SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Os bastidores da saída de João Farias da Secretaria de Habitação da gestão Ricardo Nunes (MDB) e do estremecimento na relação do prefeito com o Republicanos envolvem o ex-presidente do PSDB Bruno Araújo e o advogado Alexandre Romano, ex-vereador do PT de Americana (SP) que foi preso em 2015 na Operação Lava Jato.

Como revelou a coluna Painel, da Folha de S.Paulo, Farias pediu demissão na sexta-feira (26), após desentendimentos com o diretor-presidente da Cohab, João Cury, e o secretário de Governo, Edson Aparecido. Nesta segunda-feira (29), ele oficializou sua saída após reunião com Nunes.

Segundo apurou a coluna, o ex-secretário incomodou-se ao descobrir um pedido de Declaração de Utilidade Pública elaborado por Cury e Aparecido, direcionado especificamente para um terreno em Cidade Tiradentes apelidado Vaquejada, onde há décadas existe uma ocupação irregular de famílias de baixa renda.

Araújo, ex-ministro das Cidades, que presidiu o PSDB entre 2019 e janeiro deste ano, vinha mobilizando aliados junto à prefeitura para que o decreto fosse feito e publicado.

Elaborado sem a participação da Secretaria de Habitação, o decreto serviria especificamente ao propósito de viabilizar um empreendimento de 5.000 unidades habitacionais submetido pelas empresas parceiras Usu Campeão, de propriedade de Romano, e Sousa Araújo, ao programa Pode Entrar. A prefeitura pagaria aproximadamente R$ 1,1 bilhão às empresas pelo projeto.

Para participar do Pode Entrar, as proponentes precisam entregar as matrículas dos terrenos em que pretendem construir. Como parte da área em questão está ocupada irregularmente, isso não seria possível, levando à desclassificação do projeto de Usu Campeão e parceiras. Com o decreto, a parcela do terreno em que estão as famílias seria desmembrada, possibilitando a elaboração de uma matrícula específica do terreno não ocupado, viabilizando, assim, o projeto habitacional.

A área desmembrada seria doada para a prefeitura pelas empresas, segundo a proposta. Em 27 de março, a Usu Campeão enviou ofício à Cohab e à Secretaria de Governo com os mesmos pedidos que apareceriam no esboço do decreto em maio.

Próximo de Romano, Bruno Araújo, ex-presidente do PSDB e ex-ministro das Cidades, vinha telefonando a aliados na prefeitura para que o decreto fosse publicado, o que estava prestes a acontecer antes da intervenção de Farias. Na Secretaria de Habitação, a tentativa de interferência vinha causando incômodo.

Além do fato de ter sido preterido da discussão do decreto, Farias irritou-se com o conteúdo e com a tramitação veloz dentro da prefeitura.

Para ele, o decreto daria vantagem indevida para o projeto de uma empresa específica que estava prestes a ser desclassificada, em detrimento de concorrentes e contornando as determinações do edital do Pode Entrar. Um pedido de Declaração de Utilidade Pública feito por Farias da mesma área em Cidade Tiradentes está parado há um ano na gestão municipal, aguardando assinatura do prefeito após passar por todas as instâncias. O novo pedido de DUP, capitaneado por Cury, percorreu o mesmo trajeto em dois meses.

Protagonista oculto do processo, Alexandre Romano, conhecido como Chambinho, foi preso na operação Pixuleco 2, suspeito de ter intermediado contratos milionários da Consist Software com o Ministério do Planejamento. Em troca, segundo a Polícia Federal, a empresa foi obrigada a lhe pagar uma taxa, que então era repassada por diferentes canais até chegar ao PT.

Do lado contrário a Farias, a alegação é de que a proposta é a mais vantajosa para o município e que essa leitura é corroborada pelo corpo técnico da prefeitura. Sem ela, afirmam, os projetos para a área serão mais caros e não incluirão a doação da área em que estão as famílias.

Em nota, Bruno Araújo diz que, como profissional contratado da Labutare, empresa parceira da Usu Campeão, "defendeu que a proposta selecionada por critérios técnicos pelo colegiado próprio é a mais vantajosa econômica e socialmente ao interesse público".

"Como ex-ministro da área, Bruno Araújo conduziu o programa nacional de habitação popular e foi de sua iniciativa a lei de regularização fundiária em vigor. Profissionalmente prestou e presta serviços ao setor", completa.

A Usu Campeão é uma empresa de regularização fundiária que possui um contrato de compromisso de compra e venda com os proprietários do terreno em Cidade Tiradentes.

Em nota, afirma que o projeto em questão "foi selecionado pelo menor preço para a prefeitura e era o que melhor atendia ao interesse público. A proposta qualificada apresentou o valor dos imóveis 18% menor do que o médio proposto pelas demais empresas concorrentes."

"Para a aquisição do terreno onde serão feitas as moradias, foi usada uma modalidade prevista em lei chamada de desapropriação amigável. A Prefeitura de São Paulo não vai ter qualquer custo ou ônus para a desapropriação", completa.

A construtora Sousa Araújo, por sua vez, diz que foi chamada para participar do Pode Entrar pela Labutare Construtora e Incorporadora.

"De posse do projeto reunimos toda a documentação solicitada pelo edital e apresentamos o empreendimento. Ele foi habilitado e homologado e nesse momento aguardamos a decisão da Prefeitura sobre a desapropriação amigável proposta, bem como a conclusão das análises e aprovação dos projetos", diz.

"Pelo que entendemos do edital, somente mediante a expedição do alvará de execução que poderemos avançar para a próxima fase do projeto para assinatura dos contratos e início das obras. Nós não conhecemos o Sr. Bruno Araújo e não temos qualquer relação comercial com o mesmo", conclui.

Em nota, a gestão Nunes diz que "a empresa dona do terreno se inscreveu no Programa Pode Entrar com oferta de habitação no terreno e se propõe a doar uma parte para a prefeitura, na qual há habitações consolidadas, que seria objeto de regularização fundiária, originada da proposta de Declaração de Utilidade Pública, além de uma rua que corta o terreno."

"A administração municipal está definindo se irá desapropriar todo terreno e pagar pelo local ou se irá receber a doação. Caso decida por receber a doação de parte do terreno, a proposta de fazer a regularização fundiária na área que está ocupada não terá custos. Desse modo, não ocorreria a desapropriação total e a empresa poderia construir no espaço", conclui.


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