BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A defesa de Jair Bolsonaro (PL) atribuiu, antes da operação da Polícia Federal sobre negociação de joias, a uma alegada "burocracia" do TCU (Tribunal de Contas da União) a "delonga" na entrega de presentes recebidos pelo ex-presidente de autoridades estrangeiras.

No dia 30 de março, ocasião em que representantes de Bolsonaro reclamaram de procedimentos da corte de contas, auxiliares do ex-presidente concluíam, segundo a investigação da PF, as providências para reaver todo o material evadido do país para, então, entregá-lo ao Estado brasileiro.

"Registre-se, aqui, que a delonga na entrega efetiva dos bens se deu, a despeito da forma como os veículos de imprensa optaram por noticiar, unicamente em razão da burocracia desta Corte", disse a defesa do ex-mandatário em documento naquele dia do fim de março.

Os advogados afirmaram que a deliberação da corte quanto a local apropriado para o depósito dos bens, bem como a expedição de ofícios e diligências para efetivar a "entrega segura e transparente dos bens", se arrastou mais do que o esperado.

"Descabido, portanto, o tratamento da questão como se houvesse por parte do peticionário [Bolsonaro] alguma tentativa maliciosa de escamotear determinados bens desta corte e de qualquer outro órgão", afirmou a defesa do ex-presidente na época.

A PF empregou justamente o termo "escamotear" ao se referir à operação montada por auxiliares de Bolsonaro para resgatar as joias, levadas para os Estados Unidos.

"Cabe salientar, que toda a operação foi realizada de forma escamoteada, fato que permitiu os investigados devolverem os bens sem revelar que todo o material estava fora do país", diz trecho da representação policial reproduzido pelo ministro Alexandre de Moraes em decisão.

A investigação sobre as joias em curso no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a relatoria de Moraes mostra que ao longo de março, enquanto o TCU analisava o caso, ocorreu o que a PF chamou de "operação resgate" para a recuperação dos bens.

Tão logo houve a instauração da tomada de contas pelo TCU, apesar da "operação resgate" ainda em curso, Bolsonaro colocou-se à disposição do tribunal para prestar os esclarecimentos pertinentes e entregar, de "forma espontânea", as joias.

Na ocasião, o tribunal analisava a situação de um dos dois kit de presentes de joias enviados a Bolsonaro. No dia 15 de março, a corte de contas determinou que o ex-mandatário deveria entregar o segundo pacote de joias remetido a ele por representantes da Arábia Saudita.

Esse segundo kit é composto por relógio, caneta, anel, abotoaduras e um rosário (masbaha) e entrou no país em 2021, no mesmo dia em que a Receita Federal interceptou em Guarulhos (SP) outra caixa de joias com peças femininas.

Os dois pacotes foram trazidos ao Brasil por intermédio da missão chefiada pelo então ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) àquele país do Oriente Médio.

As investigações da PF apontaram que Bolsonaro e auxiliares retiraram do Brasil, no avião presidencial, pelo menos quatro conjuntos de bens recebidos pelo ex-presidente em viagens internacionais, na condição de chefe de Estado.

"No caso específico do Kit Rose [nome dado a um dos conjuntos de joias], a saída com os bens teria ocorrido ao final de dezembro", referência à viagem realizada pelo então mandatário na véspera do término do mandato, para assim evitar passar a faixa a seu sucessor eleito, o hoje presidente Lula (PT).

A polícia afirma que as tratativas para a venda dos bens iniciaram-se ainda em 19 de dezembro, segundo troca de mensagens entre aliados do ex-presidente.

Oferecidas para serem leiloadas, as joias não foram arrematadas, fato que permitiu que o ex-presidente "devolvesse os bens ao Estado brasileiro", diz trecho da decisão de Moraes, que autorizou os investigadores a fazer buscas contra os investigados.

Após o escândalo das joias vir à tona, em março, o entorno do presidente entrou em campo para reaver as peças, aponta a PF.

Na última sexta-feira (11), a polícia cumpriu mandados de busca e apreensão que miram o entorno de Bolsonaro. Entre os alvos está o general da reserva do Exército Mauro Lourena Cid, pai do ex-ajudante de ordens Mauro Cid.

Além dele, as buscas da PF incluem Frederick Wassef, advogado de Bolsonaro, e Osmar Crivelatti, tenente do Exército e que também atuou na ajudância de ordens da Presidência. As ações ocorrem dentro do inquérito policial das milícias digitais, em tramitação no STF.

Antes da decisão, o ministro do Supremo pediu uma manifestação da PGR (Procuradoria-Geral da República) sobre a realização das buscas.

O órgão comandado por Augusto Aras pediu o envio do caso para a primeira instância da Justiça Federal em Guarulhos, onde tramita um inquérito policial. A Procuradoria não se manifestou sobre o mérito das suspeitas levantadas contra Bolsonaro e entorno.

Os investigados são suspeitos de utilizar a estrutura do governo brasileiro para "desviar bens de alto valor patrimonial, entregues por autoridades estrangeiras em missões oficiais a representantes do Estado brasileiro, por meio da venda desses itens no exterior", afirmou a polícia.

Bolsonaro afirmou na última sexta-feira que ele "jamais apropriou-se ou desviou quaisquer bens públicos" e colocou seu sigilo à disposição.

A reportagem não conseguiu localizar nesta segunda-feira (14) os advogados Paulo Bueno e Daniel Tesser, que assinaram a defesa do ex-mandatário junto ao TCU.


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