
Ney Matogrosso
A voz rara e inconfundível de Ney Matogrosso
de volta aos palcos do Central
Colaboração
03/04/2006
Ele voltou. Para a alegria dos fãs e admiradores da boa música. Ney Matogrosso, um dos maiores nomes da música popular brasileira, apresentou aos juizforanos seu novo CD, "Canto em qualquer Canto", no Cine-Theatro Central.
A expectativa para o show, definida por ele mesmo como a "melhor possível,
já que todas as experiências com Juiz de Fora foram maravilhosas"
,
imagina-se ter sido cumprida. Conclusão inevitável para quem assistiu aos
muitos aplausos e comentários vindos da platéia. Um dos fãs, na primeira
fila do Theatro, até tentou travar um diálogo com o cantor: ao final de
aproximadamente 10 músicas, teceu comparações entre a nova e as antigas
apresentações de Ney na cidade.
Apresentações incontáveis de acordo com o cantor. Ele mesmo não tem a menor
idéia de quantas vezes já se apresentou em Juiz de Fora. "Sei que foram
muitas. Mas muitas mesmo. Só nesse teatro maravilhoso já foram umas dez"
,
comenta o cantor relembrando que foi um dos primeiros artistas a pisar no
palco do Central após a reinauguração realizada no ano de 1996.
A cidade está sempre na sua lembrança como uma lugar desejado para estréias
de novos shows. "Não há como não incluir Juiz de Fora na rota"
. E com Canto em
qualquer Canto não foi diferente: o show estreou há apenas quatro meses e
percorreu as capitais. A apresentação na cidade é uma das
primeiras em cidades de médio porte.



O show que Ney apresentou em Juiz de Fora marca um momento única na carreira do artista. Ele mostra um Ney mais clean, menos performático, mais preocupado com as execuções de voz. É o show onde as tradicionais danças e pinturas que fizeram a fama do cantor estão mais deixadas de lado.
O novo trabalho foi gravado no ano passado, no Sesc de São Paulo. Foi um show encomendado pelo Canal Brasil e que, em um primeiro momento, foi montado para ser só isso mesmo: uma apresentação de fim de ano para um canal de TV. Ney foi contactado pela produção, que tinha uma proposta para ele. Queriam mostrar um Ney diferente do que mostravam por aí.
O cantor topou, mas conta que tentou dar uma "temperada" a mais na proposta
do grupo. Sugeriu que o show fosse realizado com quatro violões, ao
contrário da proposta inicial de apenas um. "Era a minha maneira de fazer o
negócio ficar mais cheio, mais a minha cara"
, comenta. Eles toparam e Ney
começou a se preparar apenas dois meses antes da gravação.



"Tudo foi feito de forma descompromissada, devido ao tempo que se tinha e ao fato de ser
só um especial para TV. Como me deram a liberdade, assumi como único compromisso o
prazer de cantar"
, explica o cantor, justificando porque o show está
clean. Mas a proposta diferente acabou ganhando o coração do
intérprete e do público e se
transformou em show. Há quatro meses na estrada, Ney já coloca o trabalho
como um de seus preferidos.
Que Ney estava mais comportado é fato. Mas nada que também impedisse uma dancinha aqui ou acolá para o delírio do público presente. Como ele mesmo coloca, é impossível também não mostrar um pouco do Ney agitado, inquieto.
Aos 64 anos, o cantor esbanja fôlego e pique, sua razão motivadora
e grande alegria da vida. "Eu sempre agradeço por ainda estar nos palcos.
Pensei que ia parar aos 50, mas meus 50 anos já passaram há algum tempo e eu
continuo. O melhor: com total ímpeto de expansão. Quando lembro que ainda
tenho esse gás, aí é que acredito que não posso parar com minhas
performances"
.



Ney está comemorando 30 anos de carreira, mas, apesar do grande sucesso
trilhado na carreira solo, ainda é difícil desvincular seu nome
à sua primeira aparição nacional, o grupo Secos e Molhados. A banda,
sucesso estrondoso que só
vendia menos discos que Roberto Carlos, gerou polêmicas, mas conquistou um
grande número de fãs.
O Secos e Molhados discutia homossexualidade e apresentava homens pintados e com peitos de fora em plena efervecência da ditadura militar. Ney, grande destaque, cantava e rebolava, transpirando no palco uma mistura de poesia, música e inquietação.
"Me tornei um destaque sem querer destaque algum. Eu gerava, naturalmente,
muita curiosidade nas pessoas"
, conta. "E esse estranhamento foi o sucesso e
o fim do grupo"
. Com essas frases Ney resumiu sua explicação para o fim do
grupo, no momento em que vendiam um milhão de cópias. Ele conta que os outros
componentes ficavam incomodados com as divulgações da mídia, que tratavam o
Secos e Molhados como uma banda de homossexuais. Sem contar
que também tinham ciúme do destaque que ele conseguiu.
O cantor afirma que fica feliz em fazer parte da história recente da música
brasileira, principalmente pela participação no Secos e
Molhados, mas que não sente saudades do tempo em que fazia parte do grupo.
"Tanto é que minha carreira solo tomou caminhos completamente diversos do
que eu fazia no Secos"
, completa.
Durante os 28 anos que se apresentou em carreira solo, Ney sempre está
inovando. Já fez releituras de Chico Buarque, de sucessos das décadas de 30
e 40 e até mesmo uma homenagem à Cartola. Tudo, segundo ele, em prol da vontade
de fazer sempre diferente. O próprio show
Canto em Qualquer Canto parece ser isso: uma maneira de fazer o inusitado,
de trazer para o público um paradoxo entre a apresentação e o cantor.
No próximo ano, Ney volta ao estúdio. Já está tudo preparado, mesmo porque o show que vem por aí, já começou a ser produzido antes mesmo da encomenda do Canal Brasil. O "menino" do Mato Grosso do Sul, não revela os detalhes, mas promete que volta ao estilo rebelde. Trangressor ou comportado, o que se imagina é que Ney Matogrosso mantenha a qualidade de sempre. É esperar e torcer para que a turnê passe pela cidade.