Artigo
Consumismo:
Ter para Ser, ou Ser para Ter?

11/04/2001

Todas as pessoas precisam consumir a fim de satisfazer suas necessidades b?sicas para a sobreviv?ncia. O consumo apresenta-se como atividade natural e saud?vel, quando praticada de forma consciente e dentro do necess?rio, sendo assim indispens?vel. At? ent?o, nenhuma novidade. O fato ? que esta aquisi??o de bens vem, de longa data, sendo feita de maneira desenfreada pelos diversos segmentos da sociedade a ponto de abalar as estruturas financeiras das pessoas.

O sujeito, tentando se estruturar como um ser completo, mesmo que momentaneamente, usa o recurso das compras para aliviar seus conflitos. Tal comportamento desvirtua o pensamento do indiv?duo que se confunde com as no?es de ter e ser. Desta forma, percebe-se uma banaliza??o da experi?ncia humana que vem se caracterizar, dentre outras formas de atua??o, pelo comportamento consumista irracional. Acredita-se que quanto menos o sujeito se percebe como tal, n?o se estruturando na base do ser, mais ele precisa ter, comprar, sentir-se dono de algo concreto, palp?vel, ent?o menos ele consegue ser, transformando essa quest?o em um c?rculo vicioso.

O ser humano, eterno insatisfeito por excel?ncia, apresenta-se sempre com uma vontade a ser saciada, enquanto isso n?o acontece, o descontentamento ? inevit?vel, ent?o, quando o desejo ? satisfeito, a vontade cessa por pouco tempo dando lugar a uma outra vontade. Dessa maneira o sujeito tende a uma satisfa??o superficial e imediata de seus conflitos interiores que se apresentam sintomaticamente atrav?s do consumismo. Quando o indiv?duo ? consciente desta din?mica, mas n?o consegue viver de outra forma, acredita-se que o seu desconforto seja bem maior.

Aos olhos da Psican?lise a pessoa apresenta-se como sujeito desejante e cheio de necessidades originadas das mais diversas etapas da vida, muitas derivadas de experi?ncias da primeira inf?ncia. O ato de comprar, para a maioria, aparece mexendo com os sentimentos de gratifica??o e prote??o que remetem a esta etapa inicial da vida da crian?a.

De forma simplificada pode-se explicar da seguinte maneira: Sabe-se que o rec?m-nascido obt?m satisfa??o de suas necessidades atrav?s dos cuidados de sua m?e, ou de quem desempenha esse papel. Tal atividade garante a forma??o das primeiras rela?es sociais da pessoa com o mundo. O beb? tem sensa??o de completude quando vivencia esse momento de forma satisfat?ria com sua m?e.

Nessa mesma fase do desenvolvimento da crian?a (0 a 02 anos de idade) ela tende a incorporar e possuir os objetos que a cercam, ou seja, tende a levar tudo o que v? ? boca, na tentativa de conhecer esses objetos. As pessoas que n?o passaram bem por essa fase, ficando fixadas nela, possivelmente, desenvolvem comportamentos consumistas, comprando muito na tentativa inconsciente de adquirir mais e mais objetos independente de sua utilidade pr?tica. Pode-se referir-se ainda, nesse mesmo contexto, ?queles que comem demais, bebem demais, fumam demais ou tudo isso ao mesmo tempo.

Entretanto, ? percept?vel a manipula??o que o marketing realiza com seus apelos fascinantes em cima da fragilidade humana. Este instrumento de persuas?o e sedu??o ? utilizado em larga escala, potencializando uma necessidade que o indiv?duo j? possui, podendo causar interfer?ncia na capacidade de distin??o entre o que se deve e o que n?o se deve ser comprado. Incide exatamente em cima das no?es de necessidade e desejo que conjuntamente ?s quest?es psicol?gicas j? mencionadas atinge um resultado imensur?vel.

Quando o comportamento consumista e a concomitante fus?o do ser e do ter incomodam de forma significativa, implicando na diminui??o da qualidade de vida, ? recomendada uma psicoterapia. Principalmente quando a pessoa nunca consegue se perceber satisfeita a n?o ser pela via da posse de algo. O consumismo realmente descontrolado, que ocorre mesmo independente das possibilidades econ?micas da pessoa, pode evidenciar um comprometimento ps?quico de maior relev?ncia, ou um simples descontrole emocional moment?neo.

? importante ressaltar, contudo, que nem todo comportamento consumista ? fruto de uma psicopatologia. Muitos convivem harmoniosamente com o seu desespero aquisitivo, evidenciando que essa ? sua forma de estar no mundo e que isso n?o os incomodam em nada.

Tamb?m ? interessante apontar que mesmo diante de uma sociedade basicamente consumista, muitas pessoas vivem sem se sentirem fascinadas ou mesmo hipnotizadas por vitrines extremamente bem elaboradas e promo?es dos mais diversos tipos. Naturalmente, compram o que necessitam, sem depender desse procedimento para se sentirem felizes e realizadas.

Denise Mendon?a de Melo
? psic?loga, formada pelo
Centro de Ensino Superior
de Juiz de Fora.
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