SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Acuado diante de investigações em torno de uma trama golpista, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) reuniu milhares de apoiadores neste domingo (25) na avenida Paulista, em São Paulo, e fez um discurso no qual maneirou a conhecida agressividade contra o STF (Supremo Tribunal Federal), disse buscar a pacificação do país e pediu anistia aos presos pelo ataque golpista de 8 de janeiro de 2023.
Ao longo de sua fala, toda de improviso, o ex-presidente também reclamou do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por estar inelegível, criticou o STF pelas penas impostas aos que participaram dos ataques de 8 de janeiro, agradeceu aos presentes, lembrou da facada que sofreu e fez um balanço de seu governo.
Bolsonaro também reclamou do "abuso por parte de alguns que trazem a insegurança para todos nós".
O ex-presidente fez ataques ao presidente Lula (PT), sem citar o petista, disse que tem levado "pancadas" e falou em "perseguição" imposta contra ele, especialmente após ter deixado a Presidência. Neste momento, criticou a imprensa em geral e disse que jamais participou de uma trama golpista em 2022.
"O que é golpe? É tanque na rua, é arma, conspiração. Nada disso foi feito no Brasil", disse. "Agora o golpe é porque tem uma minuta do decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha paciência", disse o ex-presidente, ao admitir a existência de um texto nessa linha.
A investigação da Polícia Federal que mira Bolsonaro tem como uma de suas bases mensagens e delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro na Presidência da República.
Outros elementos ainda em fase de investigação são a reunião de teor golpista na qual, em julho de 2022, o então presidente sugere formas para atacar o sistema eleitoral e, já após a eleição, o papel dele na elaboração de uma suposta minuta de decreto na qual seria fundamentado o golpe de Estado.
Fora esses pontos que vieram à tona em recente operação da PF, Bolsonaro coleciona uma série de evidências anteriores de tom golpista.
O ex-presidente já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral, por exemplo, e é alvo de diferentes outras investigações no STF. Neste momento, ele está inelegível ao menos até 2030.
O ato deste domingo na Paulista atraiu milhares de pessoas. Não houve estimativa oficial de público pela Polícia Militar de São Paulo. Ao menos quatro quarteirões da Paulista ficaram superlotados. Havia bolsonaristas, mais espalhados, em cerca de um total de dez quarteirões da avenida.
Bolsonaro, protegido por um colete à prova de balas e de escudos posicionados por seus seguranças, fez a sua declaração ao público em cima de um trio elétrico ao lado de aliados como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, o pastor Silas Malafaia e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), que busca o apoio do ex-presidente para as eleições deste ano.
Também estiveram no ato os governadores Romeu Zema (Minas Gerais), Jorginho Mello (Santa Catarina) e Ronaldo Caiado (Goiás) ?todos aliados que disputam o espólio eleitoral de Bolsonaro.
Valdemar Costa Neto, presidente nacional do PL e também alvo da PF sobre a trama golpista, esteve horas antes na Paulista e fez apenas uma rápida saudação ao público. Segundo decisão do STF, ele e Bolsonaro não podem conversar durante as investigações.
Coube a Malafaia o discurso mais duro da tarde. Ele fez críticas ao STF, ao TSE e à atuação do ministro Alexandre de Moraes durante as eleições de 2022, além de ter feito insinuações sem provas sobre um suposto papel do presidente Lula no ataque de 8 de janeiro, organizado por bolsonaristas em 2023.
Malafaia foi o principal organizador do ato. Ele não é investigado pela PF em torno da trama golpista. Tanto que ao final de sua fala fez uma provocação ao STF e disse não ter medo de ser preso.
O ato foi aberto com uma oração feita pela primeira-dama Michelle Bolsonaro. Entre os que também discursaram, estiveram o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o senador Magno Malta (PL-ES) e os deputados Nikolas Ferreira (PL-MG) e Gustavo Gayer (PL-GO).
O prefeito Ricardo Nunes (MDB), candidato à reeleição em São Paulo, não discursou e ficou em uma posição discreta no carro de som.
Michelle foi a primeira a discursar. Ela chorou no início de sua fala, falou em sofrimento dos aliados de Bolsonaro e chamou a todos de "povo de bem". Disse ainda que sua fé tem sido renovada diante do que chama de "injustiças" contra o seu marido.
Durante a manifestação, as bandeiras de Israel foram onipresentes. Item obrigatório entre os camelôs, a bandeira do país foi escolhida pelo ex-presidente no primeiro aceno ao público em cima do trio elétrico.
O ato deste domingo teve como objetivo demonstrar força política de Bolsonaro e pressionar o STF, que tem autorizado prisões e buscas em torno da investigação contra o ex-presidente e seus aliados, entre militares e ex-ministros do governo.
Bolsonaro, que acumulou declarações golpistas ao longo de seu mandato, teve como preocupação ao longo da semana que seus apoiadores não levassem à Paulista faixas e cartazes de ataques especialmente contra o STF, o que foi respeitado durante o ato deste domingo.
A estratégia foi a de minimizar tensões com o Supremo e o ministro Alexandre de Moraes, alvo principal do ato e que preside inquéritos que podem resultar em novas condenações para Bolsonaro.
Ao longo de seu mandato, Bolsonaro frequentemente criticou o STF, utilizando termos como "politicalha", "acabou, porra", além de acusar o tribunal de ter ligações com o PT e de ativismo político. Os ataques se intensificaram a partir de 2020, durante a pandemia da Covid-19.
Em eventos anteriores, além de criticar o STF e o Congresso, apoiadores de Bolsonaro também exibiram faixas e cartazes apoiando a ideia de um golpe de Estado no Brasil e enaltecendo a ditadura militar que ocorreu entre 1964 e 1985.
Na decisão em que autorizou as prisões de aliados do ex-presidente no início do mês, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que já está comprovada a prática de crimes contra a democracia e associação criminosa.
Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de Direito e associação criminosa, o ex-presidente poderá pegar uma pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.
Bolsonaro ainda não foi indiciado por esses delitos, mas as suspeitas sobre esses crimes levaram a Polícia Federal a deflagrar uma operação que mirou seus aliados no início do mês.
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