Artigo
Direito Econ?mico - a rela??o entre sociedade da informa??o e a propriedade intelectual

:::18/08/2007

O mundo globalizado vivencia a chamada "era da informa??o" ou "sociedade do conhecimento", onde este elemento b?sico - a informa??o, com seus adjetivos de livre acesso e inova??o tecnol?gica, ? considerada o produto mais valioso em termos de economia e gest?o do conhecimento. Este novo paradigma, como bem ilustra o autor Guilherm Carboni, provoca mudan?as estruturais nas rela?es humanas, de forma que "reordena-se o socius, reestrutura-se a pol?tica, os comportamentos, as normas ?ticas e a subjetividade".

Neste contexto, os direitos de propriedade intelectual, que t?m seu n?cleo na prote??o do conhecimento e s?o justificados na id?ia de que aquele que cria uma obra (informa??o tecnol?gica) deve receber um retorno (royalties) sobre o seu esfor?o, como incentivo a novas cria?es e ? manuten??o de seu desenvolvimento intelectual, s?o eles postos em debate acerca dos limites e conforma??o do uso e disponibilidade do conhecimento.

Com efeito, em se tratando da sociedade da informa??o, que propugna pela liberdade do saber, h? o interesse de que esse conhecimento produzido seja divulgado e atinja o maior n?mero poss?vel de pessoas, garantindo assim que a sociedade se atualize. Por?m, como harmonizar estes interesses contrapostos - a disponibiliza??o da informa??o versus a sua prote??o e controle?

Uma premissa que se torna imperioso destacar ? que, ao contr?rio do que se possa imaginar, o direito autoral na sociedade da informa??o valoriza economicamente a difus?o da informa??o em detrimento do segredo. Isto ?, e conforme bem explica Aires Rover e Dj?nata Winter, "enquanto na economia tradicional quanto mais raro ? um produto, mais valioso ele se torna, quando se trata de informa??o normalmente ocorre o contr?rio, quanto mais popular e divulgado for o produto mais benef?cios pode trazer" . Isso se percebe na rela??o entre direitos de autor e multim?dia, quando, por exemplo, h? acesso gratuito a m?sicas propagadas pela Internet, mas que, em contrapartida, a divulga??o do trabalho de cantores se torna mais expressiva, aumentando faturamento de empresas do setor atrav?s de shows e produtos ligados ? imagem do artista.

H?, pois, um ethos pr?prio dos direitos autorais, que se diferencia da propriedade industrial (patentes, marcas e segredos industriais), principalmente se se tratar do ciberespa?o, onde, observa-se, que a sociedade da informa??o vem a ditar poderosos contornos.

Mercantiliza??o da informa??o

O saber, cada vez mais, fortalece-se como mercadoria, sendo tratado de forma globalizada. O direito intelectual est? em voga, principalmente ao considerar que o conhecimento livre transforma-se em bem apropri?vel. Os efeitos colaterais desta mercantiliza??o da informa??o podem ser observados com a acirrada disputa pelo controle da informa??o, isto ?, "o pluralismo ? potencial, mas a realidade ? a progressiva redu??o da informa??o a um tom dominante."

A chamada sociedade da informa??o, portanto, apesar de se reger sob o fundamento de uma comunica??o universal, adota, por outro lado, uma posi??o desequilibrada no que diz respeito ao dom?nio sobre a informa??o. Assim, o sistema que deveria buscar a finalidade de prote??o da cria??o intelectual, acaba por proteger o investimento e as grandes empresas que se dedicam ao mercado fonogr?fico. O autor ? s? aparentemente o protagonista desta rela??o .

Assiste-se, portanto, a um alargamento dos direitos empresariais, a t?tulo de direitos autorais, tornando-se necess?rio distinguir no conte?do da multim?dia o que ? de dom?nio p?blico, o que ? protegido pelo direito autoral e o que s?o assuntos de ordem empresarial. H?, portanto, interesses variados - o interesse p?blico, o interesse do autor e o interesse das empresas, que s?o realidades distintas.

Limites e controle

O momento ? mais de observa??o emp?rica que de valora??o jur?dica. Numa primeira impress?o, o aparecimento das redes de informa??o em nada afeta o atual sistema de direitos autorais, pois apenas constituiria mais um meio para a comunica??o das cria?es intelectuais. No entanto, observa-se que as redes de informa??o, pelas suas pr?prias caracter?sticas de virtualidade e de armazenamento de informa?es na forma digital, facilitam a reprodu??o e a modifica??o de obras no ciberespa?o, trazendo graves conseq??ncias ao direito de autor.

Est?o em curso de aperfei?oamento mecanismos que possibilitam o controle do acesso ?s obras liter?rias e art?sticas, de maneira que se possa fazer, por exemplo, "tatuagem eletr?nica das obras em rede", monitorando o n?mero, tempo e local de utiliza?es efetivamente realizadas. No entanto, o que se deve observar ? se o autor ? o principal benefici?rio desta prote??o, porque n?o raras vezes, como destaca Jos? de Oliveira Ascens?o, "a esta explora??o o autor ? fundamentalmente alheio. Saiu da cena quando autorizou a coloca??o da obra em linha" .

Estas "adapta?es" ao ciberespa?o estabelecem um marco de discuss?o sobre o que ? ou n?o ? permitido e uma grande press?o para que tais regras surjam diretamente da consci?ncia dos usu?rios. Isso porque as formas de pirataria tamb?m n?o s?o iguais: a pirataria digital ? essencialmente diferente da pirataria tradicional. A c?pia de objetos virtuais, diferentemente dos produtos f?sicos, n?o priva as outras pessoas desses bens. Sem contar que a c?pia ? perfeita e tem custo nulo.

E ainda, os pre?os tornam-se cada vez mais incompat?veis com a realidade econ?mica de muitos usu?rios, aliados a s?rie de restri?es e dificuldades impostas pelos contratos de licen?a. Os usu?rios do sistema passam a nutrir um "sentimento de avers?o" - "abre-se hoje o caminho para a chamada pirataria leg?tima, em contraposi??o ao puro legalismo" .

A pr?pria inger?ncia legislativa deve ser cautelosa porque, conforme destaca Manuel Castells, um dos paradigmas da tecnologia da informa??o ? baseado na flexibilidade: "devemos evitar um julgamento de valores ligado a essa caracter?stica tecnol?gica. Isso porque a flexibilidade tanto pode ser uma for?a libertadora como tamb?m uma tend?ncia repressiva, se os redefinidores das regras sempre forem os poderes constitu?dos".

Cumpre ressaltar, finalmente, que o cuidado com tema deve abarcar a distin??o entre as rela?es jur?dicas de mercado, os direitos autorais e o acesso ao conhecimento. O fato de estas rela?es serem tratadas exclusivamente como direitos autorais ? descabido, revelando um estratagema desleal, porque afinal, como bem definiu Jos? Ascens?o, "invoca-se Beethove, para tudo reverter afinal para Bill Gates".

Notas

1. CARBONI, Guilherme C. Direito de autor na multim?dia. S?o Paulo: Quartier Latin, 2003. p.145.
2. ROVER, Aires J., WINTER, Dj?nata. "A Revolu??o Tecnol?gica Digital e a Prote??o da Propriedade Intelctual". In: Wachowicz, Marcos (coord.). Propriedade intelectual & internet. Curitiba: Juru?, 2006. p.78.
3. ASCENS?O, Jos? de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informa??o: estudos. Rio de Janeiro, 2002. p. 27
4. ASCENS?O, Jos? de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informa??o: estudos. Rio de Janeiro, 2002. p. 131.
5. ASCENS?O, Jos? de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informa??o: estudos. Rio de Janeiro, 2002. p. 141.
6. ROVERr, Aires J., Winter, Dj?nata. "A Revolu??o Tecnol?gica Digital e a Prote??o da Propriedade Intelctual". In: Wachowicz, Marcos (coord.). Propriedade intelectual & internet. Curitiba: Juru?, 2006. p.88.
7. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede: economia, sociedade e cultura, v.1. S?o Paulo: Paz e Terra, 1999. p.109.
8. ASCENS?O, Jos? de Oliveira. Direito da Internet e da sociedade da informa??o: estudos. Rio de Janeiro, 2002. p. 132.

Sobre quais temas (da ?rea de Direito) voc? quer ler nesta se??o? A advogada Daniela Ol?mpio aguarda suas sugest?es no e-mail vocesabia@acessa.com