicanos, Marcos Pereira, anunciou que o partido votará contra o projeto.

A decisão é importante porque, na aprovação do regime de urgência por 238 a 192, a sigla foi fundamental, com 29 votos em favor da tramitação mais rápida.

Caso a votação do projeto siga o que foi registrado na última semana, apenas invertendo tais votos, o texto não seria aprovado --é necessária maioria simples para que uma proposta avance na Câmara.

Marcos Pereira disse que os votos favoráveis a uma tramitação mais célere não se confundem com a posição em relação ao mérito do tema.

"Ninguém assumiu o compromisso de votar o projeto propriamente dito", declarou. "É verdade que ele [relator] fez vários ajustes no texto, acatou muitas sugestões da bancada evangélica, de vários parlamentares de vários partidos, inclusive do Republicanos, mas o texto continua ruim."

Além da mudança no cenário político, na última semana as big techs também ampliaram a pressão para que a votação do projeto seja adiada, com manifestações públicas e anúncios em grandes jornais. A celeridade na votação é criticada por empresas como Meta, Google, Twitter e Tik Tok.

Um dos argumentos é de que não houve discussões suficientes sobre o tema.

Críticos da proposta afirmam ainda que há trechos vagos e que a previsão de regulamentação de vários dispositivos aumenta o poder para o Executivo controlar a lei.

Sob reserva, parlamentares avaliam que o debate se tornou ideológico e não mais de mérito. Ou seja, que a posição contrária se dá por oposição política e não necessariamente por discordâncias quanto ao conteúdo da lei.

Também entendem que há pouca margem de manobra para Lira porque, como o relatório final já foi apresentado, não é possível fazer mais mudanças no texto para tentar angariar mais votos -alterações agora, podem ser feitas apenas durante a votação.

Uma possibilidade para tentar mitigar a debandada do Republicanos é angariar votos de quem estava ausente ou de partidos mais próximos ao governo, como União Brasil ou PSD, e que se dividiram na deliberação da urgência.

A oposição tenta aproveitar para conseguir não só derrotar o projeto de Orlando Silva, mas para também emplacar em seu lugar outra proposta de regulação das redes sociais, de autoria de Mendonça Filho (União Brasil-CE).

A ideia vem sendo ventilada desde a última semana por deputados do PL, mas enfrenta resistência de Lira.

Orlando Silva afirmou que está otimista com a votação, mesmo diante do cenário atual.

"O que não pode é seguirmos com as redes sociais na dinâmica de hoje. É preciso mudar o regime de responsabilidades das plataformas digitais. O Congresso Nacional não pode terceirizar suas tarefas. Não é razoável deixar que o Judiciário faça o que é nossa obrigação", disse.

Também afirmou que atendeu "todas as propostas das bancadas" com quem se reuniu e da Frente Parlamentar Evangélica. "Se me apresentaram propostas e atendi, imagino que quem propôs a mudança o fez para, se atendido, votar a favor", completou.

O projeto regulamenta as redes sociais e impõe sanções a plataformas que não retirarem do ar, até 24 horas após decisão judicial, conteúdos ilícitos. A proposta ganhou força no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após o levante golpista de 8 de janeiro e os ataques a escolas em São Paulo e em Blumenau (SC).

O texto em discussão traz, entre outros pontos, uma série de obrigações às plataformas de redes sociais e aplicativos de mensagens, como a moderação de conteúdo.

O projeto de lei chegou a ser aprovado no Senado em 2020. No ano seguinte, a Câmara criou um grupo de trabalho para analisar o texto. O andamento, no entanto, não ocorreu e, em 2022, os deputados rejeitaram dar urgência à análise.

Em entrevista à Folha, o diretor de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Google Brasil, Marcelo Lacerda, afirmou que o PL das Fake News é vago. Ele disse que a empresa já adota medidas para moderar conteúdo de ódio e que a responsabilidade por violência nas escolas não é só das plataformas.

Segundo ele, o texto deixa incertezas sobre como será feita a regulação das plataformas e se equivoca ao equiparar o cuidado exigido por mecanismos de buscas ao de redes sociais.

O representante do Twitter Brasil, Hugo Rodríguez, que participou de reuniões no Ministério da Justiça sobre ataques nas escolas, criticou a votação do projeto no domingo (30).

"Desde o primeiro momento, temos pedido para diferentes atores mudanças que sejam compatíveis com os padrões internacionais. Porém, o projeto continua do mesmo jeito. Não é sim ou não, é pensar em mudanças conjuntas, hoje, não o dia da votação", disse.


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