BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba) acionou a Justiça para cobrar da construtora Engefort a devolução de R$ 3,3 milhões por suposto superfaturamento de obras feitas no Maranhão.
As suspeitas de irregularidades foram encontradas em três contratos de 2019, que somam R$ 10 milhões, para pavimentação de ruas nos municípios de Vitorino Freire e Lago da Pedra. O ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA), direcionou a verba para essas obras quando exercia o mandato de deputado federal.
A estatal federal afirma que houve "jogo de planilha" para aumentar o valor dos serviços, além da cobrança por um modelo de sarjeta que não estava previsto no contrato.
"Restou configurado o ato ilícito no que tange a medição de valores indevidos, jogo de planilha e a qualidade dos serviços oferecidos, demonstrando também que houve a violação da boa-fé que rege os contratos", diz a Codevasf na ação judicial.
Juscelino teve bens bloqueados por causa de uma apuração da Polícia Federal justamente sobre fraude em outras obras feitas com emendas parlamentares.
A suspeita dos investigadores é a de que Eduardo José Barros Costa, sócio oculto da Construservice, tenha pago a uma suposta empresa de fachada de Juscelino após ser beneficiado em contratos da Prefeitura de Vitorino Freire. A cidade era comandada por Luanna Rezende, irmã do ministro que na última semana foi afastada do cargo pela Justiça.
Já o caso que levou a Codevasf a acionar a Justiça envolve obras com a Engefort. Como revelou a Folha de S.Paulo, essa construtora é apontada pelo TCU (Tribunal de Contas da União) como possível líder de um cartel de empresas que fraudou licitações da estatal.
A companhia disse, no processo judicial, que a Engefort entregou obras precárias. O valor das supostas irregularidades nos três contratos foi calculado pela CGU (Controladoria-Geral da União).
A controladoria visitou os locais das obras dois anos após a conclusão dos serviços. Os funcionários do órgão de controle afirmam que se depararam com asfalto de baixa qualidade.
"Trincas e rachaduras no revestimento asfáltico: ocorreu em praticamente todas as vias vistoriadas, especialmente nos bordos", afirma a fiscalização sobre uma das obras.
A CGU ainda considera que a Engefort teria cobrado por barracões de obra que na verdade não foram erguidos.
A Codevasf chegou a questionar o superfaturamento de R$ 3,3 milhões, mas os argumentos não foram aceitos pelo órgão de controle.
No fim de junho, a superintendência da Codevasf no Maranhão acionou a Justiça Federal no estado para cobrar da Engefort o ressarcimento.
A irregularidade de maior valor, somando R$ 1,19 milhão nos três contratos, refere-se à "duplicidade de sarjeta". Sobre esse ponto, os fiscais da CGU e da Codevasf afirmam que o meio-fio escolhido para a obra já apresentava uma sarjeta conjugada e, ainda assim, foi incluída uma sarjeta no orçamento de licitação.
As "sarjetas fantasma" nas obras da Codevasf em Vitorino Freire com recursos direcionados pelo ministro também foram verificadas por auditores do TCU, como informado pela Folha em fevereiro.
A estatal cobra o ressarcimento por outras seis categorias de supostas irregularidades, entre elas a inclusão indevida de custos de transportes e uso de mistura asfáltica irregular.
O fiscais da CGU consideraram também que o "jogo de planilha" foi feito com mudanças na previsão de serviços durante a obra: foram retirados ou reduzidos os itens em que a Engefort havia prometido dar maior desconto, enquanto a empresa aumentou a cobrança por outros trabalhos.
"Cabe ressaltar que as deficiências identificadas no relatório de auditoria e acatadas pela Codevasf caracterizam descumprimento contratual, na medida que a empresa contratada não cumpriu as obrigações do contrato, no qual envolvia a execução do objeto e a sua entrega em perfeitas condições de uso", afirma a Codevasf na ação judicial.
A Codevasf foi entregue pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL) ao centrão e é mantida dessa forma por Lula (PT) em troca de apoio no Congresso.
Sob o governo petista, a Codevasf segue assinando aditivos contratuais que favorecem a Engefort. A construtora maranhense sediada em Imperatriz (a 630 km de São Luís) chegou a dominar licitações de pavimentação da Codevasf na gestão Bolsonaro, muitas vezes participando sozinha ou na companhia de uma empresa de fachada, como revelou a Folha.
MINISTRO DIZ QUE EMENDAS SÃO LEGÍTIMAS E NEGA IRREGULARIDADES
Em nota, o Ministério das Comunicações disse que emendas parlamentares são instrumentos legítimos e democráticos do Congresso Nacional. A pasta afirmou que é "temerário" penalizar o ministro Juscelino Filho por "recorrer a esse instrumento cujo propósito do parlamentar, ao longo dos seus mandatos, é prover dignidade aos cidadãos e fomentar o desenvolvimento do estado do Maranhão".
"A tentativa de associá-lo a suposto esquema com empresas é mais uma da coleção de ilações que tentam responsabilizá-lo pela atuação de terceiros, com o propósito claro de atacá-lo moralmente", disse o ministério.
A pasta também afirmou que Juscelino não tem relação societária "direta ou indireta" com as empresas que participaram das obras da Codevasf e não pode ser considerado responsável pelos serviços.
A Engefort disse que não foi citada judicialmente no processo que cobra a devolução de R$ 3,3 milhões e que está à disposição para "colaborar com o que for necessário à elucidação dos fatos e demonstração da verdade". A empresa afirmou que trabalha com honestidade nas suas operações.
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