SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Depois de uma série de dificuldades com a própria base aliada na Assembleia Legislativa de São Paulo, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) decidiu liberar emendas voluntárias para atender os deputados estaduais, assim como faziam seus antecessores.
Até agora, 78 dos 94 deputados fizeram pedidos ao governo, em um montante de R$ 266,3 milhões. Apenas 4 parlamentares, porém, do Republicanos e do Podemos, já tiveram suas demandas totalmente pagas -uma soma de R$ 12,4 milhões (4,7% do total). O restante está em processo de liberação.
A Folha de S.Paulo apurou que Tarcísio aceitou liberar neste ano R$ 10 milhões em indicações para cada parlamentar da base e R$ 5 milhões para os de oposição, depois de reclamações de deputados que buscavam financiamento para suas cidades.
A expectativa é melhorar a relação com o Legislativo antes de enviar projetos considerados prioritários para o governo, como a privatização da Sabesp, a reforma administrativa e uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para flexibilizar o gasto obrigatório com saúde e educação.
A maior parte dos deputados fez indicações que somam R$ 4 milhões ou valores próximos disso. Partidos que dão sustentação a Tarcísio --como Republicanos, PL, União Brasil, PSDB/Cidadania, PSD, Podemos, PP, Solidariedade e Novo-- serão contemplados.
Mas a oposição também integra a lista, ainda que receba menos do que os aliados do governador. Com uma média de R$ 2 milhões por deputado, PT e PC do B têm indicações em andamento na gestão Tarcísio. Os petistas, mesmo no papel de oposição, também receberam emendas voluntárias no governo tucano.
Após amargar reveses em projetos consensuais, Tarcísio ainda não enviou as propostas polêmicas que estavam previstas para o segundo semestre. O governador está buscando meios de destravar a relação com o Legislativo e chegou a fazer um mea-culpa em uma reunião com deputados no dia 4 de setembro.
Assim como no âmbito federal, os deputados utilizam as emendas parlamentares para financiar investimentos, obras e hospitais em suas regiões.
Como mostrou a Folha, esses repasses atingiram um recorde na gestão de João Doria e Rodrigo Garcia (PSDB), num contexto em que ambos buscavam viabilizar suas candidaturas. Em 2022, ano eleitoral, o Palácio dos Bandeirantes liberou R$ 1,27 bilhão, privilegiando aliados.
As emendas ou demandas voluntárias, porém, não tinham transparência no governo tucano -os dados foram entregues à reportagem em milhares de folhas de papel após reiterados pedidos por meio da Lei de Acesso à Informação.
Já o governo Tarcísio vem publicando o andamento de cada pleito, indicando o parlamentar responsável e se a verba foi liberada ou não.
No desenho definido pela Secretaria de Governo e Relações Institucionais, comandada por Gilberto Kassab (PSD), o governo Tarcísio atenderá parte das chamadas indicações feitas pelos deputados.
As indicações são uma série de pedidos ou sugestões que qualquer parlamentar pode fazer ao governador e que são publicadas no Diário Oficial. Em geral, trata-se de uma formalidade, já que o Executivo não é obrigado a acatar as recomendações.
Na gestão Tarcísio, no entanto, as indicações serão o instrumento para que o governo libere para os deputados os valores previamente combinados, irrigando as cidades escolhidas pelos parlamentares em troca de apoio nas votações.
Até o último dia 22, de um total de 5.948 indicações publicadas no Diário Oficial na atual legislatura, 517 estavam em andamento e 8, concluídas.
Com 18 deputados na lista de repasses, o PL de Jair Bolsonaro é o partido que mais indicou verba, com R$ 65,6 milhões. O presidente da Assembleia, André do Prado, também integra o PL, mas não fez indicações.
Em seguida aparece o PT, com R$ 31,9 milhões para 16 parlamentares.
A lista dos partidos com maior volume de emendas voluntárias segue com PSDB (R$ 31,8 milhões); União Brasil (R$ 29 milhões) e Republicanos (R$ 26,9 milhões).
Ao contrário das emendas impositivas, que devem ser pagas obrigatoriamente e de forma igualitária pelo governo, as emendas voluntárias ou extras são liberadas conforme a conveniência política e, por isso, costumam beneficiar aliados.
Em 2023, cada um dos 94 deputados tem direito a indicar R$ 10,5 milhões em emendas impositivas, sendo que metade deve ser destinada para a área da saúde. A Constituição estadual estabelece que o valor total dessas emendas é de 0,45% da receita corrente líquida do Orçamento -R$ 987 milhões neste ano.
Governo diz cumprir transparência e que priorizar aliados é compreensível
Em nota, a Secretaria de Governo e Relações Institucionais afirmou que o governo entende "que é compreensível que haja atendimento dessas emendas em proporção maior para os parlamentares da base".
A pasta ressalta ainda que "publica integralmente as indicações parlamentares em cumprimento ao compromisso assumido pelo governo, de dar transparência total à sua gestão" e que "as indicações devem seguir a legislação e o portfólio de projetos do governo".
Questionado pela Folha, o líder de governo, Jorge Wilson (Republicanos), afirmou que Tarcísio não acordou valores com os deputados e que o governo analisa todas as necessidades e trata o estado como um todo.
Ele nega haver problemas entre o Executivo e o Legislativo. "Desde o primeiro momento, há compromisso e respeito com o Parlamento e a cada dia que passa há mais proximidade. A independência dos Poderes tem que ser mantida, mas o diálogo é saudável para a população."
O líder do PL, deputado Carlos Cezar, diz que apresentar indicações "ao Poder Executivo é prerrogativa do mandato parlamentar".
"Como o PL possui a maior bancada da Alesp, [...] é natural que apresente o maior número de indicações ao governo, cumprindo sobretudo o papel de representar e buscar atender as demandas da população", completa.
A federação PT/PC do B/PV afirmou que seguirá atuando na oposição e cobrando "a democratização dos recursos do Orçamento".
A bancada diz que "continuará cumprindo seu papel de fiscalizar o governo Tarcísio de Freitas, denunciando, questionando e obstruindo aquilo que, do nosso ponto de vista, não é de interesse da maioria da população".
"Embora os valores [...] sejam diferentes para os partidos da base do governo e da oposição, a bancada da federação entende que o governo tem recursos em caixa que podem e devem ser disponibilizados para atender as demandas dos municípios", segue a nota.
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