BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria favorável à instalação obrigatória do modelo do juiz das garantias, que divide a responsabilidade dos processos entre dois magistrados.
Já haviam votado a favor dessa possibilidade os ministros Dias Toffoli, Cristiano Zanin e André Mendonça. Nesta quinta-feira (17), Alexandre de Moraes concluiu seu voto. Kassio Nunes Marques e Edson Fachin se posicionaram pela obrigatoriedade da implementação.
Só votou contra a obrigatoriedade do juiz das garantias o ministro Luiz Fux. Ainda não votaram os ministros Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e a presidente do Supremo, Rosa Weber.
O julgamento, que começou em junho, deve continuar na sessão da próxima quarta-feira (23), com o voto de Barroso.
Mas mesmo os ministros que se manifestaram pela obrigatoriedade divergem do período de instalação do modelo.
Para Toffoli, Zanin, Mendonça e Fachin, o juiz das garantias deveria ser implementado obrigatoriamente em um prazo de 12 meses, estendíveis por mais 12 sob justificativa fundamentada.
Já Alexandre de Moraes propôs 18 meses, embora tenha afirmado que ele pode modificar o entendimento para acompanhar os colegas que preveem outros prazos. Kassio Nunes Marques defendeu que a medida só seja implementada em 36 meses.
Na sessão desta quarta, Fachin afirmou que a discussão a respeito do tema se baseou em contrapontos entre os que consideram que o sistema atual deixa o magistrado enviesado durante o julgamento e os que entendem que não.
Para ele, no entanto, o debate não pode maximizar um pressuposto de que existe esse viés e uma suposta parcialidade do magistrado, mas também "não se deve minimizar, uma vez que algumas inconsistências sistemáticas, derivadas de vieses cognitivos, podem, sim, serem levadas em conta"
"Toda e qualquer hipertrofia desse tema comete algum tipo de generalização", disse Fachin.
No dia anterior, Moraes havia feito críticas às pessoas que têm defendido que o novo instrumento irá sanar eventuais problemas do processo penal brasileiro.
"Não acho justo com o Poder Judiciário e com os juízos criminais insinuar e dizer que o juiz das garantias vem para garantir a imparcialidade no julgamento, como se não houvesse imparcialidade nos julgamentos. É um modelo que o legislador optou e o que temos que analisar é se essa opção é constitucional ou não", disse Moraes.
Ele citou o episódio do vazamento de conversas entre procuradores da Operação Lava Jato e o então juiz da operação, Sergio Moro, que motivaram a aprovação do modelo do juiz das garantias no Congresso.
"O problema da comunicação do juiz com o promotor [Moro com o então procurador Deltan Dallagnol] que foi pego no [material que foi obtido pelo site] Intercept, que é uma anomalia. Isso com o juiz das garantias pode acontecer de qualquer forma. Anomalia são anomalias", afirmou.
O instrumento do juiz das garantias divide o julgamento de ações criminais entre dois juízes: um autoriza diligências da investigação e o outro julga o réu.
O tribunal já tem maioria também para outro tópico: o juiz das garantias não será o responsável pelo recebimento da denúncia, mas sim o magistrado que irá sentenciar no julgamento.
Fux, relator dos processos sobre o tema, apresentou o seu voto em junho, três anos após ter suspendido a instalação do modelo.
Durante a sua fala, o ministro afirmou que o nome juiz das garantias seduz como "o canto da sereia", mas que a imposição da lei poderia gerar o caos na Justiça criminal.
Isso porque, segundo Fux, a norma ignoraria a carência de magistrados no país com dimensões continentais e a diferença entre os estados.
Ele também afirmou que todos os juízes brasileiros são juízes de garantias, durante a investigação e instrução processual, "incumbindo-lhes zelar pelos direitos fundamentais assegurados pela Constituição".
Ao retomar o julgamento em agosto, Toffoli se manifestou a favor da criação do instrumento, no prazo de 12 meses para que os tribunais adotem medidas para implementação e instalação do juiz das garantias.
Esse prazo poderia ser prorrogado apenas uma vez, por mais 12 meses, sob justificativa a ser apresentada junto ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
Em ofícios enviados ao Supremo, os desembargadores que presidem as cortes estaduais relatam dificuldades orçamentárias e estruturais para a mudança.
O juiz das garantias foi aprovado no fim de 2019 e sancionado pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL).
Após a sanção, Toffoli, então presidente do Supremo, adiou a implementação da medida por seis meses e criou parâmetros para a mudança. Tudo isso foi suspenso em janeiro de 2020 por Fux, que é o relator dos processos. À época, ele também suspendeu a instalação do modelo.
Após o Supremo formar maioria, a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), autora de uma das ações que questionam o juiz das garantias, disse em nota que "apresentou a ação contra a implementação do juiz das garantias, tal como previsto na lei, por entender que a medida, além de inviável financeiramente, provocaria abalos significativos no Sistema de Justiça, com consequências negativas sobre a prestação jurisdicional".
"Ao final do julgamento, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre o caso será cumprida ?e a AMB está pronta para auxiliar os magistrados na execução das determinações previstas na legislação. É fundamental, porém, que a implantação do novo modelo se dê dentro de um prazo razoável e com respeito à autonomia dos tribunais", afirma a entidade.
A associação vem argumentando que investigações serão engessadas e prejudicadas devido à falta de juízes suficientes para desempenhar essa função e julgar ações penais.
A OAB, que é uma das partes interessadas no processo, discorda dos argumentos das entidades e tem defendido que o juiz das garantias seja logo instalado.
"É um avanço civilizatório, reformulará positivamente a sistemática do processo penal brasileiro, efetivando o direto de defesa e reforçando a necessária imparcialidade da Justiça", diz o presidente da OAB nacional, Beto Simonetti.
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