SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em busca da reeleição no ano que vem, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) acumulou, na mesma semana, derrotas e constrangimentos em relação a três alianças fundamentais em sua campanha -com Tarcísio de Freitas (Republicanos), Jair Bolsonaro (PL) e Marta Suplicy (sem partido).

Os desgastes políticos ofuscaram o lançamento do programa de tarifa zero nos ônibus, que foi anunciado na segunda (11) e começou a operar neste domingo (17). A gratuidade nas viagens aos domingos é uma das apostas do emedebista para turbinar sua candidatura e foi considerada eleitoreira por rivais.

O principal adversário, Guilherme Boulos (PSOL), disse que Nunes incorporou uma bandeira histórica dele e da esquerda ao criar um projeto piloto de passe livre e que se trata de um sinal de desespero para se tornar competitivo, já que ele entra na reta final do mandato sem uma marca e sob críticas.

A série de reveses para Nunes foi vista como favorável por adversários como Boulos e a também deputada federal Tabata Amaral (PSB), mas os episódios são minimizados pelo entorno do prefeito, que admitem baixas no âmbito político, mas veem saldo positivo na administração municipal.

Em agenda para estrear o programa, na madrugada, Nunes se deparou com o desconhecimento dos usuários sobre a iniciativa, reclamações sobre as deficiências do serviço e até um dedo do meio próximo ao seu rosto.

O lançamento do Domingão Tarifa Zero, como foi batizada a iniciativa, também acabou eclipsado pelas divergências de Nunes com Tarcísio em torno do reajuste das tarifas de transporte para 2024.

Na quinta-feira (14), o governo estadual divulgou que as passagens do metrô e da CPTM subirão para R$ 5 a partir de janeiro. A gestão municipal manteve em R$ 4,40 a taxa nos ônibus da capital --a decisão de segurar o aumento foi interpretada como um esforço do prefeito para conquistar eleitores.

O episódio evidenciou um desalinhamento entre Nunes e Tarcísio, além de ressaltar os limites do apoio eleitoral do governador ao prefeito. Tarcísio chegou a criticar a tarifa zero e não abriu mão do reajuste, enfraquecendo a agenda positiva do emedebista.

"Com o anúncio do aumento das passagens dos trens e metrô pelo governo do estado para R$ 5, fica evidente mais uma vez que o prefeito da capital e o governador não estão falando a mesma língua", publicou Tabata nas redes.

Auxiliares de Nunes e de Tarcísio consultados pela reportagem dizem que não houve mal-estar e que a parceria na eleição não foi abalada. Segundo interlocutores do governador, que se mantém fiel a Bolsonaro, não há chance de que ele apoie outro nome.

Ainda na quinta, os dois estiveram juntos em um evento do governo paulista e jantaram no Palácio dos Bandeirantes. Tarcísio afirmou à imprensa que tem "zero atrito" com Nunes, e o prefeito disse à Folha que "está tudo ótimo" e que a relação é de amizade.

Antes de a poeira baixar, no entanto, houve desmentidos e bate-cabeça. A divulgação do aumento na tarifa não estava prevista para a semana passada, embora já fosse algo ventilado publicamente por Tarcísio e que acabou sendo revelado pela TV Globo.

Nunes, então, disse ter sido pego de surpresa, reação que irritou o entorno do governador.

Tarcísio afirmou à imprensa que a prefeitura fora avisada na terça sobre o aumento. Segundo secretários municipais, porém, o entendimento naquele dia foi o de que o governo ajustaria a tarifa, mas ainda haveria outras reuniões e a decisão ficaria para o fim do mês.

Procurados pela reportagem, secretários de Tarcísio ponderaram que a responsabilidade fiscal do estado fica acima do empenho na eleição de 2024 --questão que aliados de Nunes dizem compreender.

Na opinião desses interlocutores, caberá ao prefeito comunicar na campanha para a população que a elevação da tarifa partiu da alçada estadual, e que ele próprio, ao contrário, manteve o preço e zerou o custo aos domingos --e, portanto, sai fortalecido, segundo essa ótica.

Na equipe do prefeito, há quem veja a semana que passou como extraordinária do posto de vista da gestão municipal. São mencionados, além da tarifa zero dominical, a inauguração de mais uma Vila Reencontro (habitação para população em situação de rua) e o anúncio de que São Paulo receberá uma partida da NFL (liga de futebol americano).

Já o revés em relação a Bolsonaro se deu na terça, quando ele voltou a endossar publicamente a candidatura do bolsonarista Ricardo Salles (PL-SP) apesar do namoro que mantém com Nunes, entre idas e vindas. O ex-presidente foi gravado falando a expressão "Salles prefeito" ao lado de seu ex-ministro do Meio Ambiente e deputado federal.

Políticos que trabalharam na aproximação de Nunes com Bolsonaro e que pretendiam evitar uma divisão do voto da centro-direita admitem que a relação esfriou. Bolsonaristas dizem não acreditar que o ex-presidente subirá no palanque do emedebista, tido como vacilante na pauta ideológica da direita.

Em mais um obstáculo para o prefeito, o apoio do próprio PL a ele começa a se tornar incerto diante de outras hipóteses, como lançar o senador Marcos Pontes (PL-SP).

Em resposta, Nunes afirmou à imprensa que segue trabalhando para ter o apoio de Bolsonaro e que acredita que eles estarão juntos.

Na quarta-feira (13), o prefeito teve que comentar outro baque: Marta, secretária municipal de Relações Internacionais, disse em um grupo de WhatsApp que já havia falado com o presidente Lula (PT) em mais uma etapa do roteiro que pode levá-la de volta ao PT para ser indicada como vice de Boulos.

A ex-petista, que saiu para se filiar ao MDB e hoje está sem partido, costuma ser usada por Nunes para reforçar sua narrativa de que ele dialoga com diferentes correntes. Ex-prefeita com legado na periferia, ela é um ativo eleitoral, além de fazer as vezes de conselheira política do atual gestor.

A expectativa em torno da costura para atrair Marta para o campo de Boulos foi reforçada neste sábado (16) durante o evento em que Lula estreou como cabo eleitoral do psolista. Petistas fizeram acenos a ela, e o próprio Boulos também a elogiou, mas disse que a articulação cabe ao PT.

O prefeito disse não acreditar que Marta possa migrar para o time rival, mas nos bastidores seus auxiliares afirmam esperar que, se for para isso acontecer, ela peça demissão já nesta semana.

O movimento, contudo, é criticado na prefeitura. Na avaliação de colegas, Marta teria o ônus de dar uma explicação convincente sobre sua guinada e sobre as críticas que fez a Boulos no passado, principalmente na campanha de 2020, quando ela apoiou Bruno Covas (PSDB) contra o psolista.

Bolsonaro e Marta representariam para Nunes pontes com a direita e com a esquerda, respectivamente, e tê-los ambos no palanque ajudaria o prefeito a reforçar a desejada imagem de um candidato de centro sustentado por uma frente ampla.

Por isso, estrategistas do emedebista afirmam que não contar com Bolsonaro ou Marta seria um prejuízo, mas ponderam que não há como estimar a porcentagem de votos que cada um traria.

Para superar as ausências, o plano é reforçar as entregas à população, seguindo a ideia de que, no pleito municipal, o que conta para o eleitor é o impacto direto em sua rotina, e não os cabos eleitorais dos postulantes.

De qualquer forma, Nunes tem sido aconselhado por aliados de outros partidos a reforçar o front de articulação de sua pré-campanha e montar um time de coordenação política. Há alertas de que ele tem ficado para trás em relação aos adversários.

Em discreto tom de comemoração nos bastidores, aliados de Boulos disseram que Nunes ficou negativamente exposto ao ser rifado por Bolsonaro e atropelado por Tarcísio, sem falar no flerte aberto de Marta, subordinada do prefeito, com a candidatura arquirrival.

A pré-campanha do PSOL também computou como derrota para Nunes a declaração do secretário estadual e presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, de que Boulos é o "franco favorito" na disputa, feita em evento na segunda. Kassab vem sinalizando que apoiará Nunes.


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